Direito da Mulher no combate a retrocessos de conquistas femininas – 2ª parte da entrevista com Paula Tavares
Em entrevista, a especialista-sênior em direito e gênero do Banco Mundial explica em que consiste o Direito da Mulher
Esta é a segunda parte da entrevista com Paula Tavares, advogada especialista sênior em gênero e direito da mulher, com mais de 15 anos de experiência em desenvolvimento internacional e direito comparado com foco em equidade de gênero, inclusão econômica das mulheres e desenvolvimento do setor privado, cujo trabalho há mais de 11 anos no Banco Mundial é reconhecido mundialmente.
Falamos sobre os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, desenhados para 2030 e para 2050, no que se refere à igualdade de gênero, de direitos civis e trabalhistas como importantes catalisadores e parâmetros de avanços em relação à igualdade de gênero. Também abordamos retrocessos bastante negativos no progresso em relação à igualdade de gênero, com a intensificação da violência e dos casos de casamento infantil, do aumento do trabalho não remunerado em casa, baixa representação em posições de liderança e representação política, violência física ou sexual.
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Outro ponto importante desta parte da entrevista é conhecer o que consiste o Direito da Mulher, a contextualização de sua criação, como se desenvolveu no Brasil, maiores conquistas no Brasil e no exterior.
Os anos 80 foram designados pela ONU a década da mulher. Uma série de eventos, ações e projetos foram realizados com o objetivo de promover a inclusão feminina no mercado de trabalho, inclusive de tecnologia. Ao mesmo tempo, houve o crescimento avassalador da indústria cultural e tecnológica (expansão de consoles de games, computadores pessoais etc.) que reforçaram estereótipos masculinos e a manutenção do patriarcado. Infelizmente até o surgimento da Web, houve um enfraquecimento da participação feminina no mercado de trabalho, sobretudo em tecnologia. Você acredita que os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, desenhados para 2030 e para 2050, serão finalmente cumpridos no que se refere à igualdade de gênero, de direitos civis, trabalhistas?
A definição dos objetivos do desenvolvimento sustentável no âmbito da ONU e os compromissos assumidos pelos governos têm sido importantes catalisadores e parâmetros de avanços em relação à igualdade de gênero. No entanto, os últimos relatórios em termos de progresso, tanto globais, quanto no Brasil, mostravam um avanço lento no alcance destes objetivos, e um certo retrocesso nos últimos dois anos com a pandemia.
O relatório do secretário geral da ONU, em relação ao progresso e alcance das metas dos objetivos de desenvolvimento sustentável de 2021 e 2020, mostra uma visão global desalentadora da situação atual, em especial em relação à violência contra a mulher. Os dados apontam um retrocesso bastante negativo no progresso em relação à igualdade de gênero, com a intensificação da violência e dos casos de casamento infantil, do aumento do trabalho não remunerado em casa, baixa representação em posições de liderança e representação política, a existência e a persistência de leis discriminatórias e lacunas jurídicas que não permitem que as mulheres possam gozar de seus plenos direitos humanos. Com relação à violência, os dados de pesquisas nos últimos anos mostram que uma em três mulheres já sofreram com algum tipo de violência física ou sexual, por um parceiro, companheiro, marido, pelo menos uma vez em sua vida. Estes dados não haviam melhorado ao longo da última década, e pioraram nos últimos dois anos. Em termos do casamento infantil, projeções da UNICEF sugerem que 10 milhões de meninas a mais estão em risco de se casar precocemente como consequência da pandemia, revertendo o progresso alcançado nos últimos dez anos, e aumentando, com isso, o risco de gravidez precoce e abandono escolar, com impactos também na igualdade de gênero e nos direitos econômicos das mulheres.
Em termos de participação na força de trabalho, os relatórios mostram que em 2019 as mulheres representavam 39% da força de trabalho global, mas detinham apenas 28,3% dos cargos de gerência, um aumento de apenas três pontos percentuais desde 2000. Mostram também a magnitude da sobrecarga da dupla e tripla jornada das mulheres no mundo todo: elas gastam duas vezes mais em termos de horas do que os homens em trabalhos domésticos e não remunerados em cento e trinta e cinco países analisados.
