Carência de incentivos financeiros se torna o maior adversário das mulheres no esporte
A escassez de patrocínio prejudica o desenvolvimento e a visibilidade das atletas, originando mais um obstáculo na dura caminhada com destino à realização do sonho da profissionalização no esporte.
Por Luiza Diniz e Mariana Walsh para Cobertura Colaborativa da NINJA Esporte Clube
A escassez de patrocínio prejudica o desenvolvimento e a visibilidade das atletas, originando mais um obstáculo na dura caminhada com destino à realização do sonho da profissionalização no esporte.
O esporte é um dos fenômenos sociais mais importantes da era moderna e possui um caráter identitário que ultrapassa barreiras geográficas, culturais e sociais. Ao longo dos últimos anos, a prática esportiva foi se profissionalizando e se consolidando como uma grande indústria, que movimenta cerca de trilhões de dólares por ano. Mesmo não se tratando de uma questão recente, a dificuldade na conquista de patrocínio por alguns esportistas brasileiros ainda é um obstáculo. Se falarmos em incentivo para atletas mulheres, essa realidade se torna ainda mais árdua.
Com o início das Olimpíadas de Tóquio 2020, esse debate volta à tona trazendo visibilidade para a gritante desigualdade de gênero dentro do mundo dos esportes, levantando o questionamento: Por que as mulheres ainda são preteridas entre os patrocinadores?
Corrida por investidores
A associação de empresas com o mundo dos esportes gera uma grande identificação com o público, fortalecendo a marca. Desse modo, a ideia de patrocínio está diretamente ligada à audiência, e nessa disputa, os homens saem na frente. Esportes tradicionais como futebol, vôlei e basquete, atraem milhares de espectadores quando destacam protagonistas masculinos, angariando uma maior quantidade de investimentos. Nessa circunstância, se torna evidente a existência de um ciclo vicioso: não há tanto interesse na injeção de capital em competições femininas devido pouca visibilidade, ao mesmo tempo que, a falta de estrutura e incentivo financeiro atrapalham a busca por maiores públicos.
A nadadora brasileira Etiene Medeiros, medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de Lima em 2019, recordista mundial em provas individuais e classificada para as Olimpíadas de Tóquio 2020, é um exemplo dessa realidade. A atleta desabafou sobre o assunto em uma entrevista para a Folha de São Paulo em janeiro do ano passado:
“Gente, estou em busca de um patrocínio há muito tempo. Faço isso por amor, levantando a bandeira da natação e do esporte feminino, mas sabemos que a educação do esporte no Brasil precisa melhorar muito”
A disparidade dos salários
A desigualdade não habita somente nos incentivos aos esportistas, ela invade o campo das contratações, por meio de ofertas de salários baseadas no gênero do contratado e não na performance apresentada. Na lista dos 50 atletas mais bem pagos de 2020, divulgada pela Revista Forbes em junho deste ano, somente duas mulheres ocupam o ranking e nenhuma delas está entre os 10 primeiros lugares. Naomi Osaka, tenista negra japonesa que disputará os Jogos Olímpicos em seu país, aparece em 12º lugar com uma receita de 60 milhões de dólares, seguida pela tenista norte-americana Serena Williams em 28°, com 41,5 milhões de dólares. O primeiro lugar da lista pertence ao lutador de MMA Connor McGregor, ostentando uma bagatela de 180 milhões de dólares, valor este maior que a soma das receitas anuais das duas atletas.
No ranking dos atletas olímpicos mais bem pagos de 2020, divulgada também pela Forbes, a disparidade reduz trazendo Naomi Osaka em segundo lugar, perdendo apenas para o norte-americano jogador de basquete Kevin Durant com 75 milhões de dólares.
A voz de Marta
Premiada em seis edições pela FIFA com o título de melhor jogadora do mundo e a apenas dois gols de distância do recorde de maior artilheira de Olimpíadas, lugar esse ocupado atualmente pela também brasileira Cristiane, que já balançou a rede 14 vezes, a craque da Seleção Brasileira de futebol não é uma exceção à regra. Marta optou por participar da Copa do Mundo Feminina em 2019 sem patrocínio, por acreditar que nenhuma proposta ofertada estava à altura de sua representação dentro do cenário esportivo. Durante a competição, a jogadora exibiu uma chuteira preta com o símbolo do movimento Go Equal, que exige igualdade entre atletas homens e mulheres.
Nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, a esportista anunciou que será embaixadora global de inclusão e diversidade da companhia aérea Latam Brasil, fruto de um acordo de patrocínio pessoal com a empresa. Porém, a camisa 10 segue fiel à sua decisão de não fechar parcerias com marcas esportivas por questões de princípios, a exemplo do evento em 2019, até o surgimento de uma oferta que ela considere justa para o futebol feminino.
Conquista de visibilidade
Mesmo com um trajeto mais complicado e com menos investimentos, as mulheres compõem quase metade da delegação em Tóquio, cerca de 49%, um recorde de participação em Jogos Olímpicos. Visando uma equidade também em relação aos patrocínios, cabe aos espectadores o dever de ampliar a audiência das competições femininas. Além de acompanhar o desempenho de atletas incríveis, as melhores do mundo, surtirá grande efeito na busca pela igualdade de gênero no esporte.