Aborto e esporte: quando as atletas precisam abortar para não perder patrocínio
Por quatro vezes medalhista olímpica, esportista afirma que abortou um dia antes dos jogos olímpicos de Pequim
Por Sabrina Ferrari
Qual o poder da sociedade sobre os corpos femininos? Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), um total de 73,3 milhões de abortos seguros e inseguros ocorrem no mundo anualmente. Esse número atinge as atletas que praticam os diferentes esportes. Isso porque, o medo de perder campeonatos e patrocínios atormenta a vida das mulheres que engravidam, mas não querem abandonar suas carreiras, mesmo que seja por meses, pois sabem que a sociedade patriarcal e machista exige que estejam sempre impecáveis e garantam medalhas.
Em 2017, uma atletista americana quatro vezes campeã olímpica contou em sua biografia que abortou um dia antes dos jogos olímpicos de Pequim. Ela aponta, que era a única opção para que continuasse praticando o esporte. “O ponto culminante de uma vida de esforço estava diante de mim. Naquele momento parecia não haver nenhuma outra opção. O debate sobre quando começa a vida de um bebê estava na minha cabeça e um parto no auge da minha carreira foi insuportável. O que pensariam os meus patrocinadores, a minha família, a minha igreja e os meus fãs? Reforçando assim, os poderes que a sociedade exerce e sempre exerceu sobre os corpos e decisões femininas”.
Uma pesquisa divulgada na Folha de São Paulo mostrou que mulheres que praticam aborto em países onde ele não é permitido têm 275 vezes a mais de chance de morrer do que em países onde ele é legalizado. O medo das atletas em engravidar e a escolha pelo aborto são justificados por situações como a que ocorreu com uma atleta, na época com 41 anos, ex-jogadora do Volley Pordenone na temporada 2018/2019. A esportista teve seu contrato rescindido após anunciar a grávidez.
A atleta que é quatro vezes medalhista olímpica, citada no início da matéria, garantiu que muitas outras não usam anticoncepcionais, pois, conforme a entrevista, pode prejudicar fisicamente e também suas carreiras. Assim, “continuam competindo e se engravidam o aborto acaba ocorrendo. Isso já aconteceu e, provavelmente, vai continuar ocorrendo. É algo que todo mundo tem vergonha e ninguém fala, mas continua ocorrendo pela falta de informação”. E, claro, pela necessidade de patrocínio para que continuem concorrendo. Isso levanta a questão: qual o poder de decisão dos homens e da sociedade sobre o aborto?
A Folha Uol também já fez uma reportagem explicando que a ex-Alemanha Oriental estimulava a gravidez das atletas como ajuda para melhorar o rendimento físico. Com a afirmação de que a gestação provoca um doping natural, o ideal considerado era engravidar até dos meses antes da competição e depois fazer o aborto.
O fato é que o Brasil tem a cada dia cerca de 535 internações para o procedimento, em um país onde a prática é considerada ilegal e que mulheres morrem diarimante. Então, por qual motivo a decisão das atletas precisa ser pautada pelo trabalho e não pela própria escolha?
Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube