Sâmia Bomfim: Hospital Universitário da USP sob ameaça
Na última terça-feira (21), o pronto-socorro da pediatria foi fechado e, no dia seguinte, devido a falta de médicos, foi anunciado que o pronto-socorro para adultos também será fechado.
Marco Antonio Zago assumiu, em 2014, a reitoria da Universidade de São Paulo após seu antecessor, João Grandino Rodas, enfrentar uma forte greve estudantil com ocupação do prédio da reitoria por mais de 40 dias.
Naquele momento, a reivindicação consistia em “Diretas para reitor” e mais “democracia na universidade”. Ainda assim, como sempre acontece na USP, Zago foi escolhido para ocupar o cargo de reitor pelo governo do estado São Paulo, que há mais de 20 anos está sob controle do PSDB.
Não demorou muito para que Zago mostrasse a que veio. O início de sua gestão é marcado pelo discurso enfático sobre uma crise no orçamento da Universidade. Assim, contrariando a opinião da comunidade acadêmica, anunciou o congelamento das contratações de funcionários aliado a um Plano de Incentivo à Demissão Voluntária – o que, na prática, levou à pedidos de demissão em massa, sobrecarga e precarização das condições de trabalho para os servidores que permaneceram.
Outra providência frente à “crise” foi a ameaça de desvinculação do Hospital Universitário, um modelo transformador de hospital-escola que existe há anos na USP, conciliando o ensino dos estudantes – por meio de estágios, residências e outros projetos – com o atendimento de qualidade em diversas áreas de atuação de profissionais da saúde.
Acabar com o vínculo que o Hospital Universitário (HU) tem com a Universidade significa também comprometer esse modelo, inviabilizando tanto o ensino dos estudantes da saúde, como também a qualidade do atendimento, levando em conta que esse é um dos poucos hospitais públicos da Zona Oeste de São Paulo, sendo assim, supre a demanda de milhares de munícipes da região.
Na época, eu era diretora de base do Sindicato de Trabalhadores da USP (SINTUSP) pela Escola Politécnica, e tive o prazer de participar da maior greve que a universidade já teve: foram mais de 100 dias que renderam uma série de vitórias, dentre elas, o impedimento do projeto de desvinculação do Hospital à Universidade.
Infelizmente, Zago seguiu com sua intransigência na gestão da universidade: reduziu a prioridade de gastos com o hospital, sendo que cerca de 12% do quadro efetivo de profissionais se perdeu.
O HU, talvez, viva hoje o momento mais difícil de sua existência. Na última terça-feira (21), o pronto-socorro da pediatria foi fechado e, no dia seguinte, devido a falta de médicos, foi anunciado que o pronto-socorro para adultos também será fechado. Diante desse cenário, estudantes de cursos da saúde entraram em greve e moradores do Butantã, no entorno da universidade, têm se organizado em mutirões no sentido de mobilizar a população para reverter essas medidas.
Nosso mandato vê com preocupação essa situação. A demanda por aparelhos de saúde na região é alta, e muitos deles possuem gestão terceirizada para a iniciativa privada, principalmente os serviços de baixa e média complexidade. Com a municipalização do hospital, a rede municipal terá um hospital a mais para manter, sendo que o orçamento de São Paulo para a saúde em 2018 será ainda menor que do último ano. Ou seja, teremos um bolo menor para repartir em mais fatias.
Estamos do lado da luta dos moradores e estudantes para reverter essa situação, afinal, assim como demonstrou a greve de 2014, apenas a organização coletiva é capaz de mudar a realidade.