Especial Brazil Conference: Um papo com Laura Eduarda Mallmann Kieling, do projeto Amigos Inclusivos

Idealizadora promove inclusão com bonecos personalizados; projeto envolve escolas, impressões 3D e voluntários.

Nos dias 12 e 13 de abril, acontece a Brazil Conference, um evento promovido por estudantes brasileiros em Boston para atrair o olhar do mundo para o Brasil e impulsionar a economia e o desenvolvimento do país. Para conhecer melhor os embaixadores da edição deste ano, a coluna irá conversar com todos eles até o início do evento para promover diálogo com os brasileiros que irão fomentar inovação em Harvard e MIT.

No papo de hoje, vamos conhecer melhor a trajetória da gaúcha Laura Eduarda Mallmann Kieling, fundadora do projeto Amigos Inclusivos, uma iniciativa que promove a inclusão social por meio da representatividade dos bonecos. “Adaptamos bonecos para crianças com deficiência, personalizando suas características físicas ou estéticas para que se sintam valorizadas e reconhecidas”, conta.

Apesar da causa nobre, Laura sabe que, financeiramente, não é fácil manter um projeto desafiador como este de pé, mas ela vem desenvolvendo estratégias para que ele possa continuar existindo. “Embora essa questão ainda não tenha sido totalmente superada, estou desenvolvendo uma estratégia de apadrinhamento, na qual empresas ou benfeitores podem financiar a produção do boneco de uma criança, cobrindo os custos envolvidos e garantindo que mais crianças sejam beneficiadas”, ressalta.

Com vocês, Laura Eduarda Mallmann Kieling:

1.⁠ ⁠O que motivou você a iniciar seu trabalho no terceiro setor e como foi o começo da sua jornada nessa área?

Aos 9 anos, fui diagnosticada com a Doença de Wilson, uma condição rara cujo diagnóstico é bastante desafiador e deveria ser mais amplamente discutido no Brasil. Durante esse processo, passei por diversas internações e tive contato com pessoas — especialmente crianças — em diferentes situações de vulnerabilidade. Essa vivência despertou em mim, desde a infância, um forte senso de empatia.

Além disso, muitas pessoas com Doença de Wilson acabam desenvolvendo deficiências caso o diagnóstico seja tardio ou o tratamento adequado — que é extremamente caro — não seja acessível. Essa realidade me motivou a atuar no terceiro setor, especialmente na causa da inclusão social de pessoas com deficiência ou condições que exijam mais acessibilidade.

Com o tempo, percebi que, ao buscar mudanças, nos deparamos com inúmeros outros problemas sociais que precisam ser enfrentados. Foi isso que me levou a cursar Políticas Públicas na UFRGS, com o objetivo de seguir carreira nessa área. Meu propósito é dedicar minha vida a essas causas, contribuindo para um mundo mais inclusivo e justo.

2.⁠ ⁠Poderia nos contar um pouco mais sobre o projeto específico que a levou a ser selecionado para a Brazil Conference? O que torna esse projeto especial e qual é o seu impacto na comunidade?

Sou fundadora e coordenadora do projeto Amigos Inclusivos, uma iniciativa que promove a inclusão social por meio da representatividade. Adaptamos bonecos para crianças com deficiência, personalizando suas características físicas ou estéticas para que se sintam valorizadas e reconhecidas.

Até o momento, já alcançamos crianças PcD de comunidades próximas à nossa cidade, mas nosso objetivo é expandir esse número cada vez mais. Acreditamos que toda criança merece se enxergar no mundo ao seu redor e que um simples gesto, como ter um brinquedo que reflita sua realidade, pode fazer toda a diferença na construção da autoestima e do senso de pertencimento.

Além disso, realizamos ações de conscientização sobre diversidade e inclusão em escolas da Educação Infantil e do Ensino Fundamental. Defendemos que a mudança comece pela educação, e levar esse diálogo para dentro das salas de aula contribui para a construção de uma sociedade mais empática e acessível. Nosso projeto também envolve alunos do Ensino Médio e de robótica, que participam da produção de acessórios para os bonecos utilizando impressão 3D. Dessa forma, além de trabalharem a inovação, esses jovens são incentivados a refletir sobre inclusão e acessibilidade.

Esse compromisso com a transformação social foi o que me levou a ser selecionada para a Brazil Conference. Nossa missão é ampliar o impacto dos Amigos Inclusivos, alcançando mais crianças e disseminando a importância da representatividade e do respeito às diferenças.

