Manifesto assinado pelo grupo Carta de Belém e mais de 100 organizações questiona o “net zero”(Mídia Ninja)

 

Marcos Felipe Sousa, para a Cobertura Colaborativa NINJA na COP26

No segundo dia da Cúpula dos Povos (Coalizão COP26), o evento “Descarbonização com Net Zero? A arquitetura da privatização das florestas” promoveu um debate a partir das falsas soluções climáticas articuladas pelas grandes empresas, os estados nacionais e governos locais. Promovido pelo Grupo Carta de Belém, o debate buscou internacionalizar e refletir criticamente sobre a propaganda do conceito de “net zero” e como este paradigma está sendo implementado nos territórios e países do sul global.

A perspectiva “net zero” traz o objetivo de zerar as emissões líquidas de carbono. Todavia, o conceito é incorporado através da privatização e gestão de territórios, muitos pertencentes a povos indígenas e investimento na monocultura. Em um Manifesto assinado pelo grupo Carta de Belém e mais de 100 organizações da sociedade civil no Brasil, foi questionado o plano de “net zero” e a efetividade do mercado de carbono.

No Manifesto é apontado que os seus efeitos de implementação contribuem com atividades destrutivas aos ecossistemas e aos povos do sul global, como povos indígenas, através do extrativismo em grande escala, a mineração e o uso de combustíveis fosseis, pois, impulsiona essas atividades a serem compensadas em seus territórios. Nesse sentido, se questiona a financeirização da natureza por meio desse mercado de compensações de emissões ao lhes garantir a oportunidade de poluição e degradação. Como exposto no Manifesto, a lógica do crédito de carbono equivaleria a uma tonelada de dióxido de carbono, tendo essas emissões sendo comercializadas a partir do pagamento de excedente de emissões.

Durante o evento na Cúpula dos Povos, Souparna Lahiri (GFC/CLARA) declarou que “net zero” é um mito, e que o mercado internacional está se mobilizando através de acordos internacionais para a monetização da natureza com novas tecnologias. Souparna Lahiri cita que isso contribui para uma privatização das florestas e a manter a exploração dos recursos do sul global.

Larissa Parker (GRAIN) expôs que corporações e consultorias privadas estão manejando com lobby para uma narrativa hegemônica na COP26 em torno dos conceitos de emissões liquidas zero e soluções baseadas na natureza. Ela demarca que organizações da sociedade civil têm se manifestado contrariamente a esses pressupostos. Segundo Larissa Parker, em falsas soluções espoliativas, inviável a equivalência de remissão de carbono através de sumidouros de carbono para compensações. Principalmente em terras públicas e em territórios indígenas. Isso significaria o aumento das emissões ao utilizar projetos que compensem as emissões dos principais poluentes com a financeirização de bens comuns. Resultando em uma governança privada através de um “financiamento verde”, frisa Larissa Parker.

Camila Moreno (Grupo Carta de Belém) também denunciou sobre o que está por trás dos paradigmas do mercado de carbono apreciado por alguns setores na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas. Para ela, esse discurso tem se tornando comum na agenda oficial da COP26 e que representa um novo momento ao capitalismo. Em que o “net zero” não teria nada de zero em violações territoriais, gerando acumulação em dívidas sobre territórios e corpos. Pedro, que também integra o Grupo Carta de Belém, alertou como o governo federal brasileiro vem contribuindo com essas concepções.

Ele demonstrou que o Programa Floresta+ e o Programa Adote um Parque, sob o discurso da preservação da natureza, se insere nessa lógica de mercado e privatizações. Isso significaria acelerar a gestão privada de parques florestais e unidades de conservação, através do uso direto de terras públicas. As críticas ao conceito de “net zero” também foram reverberadas nas manifestações pela justiça climática que ocorreram em Glasgow no último final de semana.