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CORRIDA PELOS AGROTÓXICOS
Quando candidato, Jair Bolsonaro já declarava aos quatro cantos seus planos de levar mais agrotóxicos à mesa dos brasileiros. Para tanto, deixaria a raposa cuidando das galinhas (você já viu esse filme antes). Ele já se mostrava a serviço do agronegócio ao endossar uma antiga demanda do setor, que era a de acelerar os processos de registro de agrotóxicos pelos órgãos do poder público.
No que depender de mim, apenas o Ministério da Agricultura decidiria a liberação de defensivos”, disse ele, na mesma toada do recém-aprovado PL 6.299/2002. Conhecido como o PL do Veneno, o projeto de lei que há duas décadas tramitava no Congresso Nacional, dá plenos poderes ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), para fiscalizar e analisar e fixar prazo para a obtenção de registros no Brasil, entre outras atribuições.
No que depender de mim, apenas o Ministério da Agricultura decidiria a liberação de defensivos”, disse ele, na mesma toada do recém-aprovado PL 6.299/2002. Conhecido como o PL do Veneno, o projeto de lei que há duas décadas tramitava no Congresso Nacional, dá plenos poderes ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), para fiscalizar e analisar e fixar prazo para a obtenção de registros no Brasil, entre outras atribuições.
Nesse cenário, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, o Ministério da Saúde e do Meio Ambiente perdem a função histórica sobre a regulação dos agrotóxicos no Brasil. E assim, ao invés de buscar mais rigor na liberação desses produtos que fazem tão mal ao meio ambiente, que ameaçam a biodiversidade e adoecem a população, Bolsonaro, como sempre, prefere o inverso.
Em junho de 2018, um mês depois da declaração do então candidato, o PL avançou mais um passo no Congresso. O relator, o deputado federal Luiz Nishimori (PR-PR), concluiu pela constitucionalidade. Com a Comissão Especial aprovando o parecer do relator, neste ponto já estava pronto para ser pautado em plenário.
Além de ser apontado por atuar na defesa do agronegócio e até “pagar” financiamento de campanha, novas denúncias do De Olho nos Ruralistas indicam outros possíveis conflitos de interesses na tramitação da lei. Segundo a agência de jornalismo investigativo, Nishimori fez acordo por dívida de R$ 1,5 milhão com a Syngenta. “A “composição amigável” foi assinada em dezembro de 2020, quando já tramitava na Câmara o PL”, diz trecho da reportagem.
Logo, Bolsonaro era eleito. Pressionado pela bancada ruralista, que o ajudou a se eleger, anunciou que a presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), a então deputada federal Tereza Cristina (DEM-MS), seria ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
A essa altura ela já era conhecida como “musa do veneno” ou “menina veneno”. Em sua primeira entrevista disse à imprensa que a pauta sobre a alteração de regras para os agrotóxicos no Brasil teria muito espaço em sua gestão.
Tudo ficou mais fácil quando no início de 2021, Arthur Lira (PP-AL) – outro integrante da FPA – chegou à presidência da Câmara Federal. Um dos primeiros compromissos foi justamente uma reunião com esses deputados, que entregaram a Lira, uma lista de pautas prioritárias do bloco, incluindo o PL do Veneno. À ocasião, Tereza voltou a dizer que tinha expectativas que o projeto fosse votado.
Com o projeto de lei parado no Congresso, Bolsonaro tratou de estimular sua retomada. Via decreto em 8 de outubro de 2021, permitiu que pesticidas que causam doenças como o câncer, pudessem ser liberados no país caso houvesse um “limite seguro de exposição”. O decreto também incluiu o Ministério da Agricultura em mais processos relacionados ao uso, fiscalização e regulamentação dos pesticidas. Foi uma espécie de abre-alas da votação do PL do Veneno.
O resultado da união dessas forças políticas e lobby permanente da indústria do agrotóxico você já conhece: ele foi aprovado em regime de urgência em 9 de fevereiro de 2022.
Agora, o projeto de lei que revoga a atual Lei dos Agrotóxicos e flexibiliza as regras de aprovação e comercialização desses produtos químicos está de volta ao Senado. A matéria retorna em forma de substitutivo, após 2 décadas de tramitação.
