Frame running, a modalidade paralímpica em ascensão para Paris 2024
Confira entrevista com Ivaldo Brandão, um dos responsáveis por implantar a petra no Brasil
Por Paula Veiga
O frame running, até recentemente chamado internacionalmente de race running, pode ser uma das novas modalidades presentes nos Jogos Paralímpicos de Paris 2024. Este esporte é praticado no Brasil desde 2009, por iniciativa da Associação Nacional de Desporto para Deficientes (Ande), entidade que coordena o frame running nacionalmente. Criado na Dinamarca, este esporte é mais uma opção para atletas com paralisia cerebral, que correm com os próprios pés apoiados em um suporte.
O professor Ivaldo Brandão foi vice-presidente do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) por oito anos e também foi responsável por inserir outra modalidade para paralisados cerebrais no Brasil — a bocha. Ele acredita ser uma conquista na própria carreira ter ampliado as oportunidades de inclusão esportiva para pessoas com deficiência severa. Segundo Brandão, essa inclusão esportiva já existia no Brasil de uma forma geral, mas com pouco empenho em fomentar, com a preferência de investir em atletas multimedalhistas. Agora, o frame running pode ser uma nova oportunidade para paralisados cerebrais atuarem na maior competição paralímpica do mundo.
“As chances são muito grandes, pois já há negociações para que ela seja inserida no próximo campeonato mundial de atletismo, como foi feito no último ocorrido em Dubai 2019. Temos no Brasil uma boa base de desenvolvimento que será um ótimo laboratório de busca de talentos motores para esta modalidade”, assegura Brandão.
O esporte também é carinhosamente apelidado de petra, uma homenagem ao mascote das Paralimpíadas de Barcelona de 1992, que demonstrou uma performance incrível na modalidade. Apesar da semelhança, o equipamento não é uma bicicleta. Ele conta com suporte para o tronco, assento, guidão e três rodas. Os atletas não usam pedal, mas sim os próprios pés para correr ou caminhar.
A história do frame running
Brandão explica que a origem e a invenção da petra se deve a persistência do atleta dinamarquês Manssoor Siddiqi. Diagnosticado com paralisia cerebral, Manssoor competiu em Campeonatos Mundiais e Jogos Paralímpicos em provas de atletismo, nos eventos de 100m, 200m e 400m rasos nas antigas classes T31 e T32 da CPISRA (Cerebral Palsy International Sport Recreation and Association).
Nas palavras do professor, desde o começo o frame running foi pensado com objetivo de ser praticado por pessoas com paralisia cerebral severa ou moderada. Hoje, de acordo com Brandão, a utilização da modalidade ultrapassa todos os obstáculos e também é recomendada para aqueles com distrofia muscular, Parkinson e outras deficiências que afetam a mobilidade e o equilíbrio. O equipamento pode ser usado por crianças desde os três anos até a idade adulta.
“Para Mansour, o que mais lhe causava insatisfação era a desigualdade de participação dos atletas de sua classe. Agrupados conforme com sua classificação funcional, alguns atletas em sua minoria apresentavam somente um pé funcional devido à complexidade da sequela da paralisia cerebral, os obrigando a chegar na linha de chegada com as costas da cadeira, enquanto a maioria cruzava o final da linha de chegada utilizando a frente da cadeira”, detalha o professor.
O primeiro contato da modalidade com a região das Américas foi durante um workshop em 1998, na Assembleia Geral da CPISRA, realizada na cidade de Rosário, Argentina. Lá, o Brasil era representado pelo na época diretor técnico da Ande, professor Ivaldo Brandão Vieira, que recebeu as primeiras informações para a implantação da modalidade no escopo de esportes adaptados em desenvolvimentos pela entidade.
“No Brasil, durante os anos 2000, foram iniciados pela Ande projetos buscando novidades que pudessem proporcionar melhoria da qualidade de vida dos paralisados cerebrais. O Departamento Técnico da entidade comandado por mim apresentou os primeiros esboços para a construção do protótipo de um equipamento petra com DNA brasileiro, que foi logo apelidado de tricicleta”, narra Brandão.
O professor de educação física afirma que os ganhos com a prática da petra são imensuráveis. Ele explica que no aspecto social a utilização, seja em corridas ou em passeios, é uma maneira eficiente de melhorar o condicionamento físico geral, o tônus muscular e a força, bem como beneficiar o sistema nervoso e todos os sistemas metabólicos.
“A petra reforça nosso empenho de buscar novas alternativas para que as pessoas com deficiência severa, principalmente àquelas com paralisia cerebral possam ter oportunidades de mostrar toda sua competitividade com a capacidade motora residual que a sua sequela permite realizar”, completou Brandão.
O que significam as classificações funcionais
De acordo com a CPISRA, entidade internacional responsável pela petra, para competir na modalidade os atletas devem ter resultado em uma das seguintes deficiências: Hipertonia, Discinesia ou Ataxia. As classificações funcionais servem para tornar a competição equilibrada entre os atletas. Segundo a Ande, após Tóquio as classes serão divididas entre T71 e T72 da seguinte forma:
T71: Os atletas desta classe têm grande dificuldade com o controle e a coordenação do tronco e membros inferiores na produção de movimentos funcionais para corrida adaptativa, o que limita severamente a capacidade de acelerar e alcançar uma propulsão eficiente. Eles têm controle de passada pobre e são mais propensos a apresentar arrastamento do pé, levantamento deficiente do joelho e passadas severamente encurtadas, assimetria e/ou nenhum movimento alternativo da perna (isto é, mover ambas as pernas juntas ou usando uma perna). Muitos terão dificuldade ou não serão capazes de se transferir para o quadro de forma independente e manobrar o quadro até a linha de partida.
T72: Durante a corrida ergométrica, a maioria dos atletas desta classe produz movimentos recíprocos das pernas. Alguns atletas nesta classe mudam de um padrão de corrida para outro após a fase inicial. Os atletas têm equilíbrio central de razoável a bom e são capazes de acelerar com eficácia. Os atletas podem apresentar passadas encurtadas ao longo da corrida, mas alcançam uma propulsão eficaz. O arrasto do pé é improvável.
Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube