Proposta brasileira no G20 para taxar os super-ricos pode arrecadar até 250 bilhões de dólares por ano
O estudo apresenta que o modelo de tributação progressiva atingiria cerca de 3 mil pessoas inicialmente
Um imposto mínimo de 2% da riqueza dos bilionários do mundo arrecadaria entre 200 e 250 bilhões de dólares anualmente. A estimativa é da proposta brasileira para o G20 sobre a tributação dos super-ricos, elaborada pelo economista francês Gabriel Zucman, professor de economia na Escola de Economia de Paris e da Universidade da Califórnia, e apresentada nesta terça-feira (25).
O estudo apresenta que o modelo de tributação progressiva atingiria cerca de 3 mil pessoas inicialmente. São indivíduos com mais de 1 bilhão de dólares de riqueza, distribuídos em ativos, imóveis, ações, participação na propriedade de empresas, entre outros, e que ainda não pagam pelo menos 2% de imposto de renda anual. “Apenas indivíduos com patrimônio líquido ultraelevado e pagamentos de impostos particularmente baixos seriam afetados”, afirma o texto.
Viviana Santiago, diretora executiva da Oxfam Brasil, destacou a relevância e urgência desta taxação: “A iniciativa de taxar os super-ricos é fundamental para a construção de um sistema mais justo e equitativo. Essa medida não só ajuda a combater a evasão fiscal, mas também possibilita que os recursos gerados sejam investidos em políticas públicas que beneficiem as pessoas mais vulneráveis, especialmente em tempos de crise climática e econômica”, disse Santiago.
Ela acrescentou que, no contexto brasileiro, a proposta de Zucman é um avanço necessário para enfrentar as desigualdades extremas: “Falando especificamente do Brasil, a proposta de Zucman é um avanço necessário para enfrentar as desigualdades extremas que vemos em nosso país, onde a concentração de riqueza perpetua injustiças históricas e impede milhões, especialmente mulheres negras e periféricas, de terem acesso a uma vida digna e oportunidades iguais.”
Super-riquezas
Zucman defende que a análise torna a proposta brasileira ao fórum por um imposto mínimo das super-riquezas “algo tecnicamente factível” e destaca que o G20 Brasil foi corajoso ao trazer a iniciativa para os debates das maiores economias do mundo. “Parece utópico, mas pode ser implementado por muitos países. Há razões para pensar que conseguiremos isso ao longo dos anos”, assegurou.
Para Felipe Antunes, coordenador-Geral de Assuntos Financeiros Internacionais no Ministério da Fazenda do Brasil, pasta que coordena a Trilha de Finanças do G20, há grande interesse pela proposta brasileira e o momento de debate tem se mostrado adequado, pois vários países já manifestaram apoio a um padrão de tributação dos super-ricos. Antunes reconhece que o debate está no início e deve levar tempo para ser adequadamente discutido e implementado.
”Que os super-ricos paguem uma porção justa de impostos é uma prioridade do G20 Brasil.Precisamos ainda ter discussões paralelas para ver como levar essa proposta tributária para os países, que poderão implementá-la de diferentes formas, usar seus esforços e alcançar o entendimento de que essa reforma pode ter uma possibilidade de avanço. O quão rápido podemos avançar, não posso dizer. Já existem conversas em alguns fóruns internacionais sobre e vamos levar para todos eles”, indicou o diplomata.
Cooperação internacional
Na análise, Zucman destaca que a cooperação internacional é fundamental para melhorar a eficácia da tributação para os super-ricos. “Um imposto mínimo coordenado acrescenta valor, porque na prática há o risco deles ocultarem sua renda e enviarem a países que tributam menos sobre as receitas. Para isso, precisa de intercâmbio internacional e um padrão comum de taxação para evitar a concorrência tributária”, disse.
Todavia, destaca que o padrão normativo é flexível e pode ser implementado pelos países em grupo ou individualmente, por meio de mecanismos domésticos de taxação como, por exemplo, o imposto estimado sobre uma noção ampla de renda ou sobre fortunas. “O G20 sempre foi muito eficaz em colocar iniciativas corajosas e inovadoras na pauta, em termos de poder oferecer a orientação política por acordos que possam ser realizados com o tempo. Acredito que isso possa acontecer aqui”, pontuou.
Desafios e soluções para a implementação
A matriz da proposta brasileira de tributação progressiva destaca como desafios de implementação aos países como determinar o valor da riqueza dos indivíduos; a superação da opacidade financeira internacional, melhorando a transparência das informações sobre transações e a coordenação internacional “imperfeita”, já que alguns países podem aderir ao padrão de tributação, não sendo necessário que todos o implementem.
Embora a iniciativa careça de debates mais aprofundados, a expectativa do economista é aproveitar os progressos anteriores de coordenação internacional em tributação, como trocas bancárias e o imposto mínimo sobre as multinacionais, temas que já foram discutidos no âmbito do G20, e ampliá-los. “Considero que o plano de ação é um documento técnico, cujo objetivo é alimentar a discussão política, para mostrar a quantidade de possibilidades, desafios existentes e como superar os problemas potenciais que poderiam surgir”, analisou.
Para a implementação do padrão de tributação, Zucman salientou que é necessário ponderar os custos e benefícios da proposta e que, no momento, o foco precisa ser nos bilhões de dólares que são perdidos anualmente por não taxar os super-ricos. “Estamos fazendo uma proposta de base para arrecadar impostos para 3 mil pessoas. Não vai custar realmente tanto, mas uma pequena fração do que esperam do 250 bilhões de dólares da arrecadação adicional”, concluiu.