Foi o então senador, Blairo Maggi – bilionário da soja – que apresentou o projeto em março de 2002. Em um cenário político marcado por projetos de morte encabeçados ora pelo Governo de Jair Bolsonaro, ora pelo Congresso, o PL 6299 encontrou terreno fértil.
PACOTE DE PROJETOS DE MORTE
Abrindo um parênteses, vale ressaltar que Bolsonaro age a serviço dos grandes empresários do agronegócio, mineração e madeireiros. O governo federal já anunciou que um de seus focos para 2022 – contando com apoio da bancada ruralista – é o de dar andamento ao projeto de genocídio da população indígena e promover ainda devastação ambiental.
Na agenda legislativa prioritária divulgada em 9 de fevereiro, constam como prioridades não só o PL do Veneno, como também os projetos de lei:
– 490/2007: acaba com as demarcações de terras indígenas
– 191/2020: proposta de Bolsonaro para liberar a mineração em TIs
– 2633/2020: que recompensa grileiros promovendo a legalização de reivindicações ilegais de terras
– 5518/2020: versa sobre as concessões florestais. Visa agilizar o processo licitatório, prevendo flexibilidade aos contratos
– 3729/04: busca criar padrões simplificados para o licenciamento ambiental
Ou seja, tem muita luta!
Na agenda legislativa prioritária divulgada em 9 de fevereiro, constam como prioridades não só o PL do Veneno, como também os projetos de lei:
LIBEROU GERAL
Você sabia que enquanto a bancada ruralista se articulava para a votação do PL do Veneno e Bolsonaro publicava decreto como rito de passagem para sua aprovação, seu governo corria contra o tempo na liberação de mais agrotóxicos? Além do decreto que flexibilizou a aprovação de agrotóxicos, facilitando registro até mesmo, de venenos causadores de câncer e mutação genética, no Diário Oficial da União pipocaram publicações com a liberação de novos produtos.
Desde que foi eleito, Bolsonaro aprovou 1603 novos produtos no Brasil. Imagine só como ficará a saúde do brasileiro se o PL que abrevia o rito de aprovação de novos agrotóxicos e encontra brechas para liberar produtos que a atual legislação proíbe, passar no Senado!
Só nos primeiros 19 dias de fevereiro de 2022, o Governo aprovou a comercialização de 51 novos produtos agrotóxicos, com uma regularidade expressiva: nos dias 3, 7 e 18. Encontramos esses dados no perfil Robotox no Twitter. O robô tuíta sempre que o Governo Federal libera um registro de novo agrotóxico no mercado brasileiro. O projeto é da Agência Pública e da Repórter Brasil que monitora os registros no Diário Oficial da União.
Bolsonaro, ao que parece, está comprometido em ser um recordista da liberação de agrotóxicos. Para se ter uma ideia, em 2005 surgiram apenas cerca de 90 produtos no mercado. O número subiu para 150 em 2015 e deu um salto para 450 em 2018, no governo Michel Temer. Com Bolsonaro à frente da presidência em 2019 foram 474; em 2020, 493 e em 2021, 562.
Pressão sobre o Senado
Se aprovado no Senado Federal, o PL do Veneno – que retorna à casa depois de modificações aprovadas pelos deputados – pode rapidamente virar lei. Se aprovado com mudanças, volta para a Câmara e se for sem, segue para a Presidência da República, para sanção de Bolsonaro. É por isso que os senadores estão no foco na pressão popular.
Questionado se seguirá o mesmo compasso do regime de urgência com que o PL do Veneno foi votado pela Câmara, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) disse em coletiva que seguirá os critérios técnicos e que que independentemente da colocação desse projeto na lista de prioridades do governo federal, sua tramitação dependerá da avaliação dos senadores.
“Certamente esse projeto será colocado na reunião de líderes, e os líderes vão poder opinar a respeito da prioridade deles. É o próprio andamento do projeto aqui na Casa”, disse.
(Contraponto)
Abrindo novo parênteses, o presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), o senador Jaques Wagner (PT-BA) considera que se aprovado o PL, o que virá depois, pode colocar sob risco o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. O debate começou entre os senadores, marcado por divergências.
“Se avançar no Senado como veio da Câmara federal será um desastre do ponto de vista ambiental. Irá permitir que mais agrotóxicos cheguem à mesa dos brasileiros, além de promover o completo desmonte da regulação dos agrotóxicos no país. Claramente prioriza os interesses econômicos e põe em risco toda a sociedade, com repercussões de curto, médio e longo prazo, tanto para as gerações atuais quanto futuras”, diz.
