Para além dos Jogos: o legado das Olimpíadas e o papel na formação educacional
Nem só de medalhas é que se faz uma Olimpíada.
Por Paty Zupo, para Cobertura Colaborativa Paris 2024
As últimas semanas foram repletas de euforia, os dias cheios de atrações esportivas, bastava ligar a TV e, lá havia uma disputa, apresentação, entrevista, comentários e/ou opiniões. O Mundo inteiro conectado com olhares atentos ao seu esporte favorito, torcendo pelo seu time ou para o atleta levar a melhor de três e subir ao pódio. De locais e ruas inteiras decoradas com as cores da bandeira, a crianças, jovens e adultos vestindo algum uniforme ou adereço que represente sua Paixão ou demonstre seu interesse naquela modalidade específica.
Todos vivemos intensamente esse “espírito olímpico”, choramos, vibramos, torcemos, nos emocionamos, fazemos memes, e compartilhamos todos eles. E há quem, até mesmo, se anime a virar a página do sedentarismo e começar a praticar alguma atividade física após vibrar por algum atleta; o jargão popular “Agora vai” se torna a hashtag mais compartilhada e comentada nas redes sociais. Mas, “como tudo que é bom, dura pouco”, chegamos ao fim de mais uma edição (incrível) dos Jogos Olímpicos.
Se você perguntar nas ruas, qual palavra melhor descreve as olimpíadas, com certeza a mais dita seria “superação”; isso porque ela está relacionada com a descrição de realizar um esforço imenso (competição) para conseguir algo (medalha) e, como para nós, pobres mortais, um salto triplo de Rebecca, as manobras radicais de Medina, as defesas espetaculares de Lorena, o vôo alto sob quatro rodas de uma Fadinha, etc., somam ações no ato ou efeito de superar desafios.
Será mesmo que descrever os Jogos com palavras é uma boa forma de propagar o significado de uma Olimpíada?
Para muitos atletas, disputar uma prova, vencendo ou não, significa que lá atrás, em algum momento na vida, foi preciso motivação. A medalha é protagonista, sim, e o resultado da classificação para muitos, motivo de orgulho ou sensação de vitória.
No contexto educacional, verbalizar esses sentimentos dos esportistas de alto rendimento é exemplificar às crianças do que ela/ele é capaz, não só a superação de alcançar boas notas, ou aprender um idioma, mas nos ajuda a motivá-los a serem melhores cidadãos, ao passo que a vida vai apresentando os desafios, relacionamentos e convívio, principalmente no ambiente coletivo, é mais fácil demonstrar como enfrentá-los de forma objetiva, clara e honesta quando o exemplo vem de um Ídolo esportivo.
A maior medalhista brasileira dos Jogos de Paris, Rebecca Andrade, demonstrou muita concentração e calma nas disputas, além é claro, de suas habilidades na ginástica, ela conquistou (definitivamente) o coração de inúmeros brasileirinhos. Milhares de crianças (meninos e meninas) querem ser como Rebecca, e se emocionam quando falam dela, externando sentimentos que nem eles mesmos conseguem explicar. A participação dela nos Jogos, sem dúvida, foi muito além das medalhas que carregava no peito, para as crianças, ela é exemplo de resiliência, força, tranquilidade e determinação, elas choram e se emocionam juntos. Neste âmbito, até mesmo o entendimento de derrota, dor e medo, somam no aprendizado educacional infantil.
Rayssa Leal é a brasileira mais jovem a conquistar duas vezes o pódio olímpico. Entre suas manobras de skate, Fadinha vibra e faz dancinhas, estando sempre com fone de ouvido e um belo sorriso no rosto. A skatista é exemplo de Felicidade e não esconde seu “enorme” respeito às outras atletas da modalidade. Ela gosta de enfatizar que no esporte que escolheu, não há rivalidades, e que ela (assim como os demais skatistas) torcem para o outro acertar a manobra.
O skate já foi uma prática discriminada socialmente, em São Paulo, foi proibido no mandato de Jânio Quadros em 1988, e hoje, sendo seu segundo ano em Olimpíadas, podemos ver o carisma, a admiração e o respeito entre os atletas da modalidade. Em meio a tombos e premiações, gente jovem reunida, o atleta de 51 anos, Andrew Macdonald estreia nas Olimpíadas, fato inédito até para ele, que no início da sua carreira, nem sonhava em um dia estar ali. Muito Feliz por competir, Andrew se emocionou ao ser entrevistado dizendo que ele próprio se sente “a fonte da juventude” e quer servir de exemplo aos jovens para que “agarrem o skate” e aos adultos “a não abandonarem o skate”, e há muita gente que vai dizer que “você é velho”, mas o skate é inclusivo. A cada manobra de Andrew, era possível ouvir o público ovacionando o veterano das pistas. Este encontro de velha guarda com os novatos da modalidade, descreve o que há de melhor entre a persistência, o amadurecimento e a energia. O Tempo foi, é, e será, o melhor amigo.
Para as crianças que curtem brincar sob quatro rodas, poder assistir a este espetáculo “não etário” é só mais um ponto que o skate traz para somar com a vitória de ter obtido Respeito e portas abertas às futuras gerações de Fadinhas e Kelvins, sem que isso cause o estranhamento social encravado no julgamento de que o skate é marginalizado.
Vimos duas mulheres pretas levando o Ouro e subindo no topo mais alto do pódio, agradecerem às mulheres mais importantes em suas vidas: Mãe e Avó.
Beatriz Souza dedicou a medalha à sua avó, e disse, em tom emocionante, “vocês podem, vocês conseguem” direcionando a fala a todas as meninas pretas do Brasil. Virtudes, Conquistas, Sonhos: o que Beatriz apresentou em Paris servirá de exemplo a inúmeras gerações de judocas e não judocas. O choro emocionado de uma menina – mulher Campeã Olímpica, em Rede Nacional, serve como amuleto às adversidades enfrentadas no dia a dia de inúmeras adolescentes em fase escolar, que agora se veem representadas por alguém tão forte, meiga e resiliente, como ela.
Não distante dali, a segunda a subir ao topo do pódio, Rebecca Andrade, após uma belíssima apresentação de ginástica, foi reverenciada pelas oponentes, entre elas, Simone Bailes, a favorita na modalidade. A Amizade, o carinho e a satisfação pela conquista uma da outra, descrevem um mundo de possibilidades possíveis de mudar cidadãos e fazê-los instrumentos transformadores na sociedade, e isso somente o esporte “fair play” é capaz.
Assistir aos Jogos Olímpicos com as crianças, é um ato político. Diferentes modalidades, diferentes corpos, altura, peso e cor da pele proporcionam uma formação saudável àqueles pais, mães e educadores, que estão dispostos e abertos ao diálogo.
Cabe a cada responsável, o papel de suprir as necessidades, não só fisiológicas do Ser infantil, mas como esta relação de presença e coletividade, observar hábitos culturais, relacionar sentimentos e demonstrar tudo isso com uma poderosa ferramenta que é o Esporte.
Trazer este olhar crítico e formador sobre as participações dos atletas nas Olimpíadas, independentes de medalhas, e saber utilizá-los num âmbito familiar – educacional, apontando as diferenças e exemplificando os desafios que cada atleta passou, é formar cidadãos melhores, que sentem e que sabem se colocar no lugar do outro.
O Brasil e o Mundo precisam que futuras gerações participem do coletivo, se emocionam com a superação e persistência do outro, só assim teremos cidadãos aptos a enxergar os desafios para a Mudança.