Por Chris Zelglia, para a Cobertura Colaborativa NINJA COP30

A história do herói sempre atraiu a atenção das mídias: existem pessoas que se apresentam para transformar o mundo. 

Na atualidade em relação ao clima, essa ilusão ganhou uma coloração ecológica. Influenciadores, diretores executivos e personalidades famosas se colocam como redentores e recebem reconhecimento, prêmios e acordos comerciais. 

Entretanto, sob o gesto de aparente altruísmo, existe um sistema econômico: visibilidade, reputação e, frequentemente, ganhos financeiros. O ato generoso se torna um espetáculo; o cuidado se transforma em algo a ser listado em currículos.

Enquanto alguns dramatizam a sua salvação em cenários brilhantes, a lógica que causa a destruição continua inalterada e a carga da devastação recai sobre comunidades invisíveis.

Sob um olhar psicanalítico, essa encenação possui um aspecto clínico. O ego anseia por ser percebido como virtuoso, competente e reconhecido e as questões climáticas proporcionam um palco ideal. O que se mascara como altruísmo muitas vezes esconde um anseio por reconhecimento, por redenção pública, um prazer que gera emissões de carbono.

A indagação que deve surgir é direta: salvar para que fim? E quem se beneficia dessa salvação em massa?

Heróis do clima frequentemente fazem uma moralização performática: projetam a imagem da salvação enquanto mantêm intactas as estruturas que produzem a destruição.

O espetáculo da salvação estabelece uma barreira semântica: as falas sobre liderança climática amortecem a crítica às estruturas. Ao celebrar feitos individuais grandiosos, encobrimos que a verdadeira responsabilidade exige transformações institucionais e econômicas e não apenas narrativas heróicas.

A psicanálise oferece compreensão para essa dinâmica: o indivíduo busca reparação simbólica para seu senso de culpa por meio da visibilidade. Ser o salvador, proporciona alívio de uma ansiedade existencial sem modificar hábitos ou relações de poder que sustentam a crise. O ego é recompensado; o sistema, não.

Além disso, a linguagem heróica torna naturais as hierarquias: quem salva detém autoridade; quem é salvo se torna mero cenário. Isso reproduz lógicas coloniais. A narrativa do herói muitas vezes silencia as vozes indígenas, comunitárias e populares que já cuidam da terra há gerações e transforma sus luta em um espetáculo exótico.

Desmantelar o mito do herói climático é crucial. Precisamos mudar o foco da figura individual para as estruturas: legislações, compromissos corporativos obrigatórios, participação comunitária em decisões e reparação material.

Valorizar lideranças coletivas, práticas locais de cuidado e conhecimentos tradicionais é mais eficaz do que exaltar indivíduos em palcos globais.

A verdadeira ética climática demanda humildade: menos palcos, mais redistribuição de poder. Menos foco no ego, mais responsabilidade.