Em contraponto ao PL, o senador apresentou no final do ano passado, o PL 3.668/2021, que pretende acelerar o estabelecimento de um marco jurídico para a produção de bioinsumos, de forma a serem usados como meio de manejo biológico.
Fiocruz alerta Senado sobre doenças e mortes
Pesquisadores do Grupo de Trabalho Agrotóxicos e Saúde, da Fiocruz divulgaram no dia 14 de fevereiro, um comunicado endereçado aos senadores, alertando sobre o impacto na saúde pública da aprovação do Projeto de Lei (PL) nº 6.299/2002.
Dentre vários pontos, criticam a retirada de atribuições de estados, municípios e dos ministérios da Saúde (MS) e do Meio-Ambiente (MMA). Para os pesquisadores do Grupo, o PL ainda fragiliza ações desempenhadas pelo SUS, como as de monitoramento e vigilância, e coloca sob responsabilidade exclusiva do Mapa a divulgação dos resultados sobre monitoramento.
Eles manifestam preocupação quanto aos prejuízos para o ambiente e a saúde da população, e advertem para os danos aos processos de registro, monitoramento e controle de riscos. Eles reforçam a expertise da Fiocruz ao afirmar que o PL irá impor graves retrocessos à sociedade, “ampliando a contaminação ambiental e a exposição humana aos agrotóxicos, que podem se materializar em adoecimento e morte da população, em especial daqueles em maior situação de vulnerabilidade”.
O GT faz um apelo aos senadores para que considerem esses posicionamentos e as preocupações de cientistas nacionais e internacionais que estudam os danos decorrentes dessas substâncias. “Como instituição pública especializada, a Fiocruz se coloca à disposição para debater com profundidade e auxiliar Vossas Excelências na tomada de decisão sobre um PL que afetará de forma substancial a saúde e o meio ambiente”, concluem.
O que muda com o PL do Veneno?
No documento, a Fiocruz elenca sete pontos críticos que impactarão na saúde dos brasileiros:
1. Permite o registro de produtos mais tóxicos, como aqueles que causam câncer, problemas reprodutivos, distúrbios hormonais e para o nascimento, segundo estudos científicos robustos, ao modificar a lei de 1989. Por essa razão, o PL não permitirá a aprovação de produtos mais modernos e de menor toxicidade. Ao contrário, o Brasil será muito mais permissivo para o registro de agentes mais tóxicos e obsoletos, tornando-se mercado preferencial para esses produtos, uma vez que grande parte já foi proibida em outros países exatamente por serem muito tóxicos. Os destinos preferenciais dos produtos mais seguros para a saúde humana e para o ambiente serão aqueles países cuja regulação é mais protetiva.
2. Retira a função histórica dos Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente sobre a regulação dos agrotóxicos, usurpando o poder de decisão sobre o registro desses agentes.
3. Confere ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) maior poder de decisão sobre esses produtos que podem afetar a saúde e o ambiente, sem a interveniência dos respectivos Ministérios, que têm a prerrogativa legal e a capacidade técnica, em suas respectivas áreas de atuação, de opinar sobre as nocividades dos agrotóxicos.
4. Apoia-se em argumentos frágeis. Considerando-se que o arcabouço regulatório atual prevê que a análise do registro de produtos de grande interesse agronômico e do mercado sejam considerados prioritários na fila de avaliação dos órgãos reguladores (Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama, e Mapa), não se justifica, para esse fim, que seja necessária a aprovação do PL e que as funções sejam deslocadas para o Mapa.
5. Promove maior fragilização das diversas ações desempenhadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), especialmente quanto ao monitoramento e vigilância da água, da qualidade dos alimentos, dos ambientes de trabalho e das populações expostas aos agrotóxicos, além de sobrecarregar as ações assistenciais em 2 todos os níveis de atenção à saúde devido ao potencial aumento de casos de adoecimento pela exposição a esses agentes.
6. Retira o poder dos estados e municípios para legislar de forma mais protetiva sobre o que estará determinado pelo PL, desconsiderando características de cada território, desde clima, relevo, condições ambientais, perfil populacional até a estrutura dos serviços de saúde para atendimento dos casos esperados de doenças.
