Por Luiza Diniz

A escolha do Catar como anfitrião da Copa do Mundo vem gerando polêmicas desde seu anúncio há 12 anos. Além das acusações do pagamento de propina que teria beneficiado o país árabe durante a eleição para a vaga de sede do mundial, o governo catari foi envolvido em denúncias feitas pela Anistia Internacional e pela Humans Right Watch por manter estrangeiros em condições de trabalho análogas à escravidão. De acordo com dados publicados pelo jornal britânico The Guardian, mais de 6,5 mil trabalhadores imigrantes morreram devido às circunstâncias precárias de emprego desde o início das obras para melhorias na capital Doha, em 2010. As autoridades locais negaram tal informação, estimando um número de óbitos menor do que o divulgado pela imprensa.

Porém, os conflitos envolvendo a monarquia absolutista do emir Tamim bin Hamad, levantaram questionamentos à FIFA quanto à proteção dos direitos humanos durante a realização dos jogos em 2022.

Cultura x Direitos Humanos

O Estado do Catar segue um modelo de governo extremamente tradicional baseado no patriarcado, cercado de controvérsias e com influência direta da religião predominante no território, o islamismo. Com os olhos do mundo voltados para o país-sede, as divergências culturais perante o Ocidente foram se apresentando, despertando inúmeras críticas. A ausência de liberdade das mulheres cataris, que vivem sob tutela masculina, necessitando de autorização de seus pais ou maridos para atividades básicas como estudar ou realizar exames médicos, a ausência de políticas contra violência doméstica, a proibição de demonstrações públicas de afeto e até um código penal que condena a homossexualidade com penas de até 7 anos de prisão.

Para a Copa do Mundo, os responsáveis pela organização do evento anunciaram que receberiam com hospitalidade turistas pertencentes à comunidade LGBTQIA+, porém a discriminação contra essas minorias se fez presente, despertando uma onda calorosa de manifestações.

Não é apenas sobre futebol

Após o início do mundial, em conjunto com a organização do evento, a FIFA anunciou uma série de restrições a serem cumpridas por torcedores e jogadores das seleções participantes do torneio. Da proibição do comércio de bebidas alcoólicas no interior e arredores dos estádios ao veto à utilização das tradicionais máscaras de luta livre pela torcida mexicana durante os jogos, as imposições baseadas na cultura e na religião dos donos da casa foram roubando a cena. Porém, a censura ao uso da braçadeira em apoio ao movimento One Love foi o gatilho para o embate político entre as seleções europeias e a FIFA, pela defesa dos Direitos Humanos.

 

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A campanha, iniciada na Holanda em 2020, tem como objetivo lutar contra a discriminação no futebol. O símbolo que traz em suas cores a representação da diversidade de raças, gêneros e orientações sexuais, estaria gravado nas braçadeiras de pelos menos 7 capitães de grandes seleções, mas foi vetado pela Federação Internacional sob ameaça de multas e punições esportivas, como a aplicação de cartão amarelo no início do jogo àqueles que descumprissem a determinação imposta.

As proibições impostas foram tidas como desrespeito, resultando em um movimento a favor dos direitos humanos por parte das seleções, que se uniram em protestos silenciosos. Em sua estreia contra o Irã, os jogadores ingleses se ajoelharam durante o hino em ato antirracista. Os atletas alemães taparam a boca na foto oficial na partida contra o Japão. Houve apoio também por parte da seleção dinamarquesa, que optou por utilizar o brasão da federação nas mesmas cores da camisa como forma de “escondê-lo”, carregando a mensagem de que não compactua com as decisões tomadas pela FIFA.

O discurso controverso da FIFA

Às vésperas do início da Copa do Mundo, uma carta assinada pelo presidente da FIFA, Gianni Infantino e pela secretária-geral Fatma Samoura, foi enviada para as 32 seleções participantes, conforme informação da emissora britânica Sky News. Em trecho divulgado, a FIFA pede que as seleções se concentrem no futebol:

“Por favor, vamos focar no futebol! Sabemos que o futebol não vive no vácuo e estamos igualmente cientes de que existem muitos desafios e dificuldades de natureza política em todo o mundo. Mas, por favor, não permita que o futebol seja arrastado para todas as batalhas ideológicas ou políticas que existem. Uma das grandes forças do mundo é a sua diversidade e se a inclusão tem algum significado, isso passa por ter respeito por essa diversidade. Nenhum povo, cultura ou nação é melhor do que outra”, diz o trecho da carta.

Infantino também falou sobre as opiniões contrárias à escolha do Catar como país-sede, devido ao seu histórico de violações aos direitos humanos. Em coletiva de imprensa realizada no início de novembro, o CEO alegou que as críticas à Copa do Mundo são hipócritas e que os europeus deveriam se desculpar pelos próximos 3 mil anos por seus atos, antes de dar lições de moral aos outros.

Acerca dos protestos e reivindicações realizados pelas seleções participantes do mundial, em prol dos direitos humanos, a FIFA e seus representantes decidiram pelo silêncio.