Professora relata cenário de caos no sistema de aulas remotas em São Paulo
A pressão sofrida por docentes evidencia a extrema inviabilidade de um bom trabalho, como diz a professora da rede estadual paulista Maria Dolores Zundt que conversou com os Estudantes NINJA.
A condição de trabalho dos professores é um fator estrutural para entendermos o funcionamento da educação no nosso país. A pandemia agravou um cenário de precarização do serviço público que já estávamos vivendo e tornou urgente o debate sério e profundo sobre como tratar esse problema. Assim como os estudantes, os professores também são protagonistas no debate para desenvolvermos soluções diante desse momento, pois também estão sendo profundamente afetados.
O Governo de São Paulo mostra uma maneira de governar a educação que coloca os alunos e os professores numa situação impossível para o desenvolvimento do aprendizado. A pressão sofrida por docentes evidencia a extrema inviabilidade de um bom trabalho, como diz a professora da rede estadual paulista Maria Dolores Zundt que conversou com os Estudantes NINJA: “Assim que o governo de João Dória suspendeu as aulas presenciais, teve início uma pressão para elaboração de teletrabalho sem nenhuma orientação clara e oficial. Os professores começaram a ser bombardeados com recados das equipes gestoras das escolas sobre atividades online para passar aos alunos”, disse.
Eram informações desencontradas e muitas arbitrariedades. Sequer o calendário escolar tinha sido definido. Muitos professores se sentiram compelidos a realizar o teletrabalho por causa da pressão que sofreram.
Com a volta das aulas remotamente, houve um aprofundamento de um cenário de caos, como declarou a professora Maria Dolores. “De lá pra cá, os professores têm sido bombardeados com instruções, solicitações de atividades, convocações para reuniões, etc. Muitos tiveram seus números de telefones privados adicionados em grupos de alunos e pais, sem prévia autorização” e essa condição de trabalho reflete infelizmente em erros conceituais ou mesmo metodológicos de ensino.
Aliás, infringir leis e decretos é algo que está em pauta nesse momento. O decreto que instituiu e tornou oficial o programa Centro de Mídias da Educação de São Paulo que tem por objetivo implementar a educação mediada por tecnologia, só foi publicado no dia 16 de maio. Mas, desde o dia 27 de abril, os professores estão sendo assediados e ameaçados de levarem falta e outras penalidades se não acatarem as exigências das equipes gestoras.
Dolores também fala sobre a insensibilidade do governo em compreender “a realidade que milhões de alunos não têm acesso à tecnologia. Muitos estão sem a merenda escolar, passando fome em casa.”
A crise também afeta os pais dos alunos que, de alguma maneira, acabam pressionando os professores mais ou menos incisivamente. Os professores que, assim como todos, lidam com questões da vida pessoal, numa instabilidade emocional gerada pela pandemia, ainda se deparam com o agravamento da condição de trabalho.
A professora Dolores encerra afirmando que: “O discurso da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEDUC) e dos defensores da reforma empresarial da educação recai sobre a culpabilização dos professores em relação ao fracasso de um programa mal preparado e privatista. Os professores desconfiam de que se trata de um caminho sem volta e se sentem assustados, com medo do desemprego (em especial a grande parcela que trabalha com contratos temporários) e da insegurança financeira do próximo período.”
Essa situação sinaliza muito bem a ideia da educação sendo tratada como uma mercadoria ou então mero instrumento de cumprimento de uma burocracia que, muitas vezes, além de não ser suficiente para garantir o aprendizado, acaba servindo para atender os interesses de uma pequena parcela privilegiada que parece pouco se importar com as condições de trabalho dos professores.