Quarta-feira (26), dia em que os meteorologistas contabilizam o dia mais quente do ano até agora, com temperatura de 37,5 graus em Berlim como “somente” um dos exemplos da onda recorde de calor que acomete a Europa e que esfrega na nossa cara, que a jovem ativista sueca, Greta Thunberg, está muito além do seu tempo como suas reivindicações além da vontade política dos países que regem o mundo. A onda de calor na Alemanha em 2018 destruiu muitas safras, colocou agricultores em situação de desespero. De quebra, mostrou a incompetência da Ministra da Agricultura e deu um tapa na cara do país que caminha em velocidade tartaruga para, de forma irrevogável, extinguir a indústria de extração de carvão mineral e, com isso, diminuir consideravelmente a emissão de Gás Carbono na atmosfera.

Enquanto berlinenses lutavam contra “o ar vindo do Saara” (assim a linguagem dos metereologistas) e na tentativa fracassada em comprar um ventilador, no prédio da Câmara Baixa, o Reichstag, a chanceler Merkel respondia perguntas de bancadas, praxe no sistema de Democracia Parlamentar como o que rege na Alemanha. Entre várias perguntas, a da deputada do Partido Verde, Anja Hajduk. Ela questionou as negociações do acordo entre a UE e os países do Mercosul e mencionou “a deterioração” no Brasil além de instigar a possibilidade do governo alemão usar isso nas negociações, como pressão frente ao governo Bolsonaro.

Em seu vasto legado de uma (para dizer ao mínimo) instigante carreira política, os quesitos posicionamento e texto claro, não serão características a serem lembradas como pilastras no estilo político de Merkel nas inúmeras biografias que ainda serão escritas sobre a filha de pastor evangélico- luterano que cresceu na antiga Alemanha Oriental e frequentou a escola primária na cidade de Templim. Posicionamento claro e concreto faltam em seu portfólio.

Como todos os berlinenses, também a chanceler vem sofrendo com as temperaturas recordes. Além de recentes “ataques de tremor” em eventos oficiais (o mais recente, na quinta-feira (27) em evento no Palácio Presidencial), o foco midiático já se desvia para especulações sobre a saúde da Chefe de Governo e isso será algo a ser falado, discretamente, nas rodas de conversas que varam a noite durante a Cúpula.

Interesses econômicos

Especialmente quando estão em jogo interesses que beneficiam a economia alemã, assegurando empregos também nos países da UE, Merkel se esconde em vocabulário diplomático, vai na maciota. Desta vez, foi diferente. Merkel engatou em formato dobradinha: de não fazer vista grossa frente à situação que ela denominou “dramática”, ao mesmo tempo que declarou que o não acerto do acordo com os países do Mercosul (em negociações que já duram 20 anos), “Não irá assegurar que um hectare a menos de floresta seja derrubado no Brasil”.

Macron para escanteio

Contrariando a praxe do tradicional Eixo França-Alemanha, pro-forma em conjunto (Merkel decide e Macron obedece) alinhavando os caminhos dentro da UE, Merkel decidiu avançar pela lateral. A brilhante estrategista se aliou a outros governantes para agilizar o Acordo de Livre Comércio entre as duas zonas. En passant jogou o ambicioso presidente francês, para escanteio. Macron sozinho na “Casa Europa”.

A carta, enviada para o Presidente da Comissão da UE, Jean-ClaudeJuncker, foi assinada também pela Espanha, República Tcheca, Países Baixos, Suécia, Letônia e Portugal. Seu conteúdo é um sinal de que a hora é essa e afirma que as duas zonas tem a chance de estabelecer um “contrato histórico”. Merkel quer agilizar, mas ficou bem na foto ao se mostrar “preocupada” com os acontecimentos no Brasil, mesmo que seu objetivo de fechar o acordo, com governos democráticos ou desmatadores ou não.

Cartilha para Bolsonaro

Ao responder à deputada, Merkel se referiu a atual situação política do Brasil como “dramática” e garantiu que irá “fazer o que for possível dentro do seu alcance” para “em conversa séria ” alertar o presidente do Brasil sobre questões de Direitos Humanos e do Meio Ambiente. A chanceler é doutorada nesse viés para inglês ver. Com a China, seu principal parceiro depois dos EUA, ela faz isso, há anos.

Alemanha tem que aprender com o Brasil

A resposta de Jair Bolsonaro, não demorou. O eterno candidato e que teima em continuar sua insana e desesperada procura por um palanque, declarou que não irá “ser advertido por outros países” e que a Alemanha precisa aprender muito com o Brasil e citou o “ainda uso da energia fóssil”. O rebate do eterno Messias é tão diferenciado que só faltou ele dizer que o Brasil joga melhor futebol do que a Alemanha e com NEYMAR escalado!

