Desburocratização ou devastação? A boiada que vai destruir o Brasil
Com o PL da Devastação, querem transformar a maior parte do licenciamento em autodeclaração.
Os homens de ternos azuis que andam pelo Congresso querem nos convencer a todo custo de que o licenciamento ambiental atualmente é um entrave. Dizem que é lento, complexo, travado: querem reduzir toda discussão à burocracia. Anunciam nos microfones e coletivas de imprensa que seguir regras e ter rigor atrasam o desenvolvimento do país. Mas quem repete isso não fala das vidas salvas, nem dos territórios protegidos, nem dos rios que ainda correm livres porque alguém, em algum órgão ambiental, se recusou a dizer “sim” com pressa.
O que emperra o Brasil não é o cuidado. É a ganância, a insistência de um modelo econômico falido que acha que o que trará desenvolvimento ao país é moer montanhas a qualquer custo, furar poços de petróleo em meio à biodiversidade e espalhar pelo país plantações que pouco alimentam as pessoas.
O Projeto de Lei 2.159/2021 é apresentado (e praticamente aprovado) como bala de prata para os problemas do licenciamento ambiental. No entanto, basta olhar com um pouco mais de atenção para perceber: não querem desburocratizar, querem desmontar. Querem empurrar goela abaixo um modelo em que os estudos viram formalidade, o controle social vira incômodo e a consulta às comunidades vira detalhe dispensável.
Com o PL da Devastação, querem transformar a maior parte do licenciamento em autodeclaração. O empreendedor diz que não tem impacto e pronto, recebe a licença. Sem debate, sem estudo, sem análise, ao gosto do grupo político que está no poder. Um papel impresso que vale mais que a lama que engoliu Mariana e destruiu o Rio Doce. Uma assinatura que vale mais que as 272 vidas soterradas em Brumadinho. Um clique que vale mais que os bairros inteiros tragados em Maceió.
A grande ironia é que tudo isso acontece enquanto o Brasil tenta se mostrar o grande embaixador da agenda climática, enquanto posa de anfitrião da COP30 e diz ao mundo que quer preservar a Amazônia. Como acreditar nesse discurso, se ao mesmo tempo se estimula a exploração de petróleo na Foz do Amazonas e se aprova um projeto que rasga o licenciamento ambiental?
É pura incoerência, para dizer o mínimo. Não há futuro possível se o preço do progresso for a morte lenta dos nossos biomas. Não há desenvolvimento justo se comunidades forem silenciadas. Não há transição energética sem justiça climática.
O que o Brasil precisa não é de menos licença. É de mais estrutura nos órgãos ambientais. Tecnologia que una gente e natureza. Precisamos de coragem para enfrentar os interesses que lucram com a destruição, os mesmos que financiam os homens de ternos azuis do Congresso.
Se aprovarem esse projeto, que se preparem para assinar também o atestado das próximas tragédias. Porque quando o licenciamento ambiental vira ficção, a catástrofe vira certeza.