Diferença entre premiações dos atletas e paratletas é gritante e reflete desvalorização das pessoas com deficiência

Sugestão de imagem: Foto com as três medalhas das Paralimpíadas de Tóquio (ouro, prata e bronze) sobre uma mesa com fundo preto.

Foto: Comitê Paralímpico Internacional

Por Saulo Miguez e Natalia Rohn

Nas últimas três edições dos Jogos Paralímpicos, o Brasil figurou entre os dez países mais bem colocados do quadro de medalhas. A expectativa geral é que esse bom desempenho se repita em Tóquio e que o hino nacional brasileiro seja ouvido muitas vezes nos próximos dias na capital japonesa.

Tudo isso é fruto do investimento que vem sendo feito no paradesporto brasileiro, mas principalmente uma decorrência da dedicação desses atletas que superam adversários e os próprios limites para terminar a competição com lágrimas nos olhos, um sorriso no rosto e uma medalha no peito.

É uma pena, no entanto, que monetariamente as conquistas paralímpicas valham muito menos que os feitos dos atletas sem deficiência. Para se ter uma ideia, os medalhistas de ouro em provas individuais nos Jogos de Tóquio receberão R$ 160 mil por conquista, valor bastante inferior aos R$ 250 mil que os brasileiros sem deficiência embolsaram junto com a medalha olímpica dourada.

Na mesma linha de dois pesos e duas medidas, os medalhistas de prata das Olimpíadas de Tóquio ganharam R$ 150 mil, contra R$ 64 mil dos paratletas. Enquanto cada bronze olímpico valeu R$ 100 mil, praticamente o triplo dos R$ 32 mil pagos nas Paralimpíadas.

Em modalidades coletivas, o cenário é semelhante. Nas Olimpíadas, equipes com até seis atletas receberam R$ 500 mil (ouro), R$ 300 mil (prata) e R$ 200 mil (bronze). Times maiores, como o futebol, as premiações foram de R$ 750 mil (ouro), R$ 450 mil (prata) e R$ 300 mil (bronze).

Já nas Paralimpíadas, o ouro em modalidades por equipes, revezamentos e em pares valerá R$ 80 mil por atleta. A prata será bonificada com R$ 32 mil e o bronze, com R$ 16 mil. Demais integrantes das disputas, atletas-guia, calheiros, pilotos e timoneiro, receberão 20% da maior medalha conquistada por seu atleta e 10% a cada pódio a mais do valor da medalha seguinte.

Outros países, como o próprio Japão, que sedia os Jogos, mantêm o critério pagando cerca de US$ 18.200 a menos aos campeões paralímpicos. Países como o Canadá e a Austrália sequer remuneram seus atletas por pódios paralímpicos. Embora a diversidade seja lema nas Olímpiadas, a pouca visibilidade e falta de apoio financeiro prevalecem.

Em contrapartida, nas Paralímpiadas de Tóquio os esportistas estadunidenses receberão pela primeira vez o mesmo prêmio em dinheiro, no valor US$ 37.500,  que os americanos vencedores nas Olimpíadas.

Assim no pódio como na vida

A desvalorização do paratleta apenas reflete a vida dessa fatia da população composta, segundo dados do IBGE, por cerca de 45 milhões de brasileiros e brasileiras, o que representa praticamente 1/4 de toda a nossa população. Para se ter uma ideia, de acordo com a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), apenas pouco mais 403 mil PCDs estão empregados, ou menos de 1% do total.

Um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) demonstra que esse quadro é visto também em outros países, uma vez que as taxas de emprego para essas pessoas são menores em 53% para homens e em 20% mulheres, em comparação às pessoas sem deficiência.

Esporte como (única) opção

Essa realidade talvez explique a procura das pessoas com deficiência brasileiras pelo esporte enquanto meio de vida. Apesar da discrepância nas premiações, profissionalizar-se no paradesporto ainda é uma opção de sobrevivência com dignidade e respeito.

O Brasil é uma verdadeira potência paralímpica e repleta de talentos, não por acaso que estamos com 260 representantes em Tóquio e prestes a alcançarmos nossa 100ª medalha de ouro na história dos Jogos Paralímpicos. Porém, a falta de visibilidade e apoio financeiro deixam evidente a desvalorização do paradesporto.

Conforme descrito em matéria da Globo Esporte, assinada por Guilherme Costa, o esporte desponta como uma ferramenta de transformação para quem, por uma diferença intelectual ou física, não tem vez na sociedade. E o Brasil, pagando menos a quem merece, utiliza isso a seu favor para se promover em grandes eventos como as Paralimpíadas.

Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube

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