
Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos é lançado após mobilização de mais de 10 anos de organizações da sociedade civil
Conquista histórica fruto de uma década de mobilização e pressão sobre o governo federal
O lançamento do Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara), anunciado oficialmente pelo Governo Federal nesta segunda-feira (30) depois de sucessivos adiamentos, institucionaliza uma política pública fundamental para a saúde e o meio ambiente no país. Construída com a participação de organizações da sociedade civil, incluindo a Articulação Nacional da Agroecologia (ANA), a iniciativa é resultado de um esforço de mais de uma década de mobilização e pressão junto à administração federal. O anúncio aconteceu em conjunto com o lançamento do novo Plano Safra 2025/2026 da Agricultura Familiar, em cerimônia no Palácio do Planalto com a participação do presidente Lula e de representantes de movimentos sociais e coletivos.
“Sem dúvida, uma grande conquista” diz Paulo Petersen, representante da ANA na Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Cnapo). “Não havia consenso no governo. Foi necessária a intervenção direta do presidente Lula para que essa demanda social de muitos anos fosse atendida. Desde então, passamos a negociar o texto do decreto palavra a palavra. Até o nome do programa foi contestado. As indústrias do veneno não aceitam o termo agrotóxico. Utilizam o enganoso termo ‘defensivo agrícola’. Não aceitamos essa alteração porque não abandonamos nossas bandeiras de luta. ‘Pronara já’ foi a nossa campanha por todo esse tempo. Agora com o decreto, temos grande expectativa de que medidas efetivas sejam adotadas para eliminar os agrotóxicos com o tempo. É plenamente possível. O conceito de uso racional de agrotóxicos, que eles também buscam impor ao debate público, é uma aberração. Não é possível entender que uma tecnologia destinada a matar seja considerada de uso racional”, afirmou.
O Pronara foi elaborado há mais de dez anos, a partir da articulação e luta de entidades e organizações junto ao governo, no âmbito da Cnapo. No entanto, nunca havia sido implementado. No ano passado, havia a expectativa de lançamento junto com a terceira edição do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo). Divergências internas no Poder Executivo, incluindo o veto do Ministério da Agricultura, provocaram os adiamentos.
Agora, apesar da resistência de setores do próprio governo, da bancada ruralista e do agronegócio, o Pronara foi finalmente confirmado como um importante instrumento de incentivo à transição para sistemas de produção orgânicos e de base agroecológica. A avaliação é de Patrícia Tavares, secretária-executiva da Cnapo. “É um momento histórico para a construção de uma agricultura mais sustentável. Representa uma sinalização do nosso país rumo à uma transição dos modos de produção, que garanta alimentos saudáveis na mesa da população brasileira.”
O Pronara vai reunir ferramentas de pesquisa, informação, monitoramento de resíduos e o fortalecimento da Assistência Técnica e Extensão Rural, para restrição do uso, produção e comercialização de agrotóxicos no país. O programa será coordenado pela Secretaria-Geral da Presidência da República (SGPR), em parceria com os ministérios do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), da Agricultura e Pecuária (MAPA), da Saúde (MS), do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). Com a publicação do decreto, os ministérios vão pactuar ações conjuntas, apoiar territórios prioritários e induzir a transição agroecológica por meio do fortalecimento da produção de alimentos saudáveis da agricultura familiar.
A expectativa, segundo Jairã Tingui Botó, indígena e integrante do Núcleo Executivo da ANA, é que esse instrumento legal ajude o Brasil a deixar de ser o país que mais consome agrotóxicos no mundo. “É uma iniciativa muito importante para a saúde dos brasileiros, especialmente das comunidades do campo, das populações indígenas e ribeirinhas, que não aguentam mais tanto veneno na alimentação, poluindo os nossos rios, florestas e territórios”, disse.
A implementação do programa vai ser importante também para quem já produz alimentos sem o uso de agrotóxicos. É o que diz a representante da Comissão Nacional de Produção Orgânica na Cnapo e produtora rural Cecile Follet. “Para a produção orgânica, que é responsável sempre por garantir qualidade para o consumidor, proteger a sua unidade de produção do entorno tóxico é impossível, por conta da agressividade que é o uso dos agrotóxicos ao redor dos nossos territórios. Portanto, é um avanço para que nós consigamos devolver a responsabilidade dessa proteção para quem de fato usa esse tipo produto.”
A secretária-executiva do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Fernanda Machiaveli, destacou o papel das organizações sociais para que o Pronara fosse viabilizado. “A Articulação Nacional da Agroecologia foi fundamental nessa caminhada, para esse resultado. Foi uma construção participativa que levou anos até que a gente tivesse um contexto propício, um governo que acredita que a agricultura precisa acontecer levando alimento saudável, sem veneno, para a mesa das famílias brasileiras”, resumiu.