A sociobioeconomia se destaca como uma ferramenta eficaz para frear o desmatamento, promovendo um modelo de desenvolvimento que integra a conservação da biodiversidade, a valorização dos saberes tradicionais e a sustentabilidade econômica. O painel foi alinhado às Metas da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) e destacou como o futuro Plano Nacional da Sociobioeconomia, com a contribuição ativa dessas comunidades, pode ajudar a proteger áreas críticas do bioma e garantir o uso sustentável da biodiversidade.

As práticas sustentáveis de Povos Indígenas, Quilombolas, Comunidades Tradicionais e Agricultores Familiares no Cerrado são fundamentais para a conservação de seus territórios e recursos naturais. Cadeias produtivas como a da castanha de baru, óleo de pequi e farinha de babaçu, lideradas muitas vezes por mulheres, são exemplos claros de como a sociobioeconomia pode gerar renda e visibilidade. Ao fortalecer essas cadeias de valor e ampliar o acesso a mercados nacionais e internacionais, é possível combater o desmatamento e promover a proteção das águas do Cerrado, que vêm sofrendo com a redução de sua vazão. Além disso, ao engajar jovens, a sociobioeconomia promove a continuidade dos saberes tradicionais, reduzindo a evasão rural e urbana e garantindo um futuro sustentável.

O painel compartilhou experiências de sucesso e os desafios enfrentados por essas comunidades, visando ampliar a visibilidade de suas práticas no cenário global de biodiversidade. A troca de saberes entre as comunidades e os formuladores de políticas será fundamental para a criação de uma agenda colaborativa que fortaleça a sociobioeconomia, garantindo a proteção dos territórios e das culturas locais.

Ingrid Silveira, secretária executiva da Rede Cerrado e moderadora do encontro, afirmou: “A COP da Biodiversidade é a COP do protagonismo dos Povos Indígenas, Comunidades Quilombolas e Povos e Comunidades Tradicionais, pois onde essas pessoas estão, há proteção e integração com a biodiversidade.” Por isso, foi simbólico que a Rede Cerrado tenha iniciado a sequência de painéis do Espaço Brasil na COP 16. Além de apresentar a Rede Cerrado, Ingrid trouxe dados sobre o desmatamento no bioma: “Em 2023, o Cerrado correspondeu a 61% da área desmatada em todo o país, com 1.110.326 hectares desmatados, um aumento de 68% em relação a 2022, segundo dados do MapBiomas.” Ela reforçou que o desmatamento acelera a perda da biodiversidade e destacou que o Cerrado, sendo a segunda maior biodiversidade do Brasil e a savana mais biodiversa do mundo, necessita da proteção dos Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs), que são os verdadeiros guardiões desse território.

Fotos: Catalina Olaya/MMA

Alberto Terena (APIB) destacou a grave crise hídrica que afeta os territórios indígenas e o impacto direto na produção de alimentos e na subsistência dos povos. Ele ressaltou que qualquer plano de ação deve ser construído com a participação ativa dos Povos Indígenas, respeitando suas diversidades, necessidades e modos de vida. Alberto também enfatizou a importância de a socioeconomia apoiar o financiamento direto para as comunidades indígenas, além de valorizar seus conhecimentos ancestrais.


Logo, a representante da CONAQ, Fran Paula, destacou a importância de políticas públicas que fortaleçam a luta por terra e território para as comunidades quilombolas. Ela enfatizou que criar políticas públicas no Brasil é, também, um ato de reparação histórica, já que reconhece e valoriza os direitos dessas comunidades. Na COP16, Fran ressaltou a urgência do reconhecimento oficial dos territórios quilombolas, que são fontes de vida, preservam valores culturais e possuem maneiras próprias de se relacionar com a natureza.
Fran, que é filha de uma raizeira do Cerrado, também falou sobre a relação íntima que mantém com o bioma, destacando seu poder de cura. Para ela, o manejo tradicional do Cerrado é fundamental não apenas para a preservação ambiental, mas também para garantir a saúde das comunidades que dependem de seus recursos.


Mais tarde, Ronaldo dos Santos, Secretário do MIR, destacou o Cerrado como um bioma que abriga comunidades tradicionais que, além de viverem nele, manejam seus recursos por meio de práticas sustentáveis. Ele mencionou a PNGTAQ como um instrumento fundamental para proteger os direitos dessas comunidades, promovendo o desenvolvimento sustentável e a conservação da biodiversidade.


Samuel Caetano, presidente do CNPCTs, ressaltou a importância da sociobioeconomia e que os povos tradicionais são os verdadeiros agricultores, produtores e manejadores do bioma. Ele apontou que a falta de investimento, financiamento e vontade política, tanto em nível federal quanto estadual, são os principais obstáculos para o desenvolvimento da sociobioeconomia, instrumento que tem o potencial de gerar emprego, renda, comercialização, autonomia e, acima de tudo, uma forma de valorizar os povos do Cerrado.


O representante da Rede Cerrado e do MOPIC, Hiparidi Top Tiro, falou sobre os impactos profundos no cotidiano do povo Xavante. A escassez de água, que afeta seus rituais espirituais, e a redução de espécies, como o Buriti – essencial para a tradicional corrida de Buriti – e para a produção de adornos culturais, como cocares e brincos. Ele ressaltou a profunda interdependência entre os povos do Cerrado e o bioma, que eles ocupam e preservam há séculos.


No fechamento da mesa, foi apresentado um vídeo da campanha Cerrado Coração das Águas e a secretária executiva da Rede Cerrado, Ingrid Silveira, falou sobre a estratégia internacional da instituição para dar visibilidade ao bioma e aos seus povos.

Sobre a Campanha

A campanha Cerrado Coração das Águas, promovida pela Rede Cerrado e organizações parcerias, alerta sobre a crescente diminuição da vazão dos rios e nascentes do bioma, que alimenta as principais bacias hidrográficas do Brasil. Com o desmatamento desenfreado e o avanço da agricultura intensiva, o Cerrado já perdeu cerca de 50% de sua vegetação nativa, o que tem causado uma grave crise hídrica. A redução da cobertura vegetal afeta diretamente a capacidade de infiltração de água no solo, impactando a recarga dos aquíferos e a disponibilidade de água para milhões de pessoas. Além disso, essa escassez ameaça a biodiversidade e compromete os modos de vida dos Povos e Comunidades Tradicionais. A campanha destaca a urgência de preservar esse bioma essencial para garantir o futuro das águas no Brasil. Mais informações em www.cerrado.org.br.