PF diz que Abin interferiu em investigação sobre Jair Renan, filho de Bolsonaro
A informação foi revelada em relatório da Polícia Federal através de um “espião” da Abin que trabalhava para prevenir “riscos à imagem” do chefe do Poder Executivo
A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) está sendo acusada de atrapalhar o andamento de uma investigação que envolvia Jair Renan Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro (PL), por suposto tráfico de influência. A informação foi revelada em relatório da Polícia Federal através de um “espião” da Abin que trabalhava para prevenir “riscos à imagem” do chefe do Poder Executivo.
O integrante da Abin foi flagrado em uma operação da PF e, em depoimento, admitiu que recebeu a missão de levantar informações de um episódio relacionado a Jair Renan, sob apuração de um inquérito da PF, para evitar que o caso prejudicasse o presidente da República. As informações foram reveladas pelo Jornal O Globo, nesta terça-feira (30).
A operação da Abin ocorreu em 16 de março do ano passado, quatro dias após o filho do presidente e o seu preparador físico Allan Lucena se tornarem alvos de uma investigação da PF. A dupla é suspeita de abrir as portas do governo para um empresário interessado em receber recursos públicos.
Na época, Lucena percebeu que estava sendo seguido por um veículo que entrou na garagem de seu prédio. Incomodado, o personal trainer acionou a Polícia Militar. O suspeito, quando abordado, identificou-se como Luiz Felipe Barros Felix, agente da PF cedido para o órgão de inteligência. O episódio de espionagem foi registrado em um boletim de ocorrência.
Ao ser chamado pela Polícia Federal para prestar esclarecimentos, Felix contou que trabalhava na Abin vinculado diretamente a Alexandre Ramagem, então comandante da agência e homem de confiança do presidente. O agente confirmou que recebeu a missão de um auxiliar do chefe do órgão de inteligência. O intuito era levantar informações sobre o paradeiro de um carro elétrico avaliado em R$ 90 mil — que teria sido doado a Jair Renan e ao seu personal trainer por um empresário do Espírito Santo interessado em ter acesso ao governo.
“O objetivo era saber quem estava utilizando o veículo”, afirmou Felix, em depoimento. “O objeto de conhecimento era para saber se os informes que pudessem trazer risco à imagem ou à integridade física do presidente eram verdadeiros ou não”, complementou ele, sem dar mais detalhes da operação.
O relatório da PF afirma que a atuação da Abin foi uma “interferência nas investigações” e que, após a operação descoberta, Allan devolveu o carro elétrico. “A referida diligência, por lógica, atrapalhou as investigações em andamento posto que mudou o estado de ânimo do investigado, bem como, estranhamente, depois de ampla divulgação na mídia, foi noticiado, também, que o sr. Allan Lucena teria ‘devolvido’ veículo supostamente entregue para o sr. Renan Bolsonaro”, destaca o documento policial enviado à 10ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal no fim de 2021, o qual solicitou prorrogação do inquérito.
Além disso, o relatório da PF afirma que a intromissão da Abin pode ter feito com que os investigados tenham combinado versões a respeito dos fatos e afirma que “não há justificativa plausível” para a diligência da Abin.
Coincidentemente, o espião foi desligado da Abin 13 dias após ser descoberto em operação. “Não há registro da referida ação nos sistemas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). O agente de Polícia Federal Luiz Felipe Barros Felix não faz parte dos quadros da Abin desde 29 de março”, diz a Abin.
Outras interferências
Esta não é a primeira vez que a Abin é acusada em interferir em investigações da Polícia Federal. Em maio de 2021, a PF denunciou que o então Ministro de meio Ambiente, Ricardo Salles, nomeou um agente no órgão para interferir na fiscalização do Ibama. Na época, o servidor acabou afastado do cargo por decisão do ministro do STF, Alexandre de Moraes. Salles é investigado por exportação ilegal de madeira para Estados Unidos e Europa.