7. Coloca sob responsabilidade exclusiva do Mapa a divulgação dos resultados sobre monitoramento de agrotóxicos em água e alimentos, sem uma devida interpretação dos órgãos de saúde e meio ambiente sobre as consequências dos achados nas suas respectivas áreas de conhecimento.
Este é o viés da perspectiva da saúde pública. Há ainda outras mudanças do PL que devem ser destacadas.
- A indústria do agrotóxico vai se beneficiar com a flexibilização das regras. Se o produto não for analisado no prazo previsto no projeto de lei, pode ganhar um registro temporário. Atualmente, este tipo de registro vale para fins de pesquisa e experimentação. A análise final do produto pode sair entre três e oito anos.
- Nos dias de hoje, a sociedade organizada pode requerer o cancelamento do registro de um produto e este, passar por uma reavaliação. Foi assim com o paraquate, agrotóxico associado à doença de Parkinson, proibido pela Anvisa em 2020. Mas, com a nova proposta, isso só ocorrerá se organizações internacionais alertarem para os riscos, ficando apenas a encargo do Ministério da Agricultura a instauração de procedimento de reanálise de um registro.
- O PL do Veneno só proibiria a liberação de agrotóxicos caso tivessem um “risco inaceitável”, ou como explicita o PL, o registro só seria proibido se continuasse a oferecer risco para os seres humanos ou meio ambiente, mesmo se fossem tomadas medidas de gestão de risco. Imagina só a que ponto estaríamos quando isso ocorresse! A legislação atual proíbe em vários casos: quando por exemplo, que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, com base em avaliação da comunidade científica ou cujas características causem danos ao meio ambiente, por exemplo.
Novos ponto:
- O PL traz atualizações para a Lei dos Agrotóxicos. Uma delas é que o projeto autoriza que o engenheiro agrônomo prescreva receituário antes da praga ocorrer
De agrotóxico para pesticida
O PL do Veneno quer até evitar o uso do termo agrotóxicos, adotando o termo pesticida ou produto de controle ambiental, nomes usados em outros países. O Brasil é o único a adotar essa nomenclatura. Em entrevista ao G1, o autor do termo, o pesquisador e PhD em Agronomia, Adilson Paschoal, disse que foi no livro “Pragas, agrotóxicos e a crise ambiente: Problemas e soluções” (1977), que ele apareceu pela primeira vez.
Agrotóxico tem origem do grego: agros (campo) + tokicon (veneno). O vocábulo tem sentido geral, incluindo todos os produtos de natureza tóxica usados na agricultura (mais propriamente nos sistemas agrícolas ou agroecossistemas), para o manejo de pragas, patógenos e ervas invasoras.
“O vocábulo não é apenas etimologicamente correto como também o é cientificamente, sendo a ciência que estuda os efeitos desses produtos chamada toxicologia”.
Para o pesquisador do Departamento de Entomologia e Acarologia da Esalq/USP, o nome “cumpre todo o rigor exigido pela ciência e a exatidão terminológica requerida pelo nosso idioma”. Segundo ele, o termo pesticida significa “o que mata a peste’”, e que “peste é doença, o vocábulo não pode ser usado com sentido geral, englobando pragas, patógenos e plantas invasoras”.
A essa altura ela já era conhecida como “musa do veneno” ou “menina veneno”. Em sua primeira entrevista disse à imprensa que a pauta sobre a alteração de regras para os agrotóxicos no Brasil teria muito espaço em sua gestão.
DEPENDÊNCIA DE AGROTÓXICOS
O pesquisador brasileiro que criou o termo “agrotóxico” comentou ainda, que o Brasil é um país dependente de agrotóxicos, por conta da produção em larga escala e quase o ano todo. Mas a aplicação continuada fez com que as pragas não morressem, mas ganhassem resistência.
A perda de eficiência dos produtos catapulta a procura por mais agrotóxicos e cada vez mais perigosos. Para aumentar a efetividade dos agrotóxicos, têm sido feitas misturas com mais de um princípio ativo (base do agrotóxico), o que faz aumentar o uso de veneno. Assim, como explica, o agrotóxico combate o efeito (a praga, o patógeno) e não os fatores que desencadeiam os ataques.