Merkel sai bem na foto por dar (um pouquinho) a cara para bater na reta final de sua carreira política já previamente agendada para terminar em 2021. No âmbito da Política Externa, e pra isso não se faz necessária uma bola de cristal nem uma cartomante por perto, teremos no Japão um novo vexame de um presidente que tem o perfil daquele mala sem alça que vai à festa, convidado por gentileza ou por motivos protocolares, mas que não perde o selo de penetra, como a lama que cola no sapato depois de um temporal no Rio de Janeiro.

Clima do Saara e ânimos exaltados

Berlim, terra plana e sem praia (!!!) sofre com o calor seco que faz necessário andar com uma garrafa de óleo de oliva na bolsa. Só água de coco para manter a sede. Nesses dias, para temperaturas mais amenas, é preciso voar para a Sicília ou para a Grécia. Berlim está sendo massacrada pelo ar quente do deserto do Saara.

Berlim e Freiburg (Sudoeste) são as cidades mais quentes do país. Ao contrário da Cidade Universitária, Berlim não tem brisa, o ar é de péssima qualidade e a cidade fica em polvorosa, a fila das piscinas públicas são intermináveis, os lagos parecem um formigueiro e o clima fica ainda mais árido no convívio do cotidiano.

Um usuário no Twitter, usando a #Hashtag Hitzewelle (Onda de Calor), foi taxativo: ”Não vejo a hora de chegar Outubro, quando escurece cedo e o café quente volta a agradar”, disse ele irritado com o clima inusitado no país, no qual 7 meses ao ano faz frio, porém o período dos meses quentes fica cada vez mais agressivo para saúde física e mental com também para o cenário urbano. Um caos!

Nem mesmo a mulher mais influente e poderosa da política mundial fica livre dos perrengues que o verão de temperaturas batendo recordes. Depois do Ataque de Tremor (o segundo em curto espaço de tempo), Merkel se tornou um dos Trending Topics no Twitter. Mais do que a questão do Acordo entre a UE o o grupo do MERCOSUL, a chanceler terá as câmeras do mundo todo focadas em si. Não serão poucos os políticos de olhar vampiristico e veia masoquista ou mesmo com quadro de crônica síndrome de vira-latas e ávidos para conferir, de perto, a mulher mais o influente do mundo ocidental, finalmente, exibindo fraqueza. Talvez fosse melhor convidar Greta para discutir a crise climática, agendar soluções e medidas para ontem. Não basta “somente” supermercados que abdicam totalmente de sacolas de plásticos e embalagens de qualquer tipo como em Berlim, nem mesmo os da Tailândia (e recentemente de SP) usarem folhas de bananeira para evitar plástico.

Em 2013, o verão berlinense foi batizado como o “Verão do Século”, o mais quente desde o inicio da medida de temperaturas. Essa resenha não foi o suficiente para angariar e encorpar força política e instigar o debate na sociedade alemã. Em 2018, foram 6 semanas de 35-38graus e sem nenhum pingo de chuva. Árvores começavam a se desvencilhar de troncos por não mais poder alimentá-los.

2019

Com o ar do Saara sobrevoando nossas cabeças nesses dias não dá para não vislumbrar um cenário apocalíptico, digno dos filmes do canadense, David Cronenberg ou do alemão Roland Emmerich.

Comparado aos aspectos climáticos resultante da burrice do mundo relutante em não atentar para o lixo ocidental e para o plástico que invade os oceanos, a leitura da cartilha, o ficar de castigo de recuperação na matéria “governar” do Messias pode parecer um detalhe na galopante dinâmica da crise ambiental. Será mais um degrau abaixo no âmbito da Política Externa e nos fará lembrar, nostálgicos e melancólicos daqueles anos em que um brilhante diplomata que atende pelo nome de Celso Amorim, sabia representar o Brasil. Será mais um mico, sim do pai do Edu, do Flávio e do Carluxo, mas os desafios do Zeitgeist não podem esperar.

Para o próximo domingo (30), meteorologistas preveem a marca de 39 graus na capital e a imprensa sensacionalista quer ver mesmo o circo pegar fogo. Não poupa em especulações se Berlim irá chegar a marca dos 40, como se quisesse ter essa manchete na capa, para constar. A previsão do tempo na Alemanha não tem “somente” uma parte do noticiário. Tem um bloco inteiro depois do jornal da TV. Se irá fazer sol ou não é um aspecto econômico que não se despreza nas terras daqui. Com os cenários apocalípticos de Berlim 40 graus, o tabloide Bild instiga, acima do medo (de não conseguir achar um ventilador na loja porque aqui o galo onde canta, dança, mesmo!), ferramenta sem a qual alemães não sobrevivem, o medo, aquela casa onde ninguém vai…

Depois do verão passado e das declarações de Greta, medo, eu também tenho, do que será do planeta Terra.