
Pacote de leilão não é política pública
Patrimônio do povo não pode ser liquidado para alimentar a especulação imobiliária
O leilão de quase 50 imóveis anunciado pelo governo do Rio é mais do que um erro: é um ataque ao direito da população de decidir o futuro de seu próprio estado. Não se trata apenas de “fazer caixa” , já que o total arrecadado dificilmente vai ter impacto significativo no Orçamento, mas de entregar, de bandeja, pedaços do Rio de Janeiro para a lógica predatória da especulação imobiliária. Essa pressa em vender o que é público mostra desespero fiscal, mas sobretudo falta de compromisso com as pessoas em situação de vulnerabilidade social.
Imóveis públicos não são mercadoria e não devem servir para a lógica de produção de capital privado. São espaços com histórias, memórias e potencial de servir à coletividade. Reduzi-los a cifras em uma planilha é negar o papel estratégico que podem ter para a promoção da saúde urbana e de uma cidade inclusiva. Em vez de virar objeto de negociação do Estado, esses imóveis deveriam ser transformados em moradias populares, habitações de interesse social, creches, centros culturais, incubadoras de economia comunitária, estruturas que respondam a necessidades concretas da população.
Também é hora de aplicar, de fato, o direito ambiental nas cidades. Vender cada centímetro quadrado é intensificar a crise climática urbana: mais prédios, mais asfalto, menos verde; e pior, menos gerência do Estado no território. Por que não transformar parte desses terrenos em parques urbanos e áreas de proteção ambiental, que ajudem a mitigar enchentes, reduzir ilhas de calor e criar respiros ecológicos em uma cidade sufocada por concreto e cimento?
Espaço público é vida, saúde, resiliência — não pode ser liquidado no balcão da privatização!
Há ainda um aspecto social gravíssimo: muitos desses imóveis abrigam organizações populares e de direitos humanos, como a FAFERJ e o Grupo Arco-Íris, que há décadas são trincheiras de cidadania, diversidade e democracia. Leiloar esses espaços seria calar vozes históricas das favelas e da comunidade LGBTQIPNA+ e negar serviços básicos de acolhimento que muitas dessas organizações prestam. Outros imóveis são ocupados por famílias, exemplificando o grave e crescente déficit habitacional do nosso estado.
Não é “gestão do patrimônio”: é desmonte da participação popular!
O Rio precisa de planejamento, cuidado e compromisso com a maioria. Leiloar imóveis sem função social clara é fácil; difícil é garantir que cada espaço público seja instrumento de justiça, de democracia e de vida digna. É essa escolha que deveria guiar a política, e não o lucro de poucos às custas do direito de todos.