MAIS UTILIZADOS
Os agrotóxicos são utilizados na maioria dos alimentos do Brasil. Os inseticidas e fungicidas costumam ser usados antes do plantio, no tratamento das sementes, assim como os herbicidas, mas também podem atuar depois da colheita, para evitar a proliferação de doenças durante o armazenamento dos produtos.
Herbicida: age contra ervas daninhas;
Fungicida: contra fungos que causam doenças;
Inseticida: contra insetos;
ALIMENTOS CAMPEÕES DE AGROTÓXICOS
Segundo o Ibama, desde 2009 o Brasil é o país que mais consome agrotóxicos no mundo. O uso incorreto e demasiado desses produtos químicos pode trazer sérios danos à saúde humana. Foi para avaliar continuamente os níveis de resíduos de agrotóxicos nos alimentos que a Anvisa criou em 2001, o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para).
O último levantamento divulgado, em 8 de dezembro de 2021 aponta que havia níveis elevados de agrotóxico em quase um terço (28%) das frutas, vegetais e hortaliças analisadas. Isso acontece quando o agricultor excede no limite permitido. Seja, por exemplo, porque não seguiu a orientação da bula, seja porque a praga era mais resistente.
Pelo terceiro ano seguido o pimentão lidera o primeiro lugar no ranking dos alimentos com maior número de amostras contaminadas. Mais de 90% das amostras apresentaram problemas. Na sequência, com as maiores porcentagens de amostras irregulares estão o morango e o pepino, com mais de 63% e 57%, respectivamente. Todos os anos o Para detecta amostras com teores de resíduos de agrotóxicos acima do permitido e o uso de defensivos não autorizados para determinada cultura.
A porcentagem diz respeito à quantidade de amostras reprovadas:
Pimentão 91,8%
Morango 63,4 %
Pepino 57,4%
Alface 54,2%
Cenoura 49,6%
Abacaxi 32,8%
Beterraba 32,6%
Couve 31,9%
Mamão 34,4%
Tomate 16,3%
TIRO QUE SAI PELA CULATRA
Novo parênteses: Se o apelo dos grandes produtores é aumentar a produtividade e rendimentos econômicos para o país, de outro lado, com a porteira aberta para os agrotóxicos, qual será a qualidade desses alimentos para a exportação? É possível que haja restrição à entrada de alimentos brasileiros em outros países. O liberou geral do PL do Veneno pode vir a se tornar um problema, afinal, abre a porteira para muitos produtos que foram banidos na Europa ou Estados Unidos, por exemplo.
BISNAGUINHAS BOLACHAS E BISCOITOS
Em pesquisa recente divulgada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), constatou-se que os resíduos de agrotóxicos permanecem até em produtos ultrap, como bisnaguinhas, bolachas recheadas, biscoito de água e sal, cereais matinais, bebidas de soja e salgadinhos. São produtos que infelizmente muitas crianças comem todos os dias.
Ao todo 27 produtos analisados, divididos em oito categorias. Dessas, seis apresentaram resíduos de agrotóxicos.
De acordo com análise, os produtos onde foram identificados agrotóxicos são:
- a bebida de soja Naturis (Batavo)
- o cereal matinal Nesfit (Nestlé)
- os salgadinhos Baconzitos e Torcida (ambos da Pepsico)
- os pães bisnaguinha Pullman (Bimbo), Wickbold, Panco e Seven Boys (da Wickbold)
- os biscoitos de água e sal Marilan, Triunfo (Arcor), Vitarela e Zabet (ambos da M Dias Branco)
- as bolachas recheadas Bono e Negresco (Nestlé), Oreo e Trakinas(Mondeléz)
Uma bisnaguinha da marca Panco apresentou 8 tipos diferentes de agrotóxicos na análise realizada.
“Com o aumento vertiginoso da aprovação dos venenos nos últimos anos somados à flexibilização a partir da Pacote de veneno, é bem provável que tanto a variedade de tipos de agrotóxicos como a quantidade deles presente aumente mais ainda os riscos à saúde”, a coordenadora do programa de Alimentaçãaudável e Sustentável do Idec, eutho.