O impacto desse projeto na comunidade é imensurável. Um exemplo marcante foi o de Dudu, nosso eterno Cláudio Eduardo, uma criança com paralisia cerebral que, infelizmente, faleceu dois meses após receber seu boneco. Após sua partida, perguntei à avó dele se achava que o boneco havia sido importante para ele, mesmo diante das dificuldades que enfrentava. Ela me respondeu que, apesar de acamado, bastava ver seu boneco para sorrir — e que o guardaria para sempre como lembrança do neto.

Histórias como a do Dudu reafirmam o propósito dos Amigos Inclusivos: levar afeto, representatividade e inclusão para cada vez mais crianças e famílias.

3.⁠ ⁠Quais foram os maiores desafios que você enfrentou ao longo do seu trabalho e como conseguiu superá-los?

Ao longo do meu trabalho com os Amigos Inclusivos, enfrentei diversos desafios, desde questões financeiras até dificuldades na produção dos bonecos e na ampliação do alcance do projeto. Um dos principais desafios é a falta de investimento, já que se trata de uma iniciativa nova, ainda sem apoio financeiro fixo. Embora essa questão ainda não tenha sido totalmente superada, estou desenvolvendo uma estratégia de apadrinhamento, na qual empresas ou benfeitores podem financiar a produção do boneco de uma criança, cobrindo os custos envolvidos e garantindo que mais crianças sejam beneficiadas.

Outro obstáculo está no próprio processo de confecção dos bonecos. Como cada um é personalizado, precisamos criar moldes do zero, já que não existem modelos pré-fabricados para as diferentes características físicas que buscamos representar. Além disso, a produção não pode ser feita em massa, pois cada boneco é único. Isso torna o trabalho artesanal e demanda bastante tempo e dedicação.

Por fim, um grande desafio é conseguir atender à crescente demanda. Muitas crianças se candidatam para receber um boneco, e queremos alcançar o maior número possível delas. No entanto, devido às limitações de tempo e recursos, a expansão do projeto precisa ser planejada com cuidado, garantindo que possamos continuar oferecendo um trabalho de qualidade e impactando positivamente cada família atendida.

Apesar desses desafios, sigo determinada a ampliar os Amigos Inclusivos, buscando soluções criativas e parcerias para tornar o projeto sustentável e acessível a mais crianças.

4.⁠ ⁠Quais inovações ou mudanças você gostaria de implementar em sua organização nos próximos anos para aumentar o impacto social?

Nos próximos anos, pretendo expandir nossas ações de conscientização em escolas, levando o debate sobre diversidade e inclusão para um número maior de alunos. Quero fortalecer parcerias com educadores e profissionais da área para criar materiais didáticos acessíveis e lúdicos, como histórias infantis protagonizadas por crianças com deficiência ou características físicas singulares. Essas iniciativas ajudam a construir uma sociedade mais empática desde a infância.

Além disso, quero compartilhar nossos moldes com instituições parceiras em todos os estados do Brasil, permitindo que mais crianças sejam beneficiadas e que o impacto do projeto alcance nível nacional.

Também busco estabelecer parcerias com empresas privadas que já atuam na causa, além de firmar colaborações com municípios, estados e o governo federal por meio de projetos. Isso possibilitará a expansão dos Amigos Inclusivos para novos territórios e garantirá recursos para seu crescimento.

Por fim, planejo estruturar uma rede de voluntários e colaboradores, envolvendo mais pessoas na causa e permitindo que o projeto cresça de forma sustentável.

5.⁠ ⁠O que você espera aprender ou vivenciar na Brazil Conference em Harvard e MIT, e como pretende aplicar essa experiência em seu trabalho no Brasil?

⁠Na Brazil Conference espero viver uma experiência transformadora, conhecendo o maior número possível de líderes inspiradores e suas histórias. Quero trocar ideias, receber feedbacks, críticas construtivas e estabelecer parcerias estratégicas que possam fortalecer os Amigos Inclusivos e ampliar seu impacto no Brasil.

Além disso, pretendo colaborar com os projetos de outros participantes, contribuindo com minha visão sobre inclusão e acessibilidade, ao mesmo tempo, em que aprendo novas abordagens para enfrentar desafios sociais. Vejo essa conferência como uma oportunidade única para expandir minha rede de contatos, absorver conhecimento e pensar em novas iniciativas que possam ajudar a construir um país melhor. 

Estou muito animada e grata por essa oportunidade e quero aproveitar cada momento para adquirir aprendizados valiosos que possam ser aplicados no meu trabalho e na minha trajetória profissional.

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