Segundo levantamento do Senado, cerca de 1/3 dos paratletas desistem por não encontrarem apoio

Bola vermelha sobre calha de bocha paralímpica. A bola está prestes a rolar sobre a calha e correr sobre quadra de taco.

Foto: Romeu Melo

Por Amanda Alether e Saulo Miguez

Às vésperas dos Jogos Paralímpicos do Rio, em 2016, o Instituto DataSenado, em parceria com o gabinete do senador Romário, realizou uma pesquisa para ouvir a opinião de paratletas e ex-paratletas sobre incentivo, mobilidade, preconceito social e preparo para a Paralimpíada.

Na ocasião, 83% dos entrevistados consideravam os investimentos insuficientes no Brasil. Para 62% dos paratletas era difícil obter patrocínios e apoio financeiro. Cerca de 1/3 dos paratletas aposentados entrevistados alegaram a falta de patrocínio como principal motivo de abandono do esporte.

Cerca de um ano e meio após os Jogos do Rio, quando o Brasil já se preparava para um novo ciclo paralímpico, outro levantamento do Senado revelou que a situação em relação aos investimentos no paradesporto não havia melhorado. Pelo contrário: dessa vez 88% dos entrevistados consideravam insuficientes os aportes financeiros.

O fato do paradesporto ser praticado por pessoas com deficiência não significa que ele custe menos. Ao invés disso, costuma ser ainda mais caro, uma vez que a prática costuma exigir equipamentos especiais, como próteses e cadeiras, além de incrementos logísticos devido às adaptações necessárias nos centros de treinamento e presença de profissionais especializados, a exemplo dos atletas-guias nas corridas de cegos.

A título de curiosidade, em 2015 o portal WebRun fez uma estimativa de investimento de cerca de R$ 132 mil – só de equipamento – para um praticante de atletismo biamputado poder treinar e competir em alto nível. Isso sem considerar o custo com manutenção das próteses de membros inferiores.

O ritmo de investimento, no entanto, quando comparamos as realidades dos esportistas com e sem deficiência é bastante desigual. O Governo Federal, maior patrocinador do esporte olímpico e paralímpico no país, destinou em 2020, através da Lei das Loterias, R$ 292,5 milhões ao Comitê Olímpico e apenas R$ 163,1 milhões ao Paralímpico.

Para além dos recursos públicos, o COB hoje conta com quatro grandes empresas na lista de patrocinadores oficiais, enquanto o CPB tem apenas uma, além de uma outra companhia que patrocina o Paratletismo. Na relação de apoiadores e parceiros também encontramos mais nomes na lista do COB.

A calha da bocha

Atleta da bocha paralímpica na classe BC3 – categoria destinada à pessoas com alto comprometimento motor – Thulio Santos conversou um pouco com a NINJA Esporte Clube a respeito dos custos e investimentos no paradesporto. A classe BC3 permite que os esportistas usem uma calha para fazer o arremesso das bolas e, para ter melhor rendimento em quadra, muitos atletas optam pela compra do equipamento, que custa caro.

“A calha coreana, que é a melhor, custa em média US$ 3.500, que vai dar uns R$ 16 mil. No Brasil, há fabricantes de calhas pelo valor de R$ 3.500. Além disso, tem o custeio das bolas, que saem entre R$ 60 e R$ 70 cada”, informou.

Segundo ele, a qualidade do material influencia muito no treinamento e na estratégia de jogo, sobretudo no BC3. “Diria que no BC3 a qualidade do equipamento afeta em até 90% o desempenho. Nas outras categorias, isso também ocorre, mas com menor intensidade”.


Além do equipamento especial, os atletas contam com o apoio de um auxiliar desportivo (calheiro) para manejar o material da forma que o esportista pedir. É necessário ainda um equipamento reserva, pois, nas competições oficiais, todo material é aferido antes de entrar em quadra e se, porventura, este não passar no teste, o atleta pode ser punido.

Thulio começou na bocha no final de 2015 a convite de um grande nome do esporte, Antonio Leme, o Tó – medalhista paralímpico de ouro, na Rio 2016. “Ele [o Tó] estava treinando sozinho e estava na expectativa de ir para as Paralimpíadas do Rio. Ele e o calheiro queriam alguém para treinar junto”, disse.

No início da carreira, Thulio não teve qualquer apoio e acabou custeando os gastos no esporte com recursos próprios, ou herdando os equipamentos do amigo. Em 2017, entrou para a Associação das Pessoas Portadoras de Deficiência (APPD) de São José dos Campos (SP), mas continuou sem patrocínio.

Somente em 2019, conseguiu uma bolsa através da Lei de Incentivo Fiscal (LIF), após ser contemplado em um edital e com esse dinheiro comprou a calha. Em 2020, foi novamente contemplado e assim pretende seguir custeando suas despesas de treinamento. Além disso, tem contado também com alguns patrocínios particulares.

Ele conta que a equipe também recebe patrocínio através da LIF e, graças a esse recurso, foi possível adquirir uniforme padronizado, transporte mais adequado, dentre outras coisas coisas que tornam mais profissionais as condições de treinamento e fortalecem o time.

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