por Marcele Oliveira (Campeã Jovem do Clima da Presidência da COP30), Andrew Potts (Preserving Legacies) e Alison Tickell (Julie’s Bicycle)

À medida que formuladores de políticas climáticas internacionais se preparam para se reunir em Belém para a COP30, uma verdade simples se impõe: até agora, essas políticas falharam em reverter a crise climática.

Apesar dos avanços na transição para fontes de energia mais limpas e do crescimento dos investimentos alinhados ao clima, o mundo continua perigosamente fora de rota para cumprir as metas do Acordo de Paris.

Essa falha se deve, em parte, ao fato de as políticas continuarem ignorando um fator crítico — e uma solução já comprovada: a cultura. Ainda é incerto se a COP30 abordará de forma significativa essa lacuna. O que está claro é que, sem enfrentar os fatores sociais e culturais que facilitam ou dificultam os caminhos para 1,5 °C e a transição verde, a crise climática se aprofundará.

No fundo, a mudança climática é uma crise cultural — um choque entre valores extrativistas e os limites planetários. Cumprir as metas do Acordo de Paris exige uma transformação social sem precedentes, profunda e sistêmica. A cultura é a estrutura que mantém unidas as comunidades e as sociedades.

As artes, o patrimônio, as indústrias criativas, os conhecimentos indígenas e os saberes locais oferecem ferramentas poderosas para a educação, a criação de narrativas, o design regenerativo e a mobilização. São chaves para uma transição justa rumo a futuros sustentáveis.

Essa compreensão existe desde a COP1, em Berlim (1995), quando líderes indígenas defenderam que o planejamento climático fosse enraizado em cosmovisões e práticas culturais alternativas.

A partir dessa defesa, os povos indígenas se aproximaram do centro das políticas climáticas, ainda que abordagens tecnocráticas e de mercado sigam predominando nas COPs. Com o tempo, o movimento se fortaleceu, e a ação climática passou a ser abraçada por atores culturais em todo o mundo.

A presença cultural dentro das COPs também cresceu, com artistas, artivistas e redes criativas se mobilizando cada vez mais. Desde a COP25, em Madri (2019), a Climate Heritage Network — uma coalizão que representa mais de 500 organizações — tem defendido sistematicamente a inclusão da cultura no centro das políticas climáticas.

A COP26, em Glasgow (2021), marcou a primeira menção à palavra “cultura” em uma decisão oficial de COP, e a COP27 incluiu o termo “patrimônio cultural” em sua decisão de cobertura.

Essas referências simbólicas foram seguidas, em 2023, por um avanço político: o Marco do Objetivo Global de Adaptação (GGA), adotado na COP28, em Dubai, passou a incluir a proteção de sítios e práticas culturais entre suas 11 metas de adaptação. O texto reconhece a importância dos conhecimentos tradicionais, indígenas e locais, além da valorização das habilidades, valores e atitudes.

No período que antecedeu a COP28, foi lançada a campanha “Chamada Global para Colocar o Patrimônio Cultural, as Artes e as Indústrias Criativas no Centro da Ação Climática”, que mobilizou milhares de pessoas em defesa de um Plano de Trabalho da UNFCCC voltado à cultura.

Colocar as pessoas no centro — tanto no conteúdo das políticas climáticas quanto em sua elaboração — é essencial. Políticas realmente transformadoras precisam reconhecer e fortalecer práticas culturais baseadas na experiência vivida.

Não há avanços nas negociações da COP sem o apoio dos governos nacionais. Para completar essa triangulação, também na COP28, os ministros da Cultura do Brasil e do país anfitrião, os Emirados Árabes Unidos — Margareth Menezes e Salem bin Khalid Al Qassimi — lançaram o Grupo de Amigos da Ação Climática Baseada na Cultura. Representantes ministeriais de mais de 30 países comprometeram-se a oferecer impulso político para integrar a cultura às políticas da UNFCCC, número que já cresceu para 56 países.

Ainda assim, o sucesso político da cultura tem sido parcial. O avanço do GGA é mais exceção do que regra. Talvez o ponto mais preocupante seja o fato de que a decisão do Balanço Global (GST) da COP28, concebida para orientar as políticas climáticas dos próximos cinco anos, tenha apagado as referências à dimensão social e cultural das trajetórias de 1,5 °C, desconsiderando recomendações da comunidade científica.

Em parte por causa disso, o progresso alcançado em Dubai não se traduziu em sucesso político na COP29, no Azerbaijão. A falta de uma base sólida em Baku agora traz implicações para Belém. Apesar dos apelos, a cultura ainda não está devidamente incorporada à agenda de negociações da COP30.

Mesmo assim, os desdobramentos mais amplos da COP30 trazem sinais de esperança. A nova Agenda de Ação, liderada pelo presidente-designado André Aranha Corrêa do Lago, inclui 30 objetivos estratégicos — considerados “superpontos de alavancagem” para a transformação. O Objetivo 19 destaca o papel da cultura e do patrimônio cultural na ação climática.

Um Grupo de Ativação da Agenda de Ação, apoiado pelos Campeões de Alto Nível Dan Ioschpe e Nigar Arpadarai, está desenvolvendo planos que incluem as campanhas Heritage Adapts! 3000 x 2030 e Cultural Power: Narratives for Change.

Ainda há tempo para que essas ações se convertam em sucesso político. Se a COP30 tiver uma decisão de cobertura, como nas edições anteriores, ela deve mencionar a cultura e o patrimônio. Mas, como já vimos, referências simbólicas por si só não bastam para preencher a lacuna cultural nas políticas climáticas.

É por isso que a campanha Global Call 2023 evoluiu para o movimento We Make Tomorrow, que busca garantir um reconhecimento mais profundo da cultura antes do Segundo Balanço Global (GST2), a ser lançado na COP31, em 2026.

Até o momento, os signatários representam mais de 200 mil vozes pedindo políticas que apoiem a cultura e ajudem as pessoas a imaginar e construir futuros de baixo carbono, justos e resilientes ao clima.

A Campeã Jovem do Clima da Presidência da COP30, Marcele Oliveira, é uma das principais vozes do movimento We Make Tomorrow e tem destacado a importância da cultura nas discussões sobre mudança climática — especialmente na mobilização e proteção de crianças e jovens, promovendo o diálogo intergeracional.

Durante a COP30, ações culturais estarão por toda parte — nas zonas oficiais, em Belém do Pará, online e em diversos lugares do mundo. Atores culturais se manifestarão sobre temas como racismo ambiental e justiça climática, promovendo economias circulares e defendendo soluções baseadas na natureza.

A ação cultural sempre floresceu nas ruas, nas galerias e nos espaços fora das COPs. Agora, precisa florescer também dentro dos corredores de negociação.

Devemos aproveitar essas semanas finais para garantir ao menos um reconhecimento simbólico da cultura na COP30 e lançar as bases para um reconhecimento efetivamente transformador da ação climática baseada na cultura na COP31 — e além.

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2025 (COP30) ocorrerá em Belém, Brasil, de 10 a 22 de novembro. Este artigo é o primeiro de uma série que explora as conexões entre o ativismo cultural e climático e as decisões políticas que deverão ser tomadas na COP por ministros e negociadores nacionais. Os próximos artigos examinarão os pontos de entrada da cultura e do patrimônio nas negociações da COP30 sobre adaptação, perdas e danos e mitigação.