O acesso à telefonia móvel e tecnologia é uma das áreas que esses relatórios também avaliam como parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável. Os dados (para o período de 2017 a 2019) mostram que a ampliação do acesso à telefonia móvel tem demonstrado um impacto no progresso de desenvolvimento social e econômico, mas que em 66 países, as mulheres tinham 8,5% menos acesso a telefones móveis do que os homens, em termos globais.
Com relação especificamente ao Brasil, na avaliação do arcabouço jurídico de promoção, implementação e monitoramento de igualdade de gênero na vida pública, em 2018, em termos de uma escala de zero a cem, o Brasil ficou com setenta pontos. O relatório ressalta um gap na legislação brasileira em relação à garantia de benefícios, oportunidades e direitos no âmbito do casamento e da família. A termos da divisão do trabalho doméstico não remunerado e com cuidados, dados de 2019 coletados pelo IBGE mostram que as mulheres gastam 11,8% do tempo com esse tipo de trabalho, em comparação com 5,3% do tempo gasto pelos homens. Em termos de representação feminina em posições de liderança, em 2018, tínhamos 39,6% de mulheres em posições cargos de gerência, mas esse número caiu para 37,4% em 2019.
Quis trazer um pouco destes dados, tanto globais quanto do Brasil, para mostrar que continuamos caminhando em ritmo lento, e, agora, infelizmente, um pouco para trás. Por outro lado, essas questões ganharam, por isso mesmo, maior visibilidade durante a pandemia. Com isso, existe também a perspectiva promissora de podermos acelerar a adoção de medidas, iniciativas e intervenções que possam contribuir para avançarmos mais rapidamente para reverter esses impactos e possivelmente nos aproximar dos objetivos mais rapidamente.
Foto do lançamento do relatório do Banco Mundial “Fechando a Brecha – Melhorando as Leis de Proteção à Mulher contra a Violência”, que ressaltou as lacunas da legislação brasileira em relação à proteção adequada de meninas e adolescentes contra o casamento infantil, e serviu de estopim para a introdução no Congresso Nacional de um projeto de lei para alterar o Código Civil de forma a fechar as lacunas.
No que consiste o Direito da Mulher? Desde quando foi criado, como se desenvolveu no Brasil? Quais foram as maiores conquistas no âmbito do Direito da Mulher no Brasil e no exterior em seu ponto de vista?
Os direitos da mulher são reconhecidos como uma ramificação dos direitos humanos, baseados em princípios morais e jurídicos de integridade e de dignidade, os quais devem nortear o comportamento humano. Entre suas premissas básicas, protegidas pelo Direito Internacional e dos países, está o reconhecimento de que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos, os quais são inalienáveis e constituem o fundamento da liberdade, da justiça e da paz. Quando se fala no direito da mulher, entende-se o reconhecimento de uma igualdade de direitos civis, políticos, sociais, religiosos entre homens e mulheres, princípios estes expressos em dispositivos da Carta das Nações Unidas e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, marcos presentes na Constituição das Nações Unidas.
Esses foram alguns dos primeiros passos desse reconhecimento expresso e formal no âmbito internacional, pautados por marcos importantes conquistados pelos movimentos feministas. Para citar alguns, a primeira convenção dos direitos das mulheres nos Estados Unidos, realizada em Seneca Falls em 1848, culminou em uma Declaração de Princípios e movimento afirmando a demanda de mulheres pelo reconhecimento de seus direitos civis, políticos, sociais e religiosos. A Nova Zelândia, em 1893, foi o primeiro país a conceder às mulheres o direito de votar. Em 1991 houve o primeiro Dia Internacional da Mulher na Europa. Em termos globais, um dos importantes marcos de progressão de avanços dos direitos das mulheres foi o estabelecimento, em 1946, da Comissão sobre a Situação da Mulher (CSW) como instância da ONU, logo após a sua criação. A Comissão, por sua vez, teve atuação essencial no delineamento da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 e seu reconhecimento expresso a uma perspectiva de igualdade entre homens e mulheres.
Nos anos seguintes, o trabalho da Comissão resultou em uma série de tratados sobre os direitos das mulheres, que incluíram: a Convenção dos Direitos Políticos das Mulheres de 1952, a Convenção sobre a Nacionalidade de Mulheres Casadas de 1957, a Convenção sobre o Casamento por Consenso, Idade Mínima para Casamento e Registro de Casamentos (1962). Esses tratados foram marcos cruciais visando a proteção e a promoção dos direitos da mulher nessas áreas, consideradas especialmente vulneráveis nessa época.
