Presidente Lula, convoque seus hackers: é hora de agir
Precisamos de uma volta às origens. Às nossas origens.
Hoje faz dois anos que um bando de celerados invadiu o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal para tentar impedir o início do terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Os golpistas que se articularam em rede, por meio do uso de plataformas proprietárias de redes sociais, eram buchas de canhão de um golpe de estado que estava sendo articulado nos bastidores pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e alguns covardes generais. Há alguns anos, e mais intensamente depois dos tristes episódios de destruição que vimos em 2023, as instituições democráticas brasileiras têm agido para impedir o avanço da infâmia, condenando os criminosos que atentam contra a nossa frágil democracia. A mão pesada da lei age, mas isso ainda é pouco, porque o golpismo segue se multiplicando na sociedade, por meio de articulações virtuais e atuais.
Ontem, num movimento que antecipa a posse de Trump como presidente e de Elon Musk como CEO dos Estados Unidos, Mark Zuckerberg anunciou mudanças nas políticas de moderação das plataformas Facebook, Instagram e Whatsapp, geridas pela Meta, sua corporação global. Segundo ele, essa atitude configura-se como uma volta às origens dos sites de redes sociais, que teriam surgido para “dar voz” às pessoas. Na prática, o empresário decidiu remover uma série de mecanismos de filtragem desenvolvidos nos últimos anos por força da pressão social democrática para impedir a propagação de mentiras. Mas não foi só isso. Ele também anunciou que irá reduzir o controle dos conteúdos políticos em suas plataformas e que irá agir alinhado à política externa do novo presidente americano, em busca de enfrentar o que chamou de “censura”.
Zuckerberg citou três territórios que quer enfrentar e apresentou suas razões para isso. Segundo ele, a Europa possui leis restritivas, que drenam a inovação; a China impede, dentro de suas fronteiras, a presença de suas empresas; e a América Latina é uma região onde a remoção de conteúdos ocorre na surdina através da atuação de tribunais secretos, numa alusão ao STF brasileiro. O movimento da Meta é geopolítico, baseado nessas falsas premissas apresentadas pelo seu CEO, e precisa ser respondido à altura. O que ocorre no Brasil não é secreto. Muito pelo contrário. É a aplicação de medidas baseadas em leis criadas para proteger nossa sociedade. Mais que nunca, fica evidente que a convivência pacífica com corporações cuja missão é a propagação de valores da extrema direita (portanto do fascismo) não é possível. Sim, enfrentar o poder político e econômico dessas plataformas golpistas não é um desafio simples, ainda mais por conta do uso intensivo de redes sociais feito no Brasil. Mas é a hora de fazer isso.
Como? Também precisamos de uma volta às origens. Às nossas origens. No início do primeiro governo de Lula, o Brasil se destacou por promover um discurso crítico e inovador sobre a internet, baseado em reconhecimento do potencial democratizante da rede mundial de computadores. A aliança criativa entre hackers e gestores públicos produziu uma visão de mundo que tinha como premissa a nossa soberania digital e a aposta no investimento público em robustas infraestruturas cidadãs. A falta de apoio estratégico para essa visão, somada aos movimentos globais de concentração de capital, impediu que pudéssemos ter, atualmente, um outro arranjo que não fosse tão dependente desses monstros corporativos que não respeitam leis democráticas. Mas a política é assim, dá suas voltas, e a declaração de guerra de Zuckerberg convoca o presidente Lula a dar uma resposta à altura.
O episódio da Praça dos Três Poderes, de dois anos atrás, está conectado com a declaração de Zuckerberg. São movimentos correlacionados articulados por uma onda global autoritária que, se não for combatida, resultará na destruição da nossa humanidade.
Por isso, presidente, chame pra perto os hackers e realize um grande encontro, o quanto antes, para pensar uma política soberana, do Brasil para o mundo. Temos inteligência acumulada neste país para fazer algo urgente, que resulte em um conjunto de ações cujo objetivo será promover a nossa independência digital. Neste cenário absurdo, presidente, políticas estratégicas seguem sendo articuladas por meio de grupos de Whatsapp. Provavelmente, seus ministros estão discutindo a declaração de guerra da Meta por meio de canais corporativos. Precisamos mudar isso. Lembre-se de sua luta pela liberdade de Assange. Do que nos ensinou Snowden, anos atrás. O senhor tem legitimidade para liderar esse processo e irradiar para o mundo uma resposta: não aceitamos que meninos mimados do Vale do Silício governem o planeta de forma antidemocrática.