Viva Maísa! A importância de sermos respondonas
Maísa respondia o que a geração das adolescentes empoderadas pensa. Enquanto se esperava que ela fosse meiga, gentil e risonha, ela foi RESPONDONA.
– Esse programa é um pretexto para juntar vocês dois, porque eu sei que vocês estão solteiros.
– Se for pra isso eu posso ir embora porque eu não estou aqui para arrumar namorado.
(…)
– Você já está com quinze anos e eu estou notando que você não está conseguindo arranjar namorado.
– Dá licença, Silvio? Isso é um ultraje, é constrangedor você me submeter a uma situação destas.
(…)
– Você não pode dizer que ele não é um rapaz bonito.
– Não faz o meu tipo.
(…)
– Você está preocupada com beleza facial ou beleza interior? Você já viu o interior dele? Ele é um rapaz inteligente, falante, espontâneo, sabe se comportar diante das câmeras.
Esses são trechos do diálogo entre Maísa Silva e Silvio Santos, que teve de milhões de visualizações nos últimos dias, chegando a ser o vídeo mais visto do SBT no youtube.
A partir do momento em que Silvio Santos insistiu que o tal do Dudu Camargo, pivô da confusão, tinha qualidades suficientes para ser namorado dela, Maísa começou a justificar as razões pelas quais não queria namorá-lo. E então disse que o rapaz era engessado, artificial e que soava falso (o que, cá entre nós, é a mais pura verdade).
Por isto, foi acusada de ser grosseira, mimada e mal educada. Inclusive por uma apresentadora incipiente, que se valeu da conhecida prática de falar mal de alguém famoso para surfar na onda da polêmica.
Mas vamos ser francas? Ela não precisaria ter dito os motivos pelos quais não queria namorar o moçoilo, se Silvio Santos tivesse respeitado quando ela disse “ele não faz meu tipo”. Ao contrário de aceitar a resposta de Maísa, Silvio continuava insistindo naquela situação que Maísa já havia dito ser constrangedora.
O que Maísa fez foi AFIRMAR SUA VONTADE QUANDO FOI CONFRONTADA. Então por que foi acusada de ser mal educada e grosseira?
Porque queriam que ela reproduzisse o modelo de comportamento que secularmente tem sido imposto às mulheres: o de aturar abordagens inconvenientes e invasivas como se fossem brincadeirinhas que teríamos que suportar com um riso humilde e tímido no rosto.
Levantar a voz? Reafirmar nosso desejo? Fazer respeitar nossa posição? Não. Melhor ser meiguinha. Melhor sorrir sem responder. Melhor disfarçar e mudar de assunto.
Não foi à toa que Maísa foi tão atacada (e tão elogiada!) nas redes sociais!
A resposta dela foi na jugular da cultura machista que quer forçar a mulher ao silenciamento e à submissão gentil e delicada e ao comportamento de boa moça que não cria constrangimentos para o homem. Mesmo quando ele lhe constrange.
Maísa não foi grosseira. Nem mal educada. Mas vou dizer que ela foi RESPONDONA.
E que bom que o foi.
Vou explicar porque foi importante que Maísa tenha sido respondona. Mas para isso vou contar uma história que, diferente da de Maísa, pouca gente ficou sabendo.
Uma jovem de cerca de 20 anos precisou de um serviço de recarga de tonner para o cartucho de sua impressora. A impressão era para um trabalho urgente e muito importante. Quando o dono do estabelecimento se viu a sós com ela, disse que precisava urinar com pressa, mas que estava com as mãos sujas de tonner e que não poderia tocar no seu órgão genital.
Sei que muitos vão ler sem acreditar ou até achar um pouco cômico. Sei também que muitos outros e outras vão dizer que ela deveria ter saído imediatamente do local e deixado para lá os tais cartuchos. Evidentemente, concordo com vocês. Ainda acrescento que deveria ter chamado a polícia.
Mas não foi isso o que se passou.
O dono do estabelecimento começou a falar que ela deveria ajudá-lo e deveria segurar seu pênis para que ele pudesse urinar. Pelo tom de autoridade, pela forma firme e resoluta como falou, ela começou a se desculpar porque não poderia fazer aquilo.
E congelou. Ficou paralisada, sem conseguir dar uma resposta à altura da situação, apenas se desculpando. Somente quando ele lhe devolveu os cartuchos, ela se retirou, apressada.
Ora, por que ela se desculpou por não ceder àquela situação absurda, agressiva e abusiva?
Porque nós, mulheres, somos secularmente ensinadas A NÃO RESPONDERMOS. A sermos meiguinhas. A sorrir. A obedecer. A disfarçar e mudar de assunto.
Numa sociedade em que a mulher é educada para baixar a cabeça para os homens, cenas como essa acontecem. As mulheres ficam paralisadas, achando que desobedecer é errado. Que responder é errado. Que impor respeito é errado. O comando de submissão é tão forte que muitas mulheres se vem instadas a obedecerem e a não reagirem.
As mulheres precisam com urgência se EMPODERAR. Não faltam canalhas como esse. Não há um único lugar em que estejamos livres do risco de nos depararmos com eles. Pode ser na universidade, no trabalho, na igreja, no sindicato, no comércio, nas redes sociais. Num programa de TV.
A gente não deve ter medo de responder e de reagir. De desobedecer. De dizer não.
E o que Maísa fez foi justamente isso. Enquanto se esperava que ela fosse meiga, gentil e risonha, ela foi RESPONDONA.
Quando Silvio Santos disse que o tal Dudu ganhava bem para sustentar um casamento, ela prontamente respondeu: E eu não ganho?!
Maísa respondia o que a geração das adolescentes empoderadas pensa. Respondia que não queria casar, mas viajar e conhecer o mundo. Não queria ser sustentada, mas ser financeiramente independente.
Maísa não deixou nenhuma vez que Silvio Santos lhe dissesse o que fazer ou gostar. Respondeu em todas. E não permitiu que seu desejo fosse definido por alguém que não ela própria. Encontrando um Silvio Santos muito acostumado a garotas meigas, Maísa impôs sua vontade com firmeza e resolução. O que poderia haver de errado nisto? Afinal, ela impôs sua vontade sobre ela própria e suas próprias escolhas, e não sobre as de outra pessoa. Se alguém deveria se desculpar, esse alguém é Silvio Santos.
Ela fez tudo o que queremos que nossas mulheres aprendam a fazer, rompendo um ciclo de opressão e silenciamento que tem nos calado por séculos.
De forma despretensiosa, Maísa ensinou que quando um homem não respeitar nossas escolhas, devemos nos manter firmes. E responder sempre: quem define o que queremos somos nós mesmas.