Único atleta da equipe de refugiados que mora no Brasil, essa é a segunda vez que Popole participa de uma olimpíada

Foto: Alex Ferro / Rio2016

Por Monique Vasconcelos para a cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube

Fã de samba e apaixonado por açaí, quem vê até pensa que o judoca Popole Misenga é nascido aqui no Brasil. O atleta de 29 anos, natural da República Democrática do Congo, vive em terras brasileiras desde 2013, ano em que pediu asilo após competir pela equipe congolesa o Campeonato Mundial de Judô do Rio. Popole atualmente faz parte da Equipe de Refugiados, por onde compete os Jogos Olímpicos pela segunda vez (o primeiro foi na Rio 2016), sendo o único atleta do time que reside no Brasil.

“Significa muito para mim poder representar todos os refugiados do mundo em uma plataforma esportiva internacional. Me dá força no tatame representar as milhões de pessoas que tiveram de deixar seus lares, seus países. O judô me salvou”, disse Popole Misenga em entrevista oficial.

A decisão de morar no Brasil se deu por vários motivos. Misenga contou que os treinadores da seleção congolesa prendiam os judocas no hotel e usavam a verba deles para fazer turismo no Rio de Janeiro nas Olimpíadas de 2016, e que na África os técnicos deixavam os esportistas com fome e os trancavam em gaiolas quando estes não tinham um bom desempenho nas competições. Com medo de represálias e em busca de liberdade, Popole não viu outra alternativa a não ser fincar suas raízes no Brasil e ter uma vida nova.

Depois de desertarem, o judoca e a companheira de seleção Yolande Mabika vagaram pelas ruas do Rio de Janeiro por alguns dias. A incomunicabilidade dificultava a situação, já que eles só falavam francês. Até que conheceram um angolano que os levou para a Cáritas, entidade católica que presta auxílio a refugiados, e passaram a morar em Brás de Pina, um bairro da zona Norte do Rio onde vivem muitos africanos.

Tempos depois, Popole foi acolhido pelo Instituto Reação, criado pelo ex-judoca Flávio Canto, onde treina até hoje. Geraldo Bernardes, treinador que formou, além de Flávio, a campeã olímpica Rafaela Silva, se tornou o responsável pelos treinamentos do judoca.

Foto: Showkat Shafi / Al Jazeera

Em setembro de 2014, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) concedeu oficialmente o status de refugiado a Popole. Depois disso, o judoca se reconstruiu: casou e teve filhos com uma brasileira e cresceu ainda mais na carreira.

Focado, o lutador não bebe, não fuma e treina todos os dias. Todo esse esforço e capacidade de se adaptar a situações difíceis contribuíram para Popole chegar aonde chegou. Antes mesmo de vir para o Brasil, em 2010, mesmo com todas as dificuldades enfrentadas, foi bronze no Campeonato Africano Sub-20. Já na Rio 2016, chegou aos melhores 16 da categoria -90kg do judô, apenas perdendo para o campeão mundial Gwak Dong-han. Nas Olimpíadas do Japão a expetativa é grande para um bom resultado.

Refugiado no próprio país

Popole Misenga enfrentou situações difíceis desde muito cedo. A cidade de nascimento do atleta, Bokavu, faz fronteira com a Ruanda, e é uma área gravemente afetada pela Segunda Guerra do Congo, que matou seis milhões de pessoas e deixou 500 mil refugiados. Quando tinha nove anos sua mãe foi assassinada e Misenga fugiu para uma floresta, vagando por oito dias, até ser encontrado e levado de barco para a capital Kinshasa.

Na capital, Popole viveu na rua e começou a praticar judô em uma ONG. Escolheu a modalidade por causa da disciplina exigida, pois queria ter uma boa educação. O que ele não imaginava era que uma simples brincadeira fosse se tornar sua profissão e grande paixão.

Equipe de Refugiados cresceu

Depois de contar com dez atletas na Rio 2016, a equipe de refugiados quase triplicou para os Jogos de Tóquio. Serão 29 competidores de 11 países e 12 modalidades, que vivem e treinam em 13 nações. São atletas que representam 26 milhões de refugiados em todo o mundo, pessoas que foram forçadas a deixar seus países por causa de guerras, violações de direitos humanos e perseguições.

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