“Precisamos é de uma Lei que elimine os agrotóxicos de alimentos. A aprovação deste PL demonstra que o Brasil está seguindo no caminho oposto do que apontam as pesquisas e conferências internacionais que mostram a necessidade de redução da utilização de agrotóxicos, com regulações e monitoramentos mais rígidos, protegendo as pessoas e os recursos naturais”, disse ela.
DÁ PARA TIRAR AGROTÓXICO DO ALIMENTO?
Segundo a Anvisa, os agrotóxicos podem ser classificados em dois grandes modos de ação: sistêmico e de contato.
Os agrotóxicos sistêmicos atuam no interior das folhas e polpas, penetrando nelas.
Já os de contato agem, principalmente, nas partes externas do vegetal, embora uma quantidade possa ser absorvida pelas partes internas.
Desta forma, os procedimentos de lavagem dos alimentos em água corrente e a retirada de cascas e folhas externas podem ajudar a reduzir os resíduos de agrotóxicos presentes na casca do alimento, mas é incapaz de tirar o que está contido no interior dele.
“A imersão prévia dos alimentos por 20 minutos em água com hipoclorito de sódio (água sanitária) pode – e deve – ser feita com a finalidade de diminuir a contaminação por germes e micróbios”, diz trecho de recomendação.
Para fazer a mistura:
- 1 litro de água filtrada;
- 1 colher de sopa de bicarbonato de sódio ou 1 colher de café de hipoclorito (água sanitária) ou 2 colheres de vinagre;
Mas para evitar o consumo de frutas, verduras e hortaliças que podem estar contaminadas, a Anvisa recomenda:
- Consumir alimentos orgânicos ou provenientes de sistemas agroecológicos
- Adquirir os alimentos da “época” (safra), que costumam receber, em média, carga menor de agrotóxicos
- A impossibilidade de aquisição de alimentos orgânicos não deve ser motivo para diminuir o consumo de frutas, legumes e verduras produzidos pelo sistema convencional de cultivo.
Com o avanço da tecnologia, produções científicas estão sendo desenvolvidas no Brasil e no mundo para tentar acabar totalmente com a contaminação causada por agrotóxicos nos alimentos e nos líquidos ingeridos. Em reportagem sobre o assunto, o projeto Por Trás do Alimento elencou projetos promissores.
AGROTÓXICO NA ÁGUA
Venenos agrícolas chegam até o solo, são levados com a chuva… chegam aos rios que muitas vezes fornecem água para a população e daí você já imagina…
Em junho de 2019 o Por Trás do Alimento, realizado pela Agência Pública, Repórter Brasil e Public Eye, divulgou também, o resultados de um levantamento sobre a contaminação da água por agrotóxicos no Brasil, com base em dados disponibilizados no Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano – SISAGUA –, de responsabilidade do Ministério da Saúde.
Esta, revelou que em um copo de água potável podem estar presentes 27 tipos diferentes de agrotóxicos.
O coquetel que mistura diferentes agrotóxicos foi encontrado na água de 1 em cada 4 cidades do Brasil entre 2014 e 2017. Nesse período, as empresas de abastecimento de 1.396 municípios detectaram todos os 27 pesticidas que são obrigados por lei a testar.
Desses, 16 são classificados pela Anvisa como extremamente ou altamente tóxicos e 11 estão associados ao desenvolvimento de doenças crônicas como câncer, malformação fetal, disfunções hormonais e reprodutivas. Entre os locais com contaminação múltipla estão as capitais São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Manaus, Curitiba, Porto Alegre, Campo Grande, Cuiabá, Florianópolis e Palmas.
Representando a Associação Brasileira de Agroecologia à ocasião da audiência pública, Murilo Mendonça alertou: “hoje podemos ter 27 agrotóxicos em um copo de água potável e ainda assim ela pode ser considerada potável, desde que esteja dentro dos valores máximos de resíduos estabelecidos no Brasil [denominado Valor Máximo Permitido – VMP], que estão muito além do que a Europa permite”.
Sobre a quantidade de agrotóxicos que aceitamos no Brasil, considerou uma verdadeira “agressão”, exemplificando com o o caso do glifosato, em que a concentração permitida no Brasil é 5 mil vezes maior que o permitido na Europa. “Do total de 27 pesticidas na água dos brasileiros, 21 estão proibidos na União Europeia devido aos riscos que oferecem à saúde e ao meio ambiente”, disse.
Clique aqui para descobrir se a água da sua torneira está contaminada.
