Por que um ouro paralímpico vale menos?
Disparidade tecnológica e falta de visibilidade desafiam o futuro dos esportes paralímpicos no Brasil.
Por Mariana Deperon, para Cobertura Colaborativa #NECParis2024
As Paralimpíadas representam um passo importante na história da inclusão de pessoas com deficiência no esporte mundial, mas ainda há questões críticas que precisam ser abordadas.
Embora a evolução das tecnologias assistivas seja fundamental para o avanço dos Jogos, é importante destacar que o acesso a essas inovações ainda é restrito para muitos atletas, especialmente aqueles de países em desenvolvimento. Essa disparidade tecnológica compromete a equidade nas competições, levantando questionamentos sobre como tornar o esporte paralímpico verdadeiramente acessível a todos.
É preciso, no entanto, fazer uma provocação. Quando pensamos em ídolos olímpicos do Brasil – como as espetaculares Rebeca Andrade, na ginástica artística, e Rayssa Leal, no skate –, quais deles são paralímpicos?
A ausência de grandes ídolos paralímpicos – eles existem e são muitos – na memória coletiva brasileira reflete um histórico mais amplo de marginalização e invisibilidade das pessoas com deficiência em diversos âmbitos da sociedade. A desvalorização de suas conquistas esportivas não é apenas uma questão de mídia, mas também de uma estrutura social capacitista que ainda não investe de forma significativa nos atletas, para que possam atingir seu potencial pleno.
É inegável que o Brasil seja uma potência paralímpica. Prova disso é o verde e amarelo de nossa bandeira figurar, desde o começo, entre os cinco melhores classificados no quadro geral de medalhas.
Mas enquanto as transmissões dos Jogos Olímpicos dominaram as grades de programação, as competições paralímpicas têm recebido um tratamento bem diferente.
De acordo com a News Cast Studio, os Jogos Olímpicos de Paris de 2024 receberam mais de 10 mil horas de cobertura em TV aberta, enquanto os Paralímpicos tem uma cobertura significativamente inferior, evidenciando uma clara disparidade, inclusive no Brasil que não os transmitiu em canal de tv aberta.
Além das transmissões e da visibilidade aos atletas e às atletas paralímpicos, outro desafio é promover uma cultura de investimento nos esportes paralímpicos.
Estudos mostram que o investimento em atletas paralímpicos no Brasil é uma fração do que é destinado aos atletas olímpicos. Programas de incentivo implementados em outros países, como Inglaterra e Austrália, poderiam servir de inspiração para promover uma política de apoio mais abrangente e inclusiva.
Nesse sentido, é urgente que este debate adote uma abordagem anticapacitista (capacitismo é o preconceito ou discriminação contra pessoas com deficiência, muitas vezes baseado em estereótipos de que elas são menos capazes), não apenas reconhecendo o talento e as habilidades dos atletas com deficiência, mas também por meio da criação de estruturas de apoio e visibilidade que garantam igualdade de oportunidades e valorização de suas conquistas.
As conquistas dos nossos atletas paralímpicos devem ser vistas não apenas como um triunfo esportivo, mas como um chamado à ação para toda a sociedade. Cabe a nós, enquanto cidadãos, empresas e governantes, garantir que esses atletas tenham a visibilidade, os recursos e o apoio necessários para que suas vitórias inspirem uma transformação inclusiva em todos os níveis.
Mariana Deperon é sócia fundadora da Travessia Estratégias em Inclusão, é advogada e responsável por projetos e programas ESG e D&I na área de esportes da organização.