Em 1975, a primeira Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada no México, foi considerada o primeiro grande esforço global de reunir países e estabelecer metas e compromissos para o avanço dos direitos e da igualdade das mulheres. Em 1979, tivemos a adoção da Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW),i considerada o primeiro tratado internacional que dispõe amplamente sobre os direitos humanos da mulher, a qual baseia-se em duas frentes principais: a promoção dos direitos da mulher na busca pela igualdade de gênero e a eliminação de toda forma de discriminação contra a mulher nos Estados-parte, tanto no âmbito de legislação quanto na prática. Em paralelo, tivemos, entre 1975 e 1985, a Década da Mulher, consagrada pela ONU, durante a qual foram realizadas duas outras conferências mundiais sobre a mulher (1980 e 1985), período este que testemunhou esforços e conquistas importantes no reconhecimento dos direitos da mulher.
Em 1995, realizou-se, em Pequim, a quarta (e última) Conferência Mundial sobre a Mulher, durante a qual estabeleceu-se uma agenda inovadora para os direitos das mulheres. Como resultado do encontro, que reuniu mais de 30 mil ativistas, representantes de 189 países adotaram a Declaração e Plataforma de Ação de Pequim, um documento histórico que articula uma visão e estratégia de igualdade de direitos, liberdade e oportunidades para as mulheres, a qual continua a ser referência para a promoção da igualdade de gênero e direitos das mulheres em todo o mundo. No ano passado (2021), a ONU Mulheres promoveu o Fórum Geração Igualdade na França, o qual reuniu representantes de governo, sociedade civil, e setor privado do mundo todo, além de uma audiência virtual de quase 50 mil pessoas, resultando em novos compromissos contundentes e um plano de aceleração global para se avançar a igualdade de gênero até 2026.
O Brasil acompanhou, nesse período, os movimentos mundiais, com avanços legislativos importantes e reconhecimento dos direitos civis, políticos, e sociais das mulheres. Em uma linha do tempo paralela, tivemos a conquista do voto feminino em 1932 (embora ainda com restrições, pois as mulheres casadas precisavam de autorização do marido) e, em 1934, a eliminação das barreiras para o voto feminino a todas as mulheres independentemente do estado civil. Em 1962, o Estatuto da Mulher Casada foi um grande marco no avanço dos direitos das mulheres, acompanhando o movimento dos tratados internacionais, em que as mulheres casadas deixaram de ser consideradas relativamente incapazes perante o Direito Civil. Até então, como mencionado anteriormente, precisavam, por lei, da autorização do marido para exercer a profissão, exercer o comércio, abrir conta em banco livremente, entre outros. Com o Estatuto, passam a ter esses e outros direitos, inclusive ingressar livremente no mercado de trabalho, exercer o pátrio poder em colaboração com o marido e ter direitos de propriedade com relação aos imóveis conjugais. Com a promulgação do código eleitoral de 1965, os direitos e obrigações eleitorais entre homens e mulheres foram igualados no sentido mais amplo, e, em 1977, a Lei do Divórcio tornou facultativa para a mulher a adoção do nome do marido com o casamento e instituiu o regime de comunhão parcial de bens.
Apesar desses avanços, foi apenas em 1988, com a nova Constituição, que se consagrou pela primeira vez o reconhecimento formal da igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres de maneira plena e ampla na legislação brasileira. O texto trouxe ainda disposições importantes para a promoção da igualdade: da licença maternidade à proibição de diferença de salários no exercício de funções e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade e estado civil, até o reconhecimento da união estável entre homens e mulheres como entidade familiar. Em 1995, a ratificação pelo Brasil da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará, foi mais um marco para o País (e a região), sendo integrada posteriormente ao ordenamento jurídico como legislação ordinária. Em 2002, caíram ainda outras desigualdades remanescentes (ainda que apenas formalmente) no texto legislativo: com o novo Código Civil, caiu da legislação o o direito exclusivo do homem de ser chefe de família e restrições aos direitos da mulher casada de exercer o poder familiar, representar e manter a família, escolher domicílio, administrar os bens familiares comuns.
