Por Tamara Finardi, para Cobertura Colaborativa #NECParis2024

Atletas com deficiência auditiva não disputam os Jogos Paralímpicos. Vocês já se questionaram por que isso acontece e onde eles competem?

A CBDS (Confederação Brasileira de Desportos de Surdos) explica que os surdoatletas não participam dos Jogos Paralímpicos porque contam com um evento próprio em seu calendário oficial. Estes Jogos são regidos pelo ICSD (International Committee of Sports for the Deaf), Órgão internacional que organiza internacionalmente o desporto de surdos e possui uma versão no verão e outra no inverno. 

A realização das Surdolimpíadas antecedem o Movimento Paralímpico. A 1ª edição dos Jogos Surdolímpicos (Deaflympics Games), antes chamado de Jogos Internacionais Silenciosos, foi realizada há 100 anos, em 1924, entre os dias 10 e 17 de agosto em Paris, na França. Enquanto a primeira edição dos Jogos Paraolímpicos foram realizados em Roma, na Itália, em 1960.

Em 1985, o Comitê Olímpico Internacional realizou um movimento para que o ICSD se juntasse ao Comitê de Coordenação Internacional (entidade antecessora ao Comitê Paralímpico Internacional). Porém, a forma como esta ligação se deu na prática, acabou gerando confusão a respeito da participação de surdoatletas em competições de alto rendimento. Alguns foram orientados a não participar de Surdolimpíadas e sim dos Jogos Paralímpicos, porém, este último, ainda não possuía estrutura e diversidade de modalidades para acolher os atletas. Diante destes ruídos, se entendeu que a realização e gerenciamento das Surdolimpíadas e Jogos Paralímpicos, sendo realizado de forma separada, poderiam proporcionar melhor estrutura aos atletas e suas diferentes especificidades.

Maria Esther Gomes de Souza, 51 anos, é técnica da Seleção Gaúcha de Vôlei para Surdos e da equipe de Vôlei de Praia da FDSRS (Federação Desportiva de Surdos do Rio Grande do Sul). Sobre o fato de as Paralimpíadas e Surdolimpíadas serem eventos separados e independentes, seu ponto de vista é de que “ é uma coisa natural”. E complementa: “O Movimento Surdolímpico iniciou em 1924, anterior ao Paralímpico, e fortalece o direito à comunicação em língua de sinais e troca de experiências de cultura surda. Nos últimos anos, começaram a ser realizados movimentos importantes no esporte surdo, como os surdoatletas recebendo Bolsa Atlta”.

Maria Esther Gomes de Souza e a jogadora de voleibol da Seleção de Surdos Eduarda Maria Trentin Santi celebram participação na 24ª Surdolimpíada em Caxias do Sul. | Foto: Arquivo pessoal

Desde os oito anos Eduarda Maria Trentin Santi, 30 anos, surda (com perda auditiva bilateral neurossensorial profunda), tem uma ligação muito próxima com o esporte. No final de 2021, recebeu o convite da treinadora Maria Esther para participar da Associação de Surdos de Santa Maria. A partir daí, conheceu competições de alto rendimento voltadas à pessoas com deficiência auditiva e, em 2022, foi convocada para a seleção de vôlei que ficou com a 5ª colocação na 24ª edição das Surdolimpíadas de Verão. “Antes de saber que existia a Surdolimpíada, ficava me questionando o motivo de não ter surdos praticando esportes, seja na Olimpíada ou na Paralimpíada. Me perguntava onde nós surdos nos encaixaríamos. Quando soube que existiam Jogos para surdos, fiquei muito surpreendida”, relata. 

“Assim como o Movimento Paralímpico tem menos visibilidade que o Movimento Olímpico, tanto por parte da mídia, imprensa, sociedade, o Movimento Surdolímpico vive na invisibilidade, e essa é uma luta árdua da CBDS. Acreditamos que isso aconteça porque a surdez é uma deficiência invisível para a sociedade, que pouco se sabe sobre a cultura e a comunidade surda”, ressalta Diana Kyosen, presidente da CBDS e ex-surdoatleta.

Outro ponto destacado por ela, é o fato de que após muita insistência e luta, apenas este ano os e as surdoatletas conquistaram o direito à Bolsa Atleta – depois de 19 anos de existência deste benefício.

“Estou muito confiante de que agora, com esse benefício, os 240 surdoatletas beneficiados – 2 deles contemplados na categoria pódio, junto aos atletas da elite do desporto Olímpico e Paralímpico brasileiro, terão melhores condições de disputar torneios internacionais.”, celebra Diana. 

Presidente da CBDS ressalta lutas e conquistas da comunidade de surdoatletas no Brasil. | Foto: Divulgação

Conquistas brasileiras nas últimas Surdolimpíadas

O Brasil foi palco da última edição das Surdolimpíadas de Verão. A 24ª edição do evento ocorreu entre os dias 1º e 15 de maio de 2022, no município de Caxias do Sul (RS), onde contou com a presença de mais de 4,2 mil atletas surdos de 77 países, que participaram de 20 modalidades esportivas. Seis medalhas de bronze foram conquistadas pela delegação brasileira: no handebol e futebol feminino, duas no judô (Rômulo Crispim e Alexandre Fernandes) e duas na natação (ambas com Guilherme Maia).

Em março de 2024, a  20ª edição das Surdolimpíadas de Inverno ocorreu na Turquia. Os pódios brasileiros vieram com dobradinha no futsal: prata no feminino e bronze no masculino.

A próxima edição das Surdolimpíadas de Verão será realizada em Tóquio, no Japão, entre os dias 15 e 26 de novembro de 2025. A CBDS já conta com o apoio da prefeitura de Hamamatsu, cidade japonesa onde a equipe brasileira fará a aclimatação para o evento. Mas a entidade brasileira ainda busca patrocínios para garantir a participação de aproximadamente 200 pessoas da delegação brasileira, na 25ª edição do torneio.

Para se tornar um surdoatleta, é preciso ter perda auditiva de pelo menos 55 decibéis no melhor ouvido. Em competições de surdos, os esportes e as suas regras são idênticas às de atletas sem deficiência. As únicas adaptações que devem fazer é a substituição da sinalização auditiva por visual.