O ódio não nos pertence
Ainda espero ter a oportunidade de, cara a cara, respondê-la contando sobre o lamento de milhares de famílias mineiras.
Recebi por WhatsApp o vídeo da “Moça das Alterosas”, feito após denúncias envolvendo sua família serem publicadas numa revista que não vale a pena citar o nome. No vídeo, ela expressa lamento e choro pelo o que considerava “injustiça a que sua família está vivendo”.
Ainda espero ter a oportunidade de, cara a cara, respondê-la contando sobre o lamento de milhares de famílias mineiras que tiveram por quatro meses seguidos o salário que os sustentava cortado por terem ousado fazer uma greve pelo Piso Salarial e que, até hoje, não se recuperaram financeiramente; faltou o pão em suas mesas e a situação não piorou porque contaram com a solidariedade de amigos e familiares. Isso aconteceu em 2011 em nossa histórica greve de 112 dias!
Quero contar a ela a injustiça de vermos nossa luta silenciada nos meios de comunicação de Minas Gerais, que não falavam nada. Vergonhosamente, esconderam da população mineira escolas estaduais funcionando em postos de gasolina ou em motéis desativados.
Éramos 15 mil pessoas nas ruas e, no dia seguinte, o silêncio combinado como se não existíssemos!
Quero contar a ela, como os alunos que trabalhavam foram proibidos de estudarem à noite, em 2014, e como se sentiram ao abandonarem a escola por incentivo do próprio governo de Minas, que os recusou em suas salas de aula. Quero falar dos milhares de jovens que não encontraram vagas no ensino médio.
E por falar em família, quero partilhar com ela como, até hoje, é difícil explicar à minha, porque respondo a tantos processos por simplesmente falar a verdade sobre a escola pública mineira; quero confessar a ela como engoli o choro para consolar a todos que prestavam serviço para o Sindicato e começaram a ser ameaçados em suas casas em 2014; dizer a ela qual foi meu sentimento quando eu soube que milhares de panfletos com meu nome e foto (mas sem assinatura) foram espalhados pelos quatro cantos do estado sem que eu tivesse sequer o direito de defesa ou de resposta.
Gostaria de dizer a ela, como é ser perseguida por um escritório de advogados em que até direito de resposta em artigos de opinião que eu escrevia pediam; também queria contar como centenas de professores e professoras se sentiram ao serem processados sem terem cometido crime algum e até mesmo com provas falsas porque era preciso punir quem se organizava, não importava por quais meios; quantos diretores de escola escolhidos pela comunidade escolar foram impedidos de serem nomeados por pura perseguição.
Posso também contar como era termos nossas bolsas revistadas na entrada da Assembleia Legislativa de Minas Gerais pelo simples fato de sermos professoras, Auxiliares de Serviço ou pedagogas; quero lhe descrever a sensação de respirar gás de pimenta e apanhar da polícia por lutar por uma escola pública de qualidade; como é ficar 5h30 numa rodovia debaixo de sol, a maioria mulheres e idosas, no desespero de sermos ouvidas e termos algum diálogo que melhorasse alguma coisa na escola pública!
As lágrimas de verdade são aquelas derramadas diante da fome e do desemprego, que voltaram a bater à porta de milhares de brasileiros.
Tudo começou quando um moço embirrou e não aceitou a derrota lá em outubro de 2014!
Alguma dúvida sobre quem acordou o ódio em nosso país? A quem ele pertence? Eu posso explicar também! E sem chorar!