29 de Janeiro: Um olhar pela empregabilidade e inclusão
O Dia Nacional de Visibilidade de Travestis e Transexuais é uma data que convida a sociedade a refletir sobre os direitos, os desafios e as conquistas da população trans no nosso país
Por Renata Souza, Maiara Fafini e Théo Silveira
Há 21 anos, no dia 29 de janeiro de 2004, ativistas trans lideradas por Fernanda Benvenutty, Kátia Tapety e Keila Simpson conseguiram pela primeira vez incluir na agenda federal suas lutas e reivindicações. Um marco, deu origem ao Dia Nacional de Visibilidade de Travestis e Transexuais. Tratava-se da campanha Travesti e Respeito do Ministério da Saúde e que impulsionou nos anos seguintes outras iniciativas nacionais, estaduais e municipais em busca da dignidade e do respeito às pessoas trans no Brasil. Entretanto, é importante lembrar: desde a década de 90, o movimento de travestis e transexuais se articula oficialmente no Brasil.
O Dia Nacional de Visibilidade de Travestis e Transexuais é uma data que convida a sociedade a refletir sobre os direitos, os desafios e as conquistas da população trans no nosso país. Mais do que um marco simbólico, esse dia reforça a necessidade de ações concretas que garantam dignidade, respeito e oportunidades iguais para essa população, que ainda enfrenta altos índices de violência, exclusão e marginalização.
A luta contra a transfobia ganha cada vez mais força por políticas públicas que favoreçam essa população no seu direito à saúde, trabalho, educação e segurança. Pilares básicos para a construção de uma cidadania plena, respeitando-se suas demandas específicas (nome social, uso do banheiro de acordo com a sua autodeclaração de gênero, cirurgias e outros procedimentos específicos em saúde, dentre outres). E principalmente por políticas de empregabilidade já que para essa população são mínimas as oportunidades de emprego, sobrando assim a prostituição como única fonte de renda devido à exclusão social e falta de postos formais de emprego, sendo a saída mais viável para a sobrevivência de mulheres trans no Brasil.
É nesse contexto que se destacam os projetos de lei apresentados pela nossa mandata, que têm como objetivo central promover justiça social e igualdade de direitos para as pessoas trans. Reconhecida pela nossa trajetória em defesa dos direitos humanos, atuamos na construção de políticas públicas, que buscam combater a discriminação e ampliar as oportunidades para populações historicamente negligenciadas, incluindo travestis, mulheres e homens trans e pessoas trans não binárias.
E foi com o intuito de promover políticas públicas de inclusão e respeito que iniciamos a mandata Renata Souza na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro em 2019. De acordo com levantamento realizado em 2023 pela Agência Diadorim (1) e Gênero e Número (2), nas Assembleias Legislativas de todo o país, os mandatos que mais apresentaram projetos de lei LGBTI no Brasil foram, em primeiro lugar a nossa mandata com 17 PLs, e, em segundo e terceiro lugar, o deputado Carlos Giannazi (PSOL-SP) com 11 PLs e a deputada Érica Malunguinho (PSOL-SP) com 10 PLs.
Até o final de 2024, já tínhamos protocolado mais de 20 projetos de lei com temática LGBTI, sendo que destes, dois já viraram lei estadual. Dentre os PLs propostos, seis deles foram feitos especificamente para a comunidade trans: Empregabilidade Trans (PL 812/2019), Nome Social nas Lápides (PL 1287/2019), Enfermarias Trans (PL 1872/2020), Averbação Gratuita (PL 2600/2020), Direito ao Uso do Banheiro (PL 2601/2020), Nome Social nas Instituições de Ensino (PL 3720/2021), Dia da Memória Trans (PL 2635/2023) e Reserva de Vagas em Concurso Público (PL 2656/2023).
Entre as iniciativas propostas por nossa mandata, estão projetos que tratam diretamente da empregabilidade da população trans. A inserção no mercado de trabalho é um dos maiores desafios enfrentados por essa comunidade. Esse cenário revela a urgência de políticas públicas que incentivem a contratação de pessoas trans e promovam ambientes de trabalho inclusivos. Não por acaso, nosso primeiro projeto de lei LGBTI foi o da Empregabilidade Trans, pois já era uma promessa nossa de campanha desde 2018, por entendermos que não tem como falar da dignidade das pessoas trans sem tratar desse assunto.
Em pesquisa realizada em 2022 pelo projeto TransVida/RJ (3), apenas 15% das pessoas trans pesquisadas possuíam carteira assinada. Mais da metade (51%) não tinham o ensino médio completo, sendo que 96,2% das empresas só contratam pessoas que tenham pelo menos concluído o ensino médio.
A pesquisa aponta ainda que 14,3% ainda viviam da prostituição. E embora a prostituição seja uma profissão digna e honesta como qualquer outra, remunerando às vezes bem mais que muitos empregos formais precarizados, 57% das pessoas trans assassinadas no ano passado, eram profissionais do sexo, revelando um lado perverso da transfobia e da putofobia, conforme o Dossiê ANTRA 2024 (4).
E falando sobre os empregos formais precarizados, é importante divulgar e ressaltar aqui a atuação de dois parlamentares do nosso partido, o vereador Rick Azevedo (PSOL-RJ) e a deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), que têm denunciado desde 2023 a extenuante escala 6×1. Eles propõem uma jornada de quatro dias por semana e três de descanso, para que nós trabalhadoras e trabalhadores tenhamos vida além do trabalho.
O debate sobre a visibilidade trans não pode se limitar a uma data no calendário. É fundamental que ele se traduza em ações concretas, que promovam a inclusão e a cidadania plena. Projetos como os da nossa mandata são uma prova de que há caminhos possíveis para transformar a realidade da população trans no Brasil.
Mas essa transformação só será possível se caminharmos juntas, juntes e juntos, ouvindo as vozes trans e garantindo que suas demandas se transformem em políticas públicas efetivas. Afinal, visibilidade é apenas o primeiro passo para a construção de uma cidadania plena e de uma sociedade onde todas as pessoas possam viver com dignidade.
Desde o início da nossa mandata fizemos questão de empregar pessoas trans por entendermos que a política com afeto, mais que uma fala retórica, é uma prática diária que se concretiza no combate diuturno das injustiças e dos preconceitos que impedem pessoas trans de viverem suas vidas com dignidade e plenitude de direitos.
Visibilidade trans já! Abaixo a escala 6×1 e pela dignidade das pessoas trans no trabalho!
Théo Silveira, pessoa trans masculina, Formado em Gestão Ambiental, graduando em Serviço Social e pós-graduando em Gestão Pública. Diretor de Pessoas Trans da ABGLT, filiado ao IBRAT e FONATRANS. Fundador do Grupo Arraial Free e Fórum LGBTI+ da Baixada Litorânea, coordenador do Centro de Centro de Cidadania LGBTI+ da Baixada Litorânea e assessor parlamentar da Deputada Renata Souza.
Maiara Fafini, travesti, psicóloga, assessora da Deputada Renata Souza.
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REFERÊNCIAS
(1) GÊNERO NÚMERO MIDIA. PSOL é o partido com mais projetos de lei pró-LGBTQIA+. 2023.
(3) AGÊNCIA BRASIL. Pesquisa descreve barreiras para acesso de pessoas trans ao emprego.