É importante ressaltar como é recente o reconhecimento formal da igualdade desses direitos na legislação, para também contextualizar as perspectivas atuais. Desde então, nos últimos vinte anos, um maior enfoque voltou-se, portanto, à questão da violência, como elemento ao mesmo tempo de manifestação extrema da desigualdade de gênero como também de sua perpetuação. O movimento resultou na adoção de uma legislação crucial no Brasil, no sentido de coibir e proteger contra a violência. Em 2004, houve a inclusão da violência doméstica como um tipo penal no Código Penal, mas foi só em 2006 a promulgação da legislação específica contra a violência doméstica e familiar, a tão conhecida Lei Maria da Penha.
O Banco Mundial produz um relatório que faz um apanhado da legislação de 190 países do mundo todo, examinando as lacunas e oportunidades de avanço em áreas-chave associadas à inclusão econômica da mulher. As últimas avaliações para o Brasil mostram ainda haver lacunas que podem ser fechadas em termos da legislação, principalmente no que tange a questões que afetam a distribuição mais igualitária das responsabilidades familiares e o empreendedorismo feminino. Ainda assim, os avanços na legislação brasileira em prol da igualdade de gênero e os direitos da mulher têm sido constantes, e há muito o que comemorar. Além disso, a Lei Maria da Penha continua sendo exemplo de legislação contra a violência doméstica, e o arcabouço jurídico nessa área continua sendo aprimorado para contemplar novas demandas e melhorar sua eficácia.
Acompanhamos também o trabalho de organizações da sociedade civil trabalhando pela causa feminina e os esforços e movimentos de mulheres ao longo dos anos que impulsionaram várias dessas lutas, que foram, e continuam sendo, precursores de todo esse movimento no âmbito global e no Brasil. No âmbito doméstico, esses movimentos femininos e feministas e grupos da sociedade civil servem como uma importante referência das demandas e cobrança, por assim dizer, do trabalho por parte do governo e avanços na legislação e adoção de políticas para promoção da igualdade de gênero.
Por mais de 11 anos a senhora atua no Banco Mundial na promoção de análise da legislação nacional em nível global e regional para desenvolver indicadores sobre os direitos econômicos das mulheres, no desenho de metodologia e análise de dados para o indicador Mulheres, Empresas e a Lei Protegendo as Mulheres da Violência com foco nas leis de violência contra as mulheres. Poderia apontar para nossos leitores ferramentas, pesquisas e conteúdos desenvolvidos os quais provocaram e estão provocando uma mudança na desigualdade de gênero?
Desde 2010, o Banco Mundial realiza uma análise comparativa da legislação nacional em nível global, regional e dos países, e seu impacto na participação econômica das mulheres. Esse trabalho, desenvolvido ao longo dos últimos 11 anos, busca identificar lacunas na legislação dos países e acompanhar os avanços, à luz das boas práticas internacionais, e resulta na publicação de um relatório – Mulheres, Empresas e o Direito, que tem como intuito dar visibilidade à questão e incentivar reformas em prol do empoderamento econômico das mulheres. Tive o privilégio de participar desse trabalho desde seu início, e atuar no desenvolvimento e expansão da iniciativa, bem como dos indicadores, metodologia e análise sobre os direitos econômicos da mulher.
O estudo avalia não apenas leis que discriminam e restringem os direitos das mulheres, mas também algumas áreas de legislação que podem contribuir para equilibrar desigualdades de gênero estruturais, e assim garantir maiores oportunidades para as mulheres. Sabe-se – com base em evidências existentes – que em muitos casos uma lei aparentemente neutra, por exemplo, pode ter impactos diferentes nas mulheres e nos homens. Por outro lado, é ainda preciso de legislação que possa contribuir para fechar lacunas na prática, seja por meio de legislação afirmativa (como cotas e metas) ou legislação que contribua para uma equalização de responsabilidades, oportunidades e garantia de direitos. Quando se considera, por exemplo, a questão das licenças maternidade e paternidade, e na promoção da licença parental, é um tipo de legislação que não é necessariamente afirmativa, mas que pode contribuir para diminuir lacunas que continuam existindo em termos das responsabilidades domésticas e familiares, e seus impactos no trabalho produtivo da mulher. Temos também a legislação de combate à discriminação de gênero, por exemplo, no acesso ao crédito. É uma legislação em essência neutra, mas pode servir para coibir uma discriminação na prática mais frequente em relação às mulheres, e oferecer recursos legais para combatê-la. Nesse sentido, o trabalho do Banco Mundial analisa também leis como essas, e como podem contribuir para a promoção da igualdade na prática.