E a água engarrafada?
Nem mesmo esta seria totalmente segura, apontam especialistas. Isso ocorre porque o recurso é retirado de mananciais subterrâneos ou nascentes, que não deixam de ser suscetíveis à contaminação. Mas no caso da água mineral engarrafada, há uma avaliação criteriosa até que chegue ao mercado. Atualmente, a Anvisa realiza análise a cada triênio.
Floresta envenenada
Mais um da série de estudos realizados pelo Por Trás do Alimento revelou que fazendeiros estão jogando grandes quantidades de agrotóxicos de avião sobre a floresta amazônica e outros biomas. Nos últimos 10 anos, cerca de 30 mil hectares de vegetação nativa foram literalmente envenenados. A área corresponde a 30 mil campos de futebol.
Esses foram os casos que caíram na fiscalização do Ibama, que aplicou mais de R$ 72 milhões em multas de 2010 a 2020 especificamente em casos de desmatamento com pulverização aérea de agrotóxicos. Com o desmonte da fiscalização ambiental promovida pelo governo Bolsonaro, o problema tende a ser maior do que os dados apontam.
Como todos esses casos ocorreram sem autorização dos órgãos ambientais, não é possível saber se os responsáveis tiveram o cuidado de tirar os animais e as pessoas que circulavam por essas áreas enquanto o avião jogava os químicos. Em Mato Grosso, estado que lidera o ranking de envenenamento da floresta, fiscais encontraram em uma fazenda que usou veneno para destruir a maior área de floresta, o agente laranja, 2,4-D, que era usado pelo exército norte-americano durante a guerra no Vietnã para “neutralizar” a floresta, usada como refúgio do exército local.
MORTE DAS ABELHAS
Fruto do trabalho de 34 autores, entre cientistas brasileiros e estrangeiros, o Atlas dos Insetos, lançado pela Fundação Heinrich Böll, alerta que os agrotóxicos são uns dos principais causadores da mortalidade entre os insetos. Dependendo do tipo, esses produtos podem causar mortalidade não só nas espécies alvo de sua ação (as chamadas pragas agrícolas), mas também a espécies benéficas como as abelhas, que podem ter seu sentido de orientação comprometido ou mesmo tornarem-se mais suscetíveis ao ataque de patógenos.
Apesar de vendido como solução, o agrotóxico afeta populações de polinizadores e pode trazer impactos na produção agrícola, já que 76% das plantas utilizadas para prover alimentos no país dependem da polinização feita por animais. Além disso, os chamados defensivos também podem reduzir a quantidade e variedade de insetos que se alimentam de pragas agrícolas e as controlam naturalmente, aumentando ainda mais a necessidade de aplicações de agrotóxicos, em um círculo vicioso.
Um dos casos mais alarmantes também foi denunciado pelo projeto Por Trás do Alimento, que tratava da morte de meio bilhão de abelhas entre os meses de dezembro de 2018 e março de de 2021. Segundo estimativas da Associação de Apicultura, secretarias de Agricultura e pesquisas realizadas por universidades, foram 400 milhões no Rio Grande do Sul, 7 milhões em São Paulo, 50 milhões em Santa Catarina e 45 milhões em Mato Grosso do Sul.
As análises laboratoriais identificaram o contato com agrotóxicos à base de neonicotinoides e de Fipronil, produto proibido na Europa há mais de uma década, o principal causador da mortandade, pois esses ingredientes ativos são inseticidas, fatais para insetos, como é o caso da abelha, e quando aplicados por pulverização aérea se espalham pelo ambiente.
O professor Tiago Maurício Francoy, do curso de Licenciatura em Ciências da Natureza da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP e especialista em abelhas, explica que isso ocorre porque as abelhas precisam buscar néctar e pólen das flores. “E elas acabam visitando as plantações, E esse uso de agrotóxicos, que aqui no Brasil está se tornando cada vez mais intenso e prejudicial, acaba por levar à morte essas abelhas”, afirmou Francoy ao Jornal da USP.
Compilado/Fontes utilizadas para pesquisa: Agência Pública, Repórter Brasil, O Globo, G1, Estadão, Casa Ninja Amazônia, Câmara Federal, Senado Federal, Anvisa, Ibama, Fiocruz, Idec, Jornal da USP