Não é de hoje que vemos na grande mídia casos de pessoas brancas que tentam burlar o sistema de cotas no Brasil para ingressar em cursos superiores com vagas destinadas a pessoas negras. O mais recente caso, do ex-BBB Matteus Amaral, acende alguns sinais de alerta. O estudante ingressou em 2014 no curso de bacharelado em Engenharia Agrícola ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha (IFFar) em parceria com a Universidade Federal do Pampa (Unipampa). Sua candidatura foi feita na parte de vagas destinadas a pessoas pretas/pardas, ou seja, pela Lei de Cotas. Vale lembrar que naquela época, a Lei de Cotas já mostrava algumas fragilidades que precisavam ser revistas, pois o único documento necessário era a autodeclaração, não havendo outros mecanismos para comprovar a raça do candidato.

Dito isso, é preciso ir um pouco mais além: se autodeclarar uma pessoa preta/parda sendo uma pessoa branca para ingressar em uma vaga destinada à comunidade negra é extremamente antiético. Como volta e meia eu costumo retomar aqui na coluna o beabá da estrutura racista em que estamos inseridos, dessa vez não será diferente. Vamos lá: o principal objetivo da Lei de Cotas é reduzir as desigualdades históricas de acesso ao ensino superior no Brasil. E isso engloba grupos de pessoas pretas, pardas, quilombolas e indígenas, sendo a sua maioria de baixa renda.

As cotas são uma política pública que visa reduzir as desigualdades sociais no país, permitindo que esses grupos tenham acesso a empregos bem remunerados e uma vida mais digna que seus antepassados, que não tiveram a chance de estudar. É inadmissível que situações como essa continuem acontecendo. Os mesmos que criticam as cotas querem usufruir de uma política pública tão necessária para o desenvolvimento do país. Como se não bastassem as mazelas diárias, ainda querem hackear ainda mais o povo negro. Não podemos mais admitir que este tipo de coisa aconteça e as universidades precisam melhorar seus mecanismos de identificação.

A autodeclaração racial, sem um controle rigoroso, abre margem para fraudes que comprometem o propósito das cotas. A fragilidade do sistema, que aceita apenas a autodeclaração, permite que pessoas brancas, em busca de vantagens, ocupem vagas que deveriam ser destinadas a pessoas negras, indígenas ou quilombolas. Este problema não é apenas uma questão legal, mas também moral e ética.

Universidades e instituições precisam urgentemente implementar mecanismos mais rigorosos de verificação da autodeclaração racial. Comissões de verificação, análise de histórico familiar e até mesmo critérios fenotípicos podem ser algumas das medidas adotadas para assegurar que as cotas cumpram seu papel de inclusão e justiça social.

A sociedade brasileira precisa entender que as cotas são uma reparação histórica necessária para corrigir as desigualdades raciais que persistem até hoje. Fraudar este sistema é perpetuar o ciclo de injustiça e desigualdade que já castigou gerações de pessoas negras. É preciso garantir que políticas públicas como as cotas continuem a beneficiar quem realmente precisa, contribuindo para um Brasil mais justo e igualitário.