Em termos de ferramentas, pesquisas e conteúdos, apontaria esses relatórios do Banco Mundial, publicados desde 2010, trazendo essa análise comparativa dos países e os avanços a cada dois anos. O relatório de 2019 trouxe um apanhado histórico das tendências e dos impactos dos avanços dos dez anos anteriores de legislação no mundo todo. A edição de 2020 traz uma perspectiva interessante, com um apanhado da legislação dos últimos cinquenta anos, com uma análise importante dos avanços, das tendências, e dos impactos, mostrando correlações diretas entre a adoção de legislação que contribui para a igualdade com impactos importantes para os países, tanto em termos de resultados econômicos, mas também de desenvolvimento – educação, empreendedorismo, saúde, entre outros – e com benefícios não só pra mulher, mas para a família, e a sociedade como um todo.
O relatório faz um apanhado das tendências globais e regionais, e oferece perspectivas e conclusões principais com o intuito de contribuir para essa discussão e para informar a adoção de políticas públicas e de legislação em prol da igualdade de gênero. Traz também dados para os países, e acompanha a evolução da legislação ao longo dos anos, embora não se aprofunde em análises de resultados econômicos de maneira individual. Por outro lado, há uma série de análises mais aprofundadas em temas específicos. Em 2017, realizamos uma análise focada na legislação global e regional de proteção às mulheres contra a violência, a qual lançamos no Brasil, dando visibilidade à legislação existente com base no Código Civil que permitia o casamento infantil em certas circunstâncias. Esse trabalho teve uma repercussão importante, e contribuiu para a mudança no Código Civil (adotada em 2019) que reforçou a legislação contra o casamento infantil no Brasil. Mais recentemente, fizemos uma análise também do combate à violência contra a mulher no Brasil em época de Covid, apontando o aumento da violência contra as mulheres no Brasil (e no mundo) como o impacto da pandemia, e trazendo um apanhado de medidas adotadas por diferentes países para lidar com essa situação. Em especial, a análise traz recomendações em termos de políticas e iniciativas para mitigar o aumento dos riscos e impacto das medidas de contenção da pandemia, com enfoque na melhoria dos sistemas de proteção e resposta no curto prazo, bem como medidas relevantes de médio e longo prazos para prevenir possíveis situações semelhantes no futuro e de forma a combater a violência de maneira efetiva, para avanços mais concretos e resultados duradouros.
O Banco Mundial realiza também uma linha de análises do impacto econômico da desigualdade de gênero em termos da perda de riqueza de capital humano dos países, com base na diferença de participação no mercado de trabalho e de renda entre homens e mulheres. Esses estudos avaliam as perdas em razão de desigualdades estruturais, como em termos de educação, escolaridade e qualidade do ensino, questões na área de saúde e acesso ao mercado de trabalho, com projeções de impactos na contribuição produtiva de homens e mulheres em termos de capital humano para as economias.
Existem outras análises e pesquisas de diferentes organizações, com conteúdos muitos interessantes em termos de análise econômica da desigualdade de gênero, do potencial de contribuição para as economias com base na maior igualdade de gênero, principalmente em termos de participação na economia. Há diversos relatórios, por exemplo, do Instituto McKinsey, com dados sobre impacto de equidade e diversidade em termos de liderança, em empresas e no trabalho, estudos da Organização Internacional do Trabalho (OIT) com enfoque em desigualdade e mercado de trabalho, e análises do Fundo Monetário Internacional (FMI), que começou também a trabalhar esse tema, entre outros, que incluem algumas análises também para o Brasil. Há também análises interessantes de instituições com enfoque na América Latina, como as da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), além de todo o trabalho da ONU Mulheres, a organização internacional de atuação mais proeminente na área de igualdade de gênero, que também conta com um braço no Brasil. Há, ainda, diversas análises de organizações da sociedade civil no Brasil, a exemplo de algumas iniciativas que acompanham os avanços legislativos, a movimentação de projetos de lei no congresso que tratam de questão de gênero, trabalhos da Fundação Getúlio Vargas, da USP, entre outros.
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