Uruguai: o regresso da esquerda e a luta pela justiça social

Chegamos ao último ano eleitoral com muita intensidade, mas também com muitos medos. Leia artigo de Sonia Acosta, militante feminista frenteamplista

Por Sonia Acosta*

No nosso imaginário, os uruguaios são um pouco pessimistas, aborrecidos, “sérios”. Se fôssemos uma cor, diria que somos um pouco cinzentos. Mas, neste cantinho da América Latina, um pouco atrasado, temos construído algumas cores que são muito nossas. Foi assim que fomos formando esta Frente Ampla de “acumulação positiva”, como disse Yamandú Orsi nesta última campanha eleitoral, com a soma de todas as partes e a participação de todos.

Chegamos ao último ano eleitoral com muita intensidade, trabalhando e militando arduamente por esta vitória, mas também com muitos medos. A dureza do modelo neoliberal, que se constrói a partir da mais absoluta crueldade, com discursos e políticas que ameaçam todos os avanços progressistas, nos assustou, mas não nos derrotou.

Foram cinco anos muito duros para o Uruguai, marcados por grandes retrocessos no plano econômico, político e social, com desigualdades crescentes. A direita chegou ao governo com um espírito revanchista; parecia que tantos anos de progressismo tinham sido um ataque direto contra eles. Era necessário perceber o impacto de cada medida não apenas na sua dimensão material, mas também simbólica. Os 15 anos de governo da Frente Ampla precisavam ser apagados rapidamente e sem anestesia.

Com a pandemia no meio, o povo organizado resistiu à falta de políticas públicas por meio das cozinhas populares. Na ausência de medidas para atender os setores mais vulneráveis, emergiu a solidariedade e o compromisso popular com o tempo histórico.

Assim começou a era “multicolor”, protegendo o capital e desprezando qualquer medida que pudesse dar proteção a algum setor identificado como “de esquerda”, numa simplificação tão grosseira quanto mentirosa.

Mas, como diz Pepe Mujica, “triunfar na vida não é vencer, mas levantar-se toda vez que se cai”, e nós aprendemos a lutar pela vida acima de tudo.

Na noite de 24 de novembro, voltamos a festejar como da primeira vez, com a esperança e a convicção de construir um Uruguai melhor para todos.

Estamos conscientes da enorme responsabilidade que nos cabe: sermos e fazermos parte da construção da felicidade pública.

Neste momento crucial, em que as velhas gerações deixam a cena pública para dar lugar ao novo tempo, somos abraçados pelos desafios que virão, pela incerteza do que podemos fazer, pelas forças coletivas que devemos reunir para evitar o triunfo da crueldade.

Teremos de fazer o nosso melhor para que a política não perca o seu valor, para que não debatamos ao nível do chão. Perante a despersonalização provocada pelas redes sociais, na era das “fake news”, hoje a nossa revolução é não perder o contato presencial com o nosso povo.

A nossa América Latina precisa que nos mantenhamos firmes nos nossos ideais, mas com a convicção prática de que só o progressismo assegurará a justiça social.

Se acreditamos que a principal contradição ainda é entre Vida ou Morte, construamos uma vida possível para todos.

Somos convidados pela história a ser parte ativa da luta.

Construamos as pontes necessárias.

Precisamos uns dos outros!

Sonia Acosta é militante feminista frenteamplista