O desafio de “fazer história” sem ter financiamento
A levantadora de peso Jaqueline Ferreira é uma das atletas que precisa conciliar o esporte com outro outros empregos por falta de financiamento
Por Renata Medeiros
Vivenciando a 32° Edição dos Jogos Olímpicos, em Tóquio, é possível identificar a desvantagem enfrentada por parte dos competidores brasileiros. São mais de 300 atletas representando a nação, e desse grupo, apenas praticamente a metade deles tem patrocínio. Foram 35 modalidades para as quais o Brasil se classificou. De esportes populares como o Vôlei e Futebol aos com menos popularidade no país, como Badminton, Rugby Sevens e Tiro Livre.
O percurso até as competições não é simples. Atletas estão enfrentando os desafios da escolha em praticar o esporte profissionalmente, desde o instante em que iniciam os treinamentos. Representando o Brasil, na Olimpíada que aconteceria em 2020, mas devido a pandemia foi adiada e segue sendo realizada no Japão até o dia 08 de agosto, os competidores brasileiros encaram a realidade de participar do evento sem patrocínio. A segunda maior delegação em 101 anos, é composta por mais de 130 atletas que não desfrutam de algum financiamento.
Representar o país, sendo observado por todo o mundo, é o que os competidores olímpicos fazem. Apesar dos incontáveis obstáculos, eles colocam em prática aquilo que esteve ao seu alcance para ser desenvolvido, visto que, segundo a pesquisa publicada no portal da Globo Esporte, 33 atletas brasileiros não têm o esporte como único trabalho. A halterofilista Jaqueline Ferreira está entre eles. Praticando o esporte há 18 anos, a carioca de Duque de Caxias já conquistou diversos títulos, como campeã sul-americana e pan-americana da categoria Levantamento de Peso, além de alcançar o 6° lugar no mundial, em 2019. Essa foi a melhor colocação de uma brasileira em campeonato mundial adulto.
Assim como diversos colegas do esporte, Jaqueline Ferreira também se viu aflita no período pré-Olimpíada, coincidindo com a pandemia da covid-19. Na incerteza da realização da competição, a atleta deu início ao seu negócio, como precaução, caso viesse a perder os seus patrocinadores e investimentos. Afim de garantir o seu suporte financeiro, ainda que obtenha parcerias com empresas e seja beneficiária do Bolsa Pódio, não foi possível para a competidora se dedicar exclusivamente ao esporte, como gostaria:
“Quando a gente consegue viver só para aquilo (o esporte), o resultado é muito melhor! Você consegue render mais, com certeza”, afirmou Jaqueline.
Ela comentava sobre como o rendimento seria melhor caso houvesse um auxílio suficiente, que lhe garantisse a estabilidade. Conciliar a rotina de treinos com a busca por renda mensal e por vezes o estudo, além de se tratar da realidade de diversos brasileiros, também é a fase básica por qual parte dos iniciantes no ambiente profissional do esporte, são submetidos à passarem.
Contando com os projetos sociais que incentivam as práticas esportivas no Brasil, os patrocínios individuais e coletivos, além do Bolsa Atleta, criado em 2006 – beneficiando atletas de alto rendimento e que se destacam em sua modalidade, obtendo grandes resultados em competições nacionais e internacionais -, o país dispõe também do Programa Atletas de Alto Rendimento (PAAR) das Forças Armadas. Nesse programa, são selecionados e incorporados atletas de alto rendimento como militares temporários das Forças Armadas. Apesar dessas frentes esportivas, o desenvolvimento nacional com a prática de esportes não se mostra suficiente para os competidores.
Ao analisar o quadro de medalhas das Olimpíadas 2012 a 2020, especificamente quando se observa o TOP 3, países como a China e os Estados Unidos seguem se destacando com o número de vitórias. Apesar do Brasil estar entre as nações sul-americanas que mais apostam recursos no setor, o investimento não reflete no desenvolvimento dos atletas e em pilares como estrutura, organização, governança, instalações de treinamento, suporte para atletas e pós-carreira. É o que se analisa no estudo “Successful Elite Sport Policies”, realizado pelo consórcio Sport Policies Leading to International Sporting Success (SPLISS) – Políticas Esportivas que Levam ao Sucesso Esportivo Internacional -, em 2017.
Comprovando a veracidade do estudo, a halterofilista Jaqueline Ferreira comenta sobre as condições nas quais o Levantamento de Peso se encontra: “Realmente, o investimento em estrutura na base é muito precário. A gente tá com déficit tremendo de atletas… Tem pouco Centro de Treinamento… São pouquíssimos, se não me engano, são cinco ou seis oficiais. Isso é para o Brasil inteiro, é muito pouco!”, lamenta a atual campeã brasileira do Levantamento de Peso – já são mais de 10 edições vencidas. Fazem parte da confederação as seis federações estaduais: Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo.
Pensando no futuro da sua modalidade, Jaqueline se prepara para desenvolver um novo propósito. Ainda na busca por parceiros, a carioca pretende dar início a um projeto social. Ao notar a falta de serviços esportivos que atendam a comunidade que abriga a sua família, o seu desejo agora, é também ser suporte para as crianças: “Eu estou nesse objetivo aí, de quando não puder contribuir como atleta, contribuir como treinadora, formando novos atletas, formando novos talentos”, planeja Jaqueline. Na Olímpiada de Tóquio 2020, sua classificação foi 12° na disputa da modalidade que pratica.
Estar na espera por medalhas de pessoas que não são estimuladas, assistidos e a é um grande ato de esperança ou desconhecimento da realidade. A situação do Quadro de Medalhas do Brasil, quando comparada à de grandes nações investidoras, que encorajam e possibilitam a prática esportiva de maneira adequada e digna, é de reavaliar o modo, as ferramentas, a condição de vida do atleta profissional brasileiro e daqueles que estão descobrindo suas carreiras esportivas, os jovens atletas.
Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube