Por Luiz Vieira*

Quando Julieta Ines Hernández Martinez foi brutalmente assassinada, muitas amigas próximas me revelaram que elas paralisaram, não souberam reagir, demoraram um tempo para processar tudo que havia acontecido com a artista venezuelana. Quando recebi no celular a notícia da morte de Leonardo, fiquei um bom tempo refletindo também, porque apesar de serem dores diferentes, existe um lugar na luta onde a gente se encontra.

As violências contra a comunidade LGBTQIAPN+ venceram as dobras do tempo. Um medo ancestral, que agoniza a nossa carne e nos coloca em constante sinal de alerta, paira sempre no ar. Leonardo foi baleado e morto no dia 12 de junho após marcar um encontro em um aplicativo de pegação para homens gays e bissexuais. Caiu numa emboscada. Esse caso não é um caso isolado, visto que o Brasil é o país que mais mata pessoas LGBTs no mundo.

Dado o contexto, é preciso falar de outras camadas que assolam a comunidade. O nosso afeto ainda é motivo de perseguição, inúmeras violências e morte. Por mais que a gente fale, esclareça ou busque diálogo, a sociedade ainda insiste em jogar na nossa cara que os nossos afetos só podem existir de forma clandestina, correndo risco de vida.

Muitas pessoas questionaram o fato de Leonardo compartilhar com amigos próximos sua localização antes de sair de casa para o encontro e deixar avisado o horário que pretendia voltar e, caso não voltasse, podiam chamar a polícia. Não fazemos isso à toa. Vem aumentando de forma expressiva os casos de golpes em aplicativos LGBTs e muitos acabam perdendo a vida, como Leonardo. Infelizmente, vivemos nossos desejos de forma marginal e com medo de não voltar para casa.

Dito isso, me pergunto até quando as violências contra as pessoas LGBTs vão persistir. Bem no mês do orgulho, deixaram mais um recado. Eles não suportam a nossa felicidade, querem interromper nosso gozo, nos aniquilar. Nos versos, Caio Prado diz:

Uma foto, uma foto

Publicada no jornal pela manhã

Uma foto, uma foto

Na denúncia de perigo na televisão

Uma foto

Estampada numa grande avenida

Uma foto

Publicada no jornal

Uma foto

Na denúncia de perigo na televisão

A placa de censura no meu rosto diz

Não recomendado à sociedade

A tarja de conforto no meu corpo diz

Não recomendado à sociedade

A placa de censura no meu rosto diz

Não recomendado à sociedade

A tarja de conforto no meu corpo diz

Não recomendado à sociedade

Pervertido, mal amado, menino malvado, muito cuidado

Má influência, péssima aparência, menino indecente, viado

As pessoas LGBTs também devem ter direito de viver o amor romântico, por mais complexo que ele seja. Precisamos contar as nossas histórias para que a sociedade passe a olhar os nossos afetos como possíveis, porque eles são. Não estamos buscando aprovação, mas respeito, acima de tudo. Parem de nos matar.

*Luiz Vieira é jornalista, ator, ativista e colunista do FODA – Fora do Armário, uma rede de mobilização LGBTQIA+ que reúne ativistas contra LGBTfobia e realiza ações e narrativas pela valorização da diversidade sexual e de gênero.