“Quero ser referência para uma nova geração de jovens estudantes e atletas bem-sucedidos”, diz Jorge de Sá
Na coluna de hoje, ele fala sobre os planos para carreira de ator, as dificuldades que empreendedores pretos têm em tocar seus negócios em um país intrinsecamente racista e a relação com a mãe
Ator, empreendedor, atleta, filho de uma das vozes mais icônicas da música preta brasileira, Jorge de Sá está abrindo caminhos para jovens atletas que sonham em estudar fora e ter uma carreira profissional no exterior. Ex-jogador de basquete, já jogou na base do Flamengo e nos Estados Unidos, inclusive contra LeBron James. Apoiado em sua própria experiência e com um investimento inicial de R$ 900, fundou, em 2018, o Departamento de Conexões Esportivas Internacionais (DCEI), uma assessoria acadêmica esportiva que facilita o acesso de jovens a bolsas de estudos internacionais para estudar e jogar modalidades como basquete, futebol de campo, vôlei, tênis, atletismo, natação, dança, entre outros.
Na coluna de hoje, ele fala sobre os planos para carreira de ator, já que agora a sua empresa está bem estruturada, as dificuldades que empreendedores pretos têm em tocar seus negócios em um país intrinsecamente racista e a relação com a mãe e a gestão de sua carreira.
Leiam com toda a calma do mundo. Salve, Jorge! Pega aí a visão dele:
Como é ser um empreendedor negro no Brasil? Você encontrou quais tipos de desafios durante o caminho?
Jorge de Sá – Ser um empreendedor em um país racista é muito difícil, e essa é a realidade do Brasil. Na verdade, para o preto viver aqui ainda é uma dificuldade, não temos como normalizar isso. As pessoas estão em um nível de preconceito e racismo que ultrapassa qualquer coisa. É assustador. Os preconceitos que eu sofro são visuais, da aparência, de pensarem “é esse cara que vai levar meus filhos para fora do país?”. Ninguém fala, mas pensa. O meu sócio também é preto e, quando buscam informações sobre ele, perguntam onde mora, o que faz. É horrível isso. É um desafio essa desconfiança dos pais, principalmente, de classes mais altas. Não posso generalizar, sou muito grato: tenho 900 famílias que acreditaram no meu trabalho. Mas, infelizmente, preciso dizer que mais da metade olha com repulsa.
Qual a sua relação com o basquete e como o esporte pode mudar a vida de jovens negros periféricos?
Jorge de Sá – Relação de vida. Devo tudo ao basquete e agradeço ao esporte por tudo o que fiz na minha vida. Graças ao esforço da minha mãe e avó consegui ser jogador e me realizei, ganhei amigos, maturidade, honestidade, força e motivação. Joguei nas categorias de base do Flamengo e também nos Estados Unidos, fui comentarista no SporTV e hoje trabalho com influência em todos os esportes, mas tenho um público maior no basquete, que é o que gosto de jogar. Creio que o esporte é educação. Não vou dizer que trabalho com esporte e educação e, sim, que atuo com esporte, que automaticamente é educação. Além disso, une e quebra barreiras. O basquete pode mudar a vida de jovens da periferia, como já vem fazendo.
O basquete de rua vem sendo multiplicado pelas comunidades, porque é um esporte que pode ser jogado com menos gente e só precisa de meia quadra. Os jovens estão enxergando esperança no esporte com os campeonatos de basquete de rua, que também tem transformado a cultura e o comportamento deles. Os garotos passam a olhar para as drogas e recusam, pensando no treino no dia seguinte. Olham para a bandidagem, com armas, dinheiro e ostentação e recusam, porque o basquete permite que ‘tire onda’ da forma correta. Então, é um esporte que pode ajudar muito as periferias. Inclusive, através dele, estou conseguindo levar os alunos para estudar fora do país. Talvez, se não fosse o basquete, eu não conseguiria.
Você pretende voltar a atuar? Por que ficou tanto tempo fora das telonas?
Jorge de Sá – Com certeza! Amo atuar e estou preparado para conduzir projetos nesse sentido. Quando tive a oportunidade de comentar basquete no SporTV e voltei a ter uma rotina imersa nos esportes, identifiquei que sentia falta e entendi que precisava focar nesse lado da minha vida. Foi aí que decidi fundar o Departamento de Conexões Esportivas Internacionais (DCEI). Agora que a empresa já está estabelecida, e depende menos de eu estar 100% concentrado nisso, tenho o desejo de investir novamente na minha carreira artística.
Como é a relação com a sua mãe, Sandra de Sá, uma das maiores ícones da música negra brasileira?
Jorge de Sá – Relação maravilhosa. Sou sócio, empresário e admirador dela. Temos amor e respeito demais. A gente brinca, se diverte e não briga. Buscamos encontrar solução para tudo. Sou muito grato pela criação que ela me deu. Ela nunca foi uma mãe ausente. Sempre tive dentro de mim que a minha mãe estava trabalhando e batalhando por nós. A nossa relação é 200%. Falam que o Instagram mostra uma relação falsa, mas vivo com a minha mãe aquilo que postamos, diversão e felicidade.
Qual legado você quer deixar?
Jorge de Sá – Daqui há alguns anos, um preto, da favela, pegar uma medalha de ouro e falar: “Pensei em desistir, mas vi um vídeo do Jorge de Sá que me motivou, e eu passei a buscar informações, oportunidades e, graças a Deus, deu muito certo”. O legado que eu quero deixar é de poder, lá na frente, ver que fiz parte da construção de uma nova geração de jovens estudantes e atletas bem-sucedidos, não apenas no esporte, mas na educação, na vida profissional, como médicos e advogados, por exemplo. Eu trabalho visando inspirar pessoas.