A dura realidade dos atletas que buscam alternativas para driblar a falta de investimentos no caminho ao pódio olímpico

Foto: Aleksandra Szmigiel/Reuters

Por Luiza Diniz

Na reta final dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, novamente a pauta sobre patrocínio volta aos holofotes. Ocupando, até o momento, a 16ª posição no ranking de medalhas com 4 ouros, 4 pratas e 8 bronzes, o Brasil vem assumindo a liderança em uma outra disputa, que não é motivo de orgulho: a falta de incentivo e condições para os atletas que compõem sua delegação. Com 309 representantes nas Olimpíadas, os números divulgados recentemente em um levantamento feito pelo Globo Esporte, mostram a realidade enfrentada pelos esportistas no percurso até o Japão. De permutas a vaquinhas, os atletas buscam diariamente uma forma de alcançar o sonho olímpico. E nesse caminho, as pedras formam uma montanha que dificulta a passagem dos nossos heróis até o pódio.

Talento não falta. Já incentivo…

Durante a pandemia, os atletas tiveram que adaptar sua preparação para Tóquio 2020, respeitando as recomendações da Organização Mundial de Saúde. Com academias, piscinas, pistas e centros de treinamentos fechados, as rotinas de treino tiveram que ser alteradas até a melhora do cenário no país. Diante do impacto na economia, diversas empresas e clubes retiraram seus patrocínios, tornando a realidade de alguns esportistas ainda mais precária. Como no caso de Jefferson Carvalho dos Santos, atleta do decatlon, que foi demitido em janeiro deste ano do Esporte Clube Pinheiros, que lhe garantia uma renda em torno de mil reais por mês. Para conseguir não só custear seus treinos, mas também sobreviver, Santos assumiu uma outra função em seu tempo livre.

“Em vez de treinar em dois períodos e descansar no terceiro para me recuperar para o dia seguinte, eu faço todos os treinos pela manhã; à tarde e à noite eu trabalho como motorista de aplicativo”, disse Jefferson em entrevista à Veja SP

Apesar do esforço, o brasileiro não conseguiu se classificar para a disputa olímpica. Porém, o cenário vivido por aqueles que garantiram uma vaga nos Jogos, não é muito distante disso. 42% dos brasileiros em Tóquio não possuem patrocínio e precisam recorrer a vaquinhas para arrecadar dinheiro ou conciliar o esporte com outros empregos.

Thiago Braz, campeão olímpico do salto com vara no Rio 2016 e medalhista de bronze no Japão, é um dos 131 atletas da delegação que vivenciam essa realidade. Sem patrocínio desde as Olimpíadas do Rio 2016, o saltador, que ganhou o bronze na terça-feira (3), frisou em seu discurso as dificuldades enfrentadas pela falta de recursos financeiros e agradeceu o apoio de Neymar. “Sem esses apoiadores, eu não teria chegado onde cheguei”, completou.

REUTERS/Amr Abdallah Dalsh

Um clamor por mudanças

Na tentativa de minimizar a rotina sofrida e cheia de obstáculos desses desportistas, foi criado em 2005 o Bolsa Atleta, programa de patrocínio esportivo do Governo Federal que garante aos inscritos uma renda mensal durante um período pré estabelecido. Os incentivos são divididos em seis categorias com valores diferentes: atleta de base, estudantil, nacional, internacional, olímpico/paralímpico e pódio.

De acordo com os dados da pesquisa feita pelo Globo Esporte, 231 atletas que estão representando o Brasil nos Jogos, recebem esse benefício. Sendo 87 com a Bolsa Pódio (5 a 15 mil reais), 61 com a Bolsa Olímpica (3.100 reais), 59 com a Bolsa Internacional (1.850 reais) e 24 com a Bolsa Nacional (925 reais). Hebert Conceição é um dos contemplados pelo projeto. O lutador baiano de 23 anos, vem fazendo história no boxe e irá disputar a medalha de ouro no sábado (7) contra o ucraniano Oleksandr Khyzhniak.

“ Eu sou medalhista olímpico, c…! eu mereço pra c…! Nós trabalhamos pra c…, p…!” Do Oiapoque ao Chuí eu estou aqui representando, é Brasil p…!”, celebrou o atleta após garantir sua vaga na final olímpica.

Porém, com atrasos nos pagamentos das parcelas e o corte de 20% no orçamento do projeto, a escassez de recursos segue sendo um desafio na trajetória dos brilhantes representantes do nosso país no esporte.

Apesar da falta de estrutura e de patrocínios, a delegação brasileira nos Jogos de Tóquio 2020 possui 31 medalhistas olímpicos divididos em dez modalidades, um feito extraordinário levando em consideração as condições enfrentadas.

É preciso olhar com mais cuidado para os esportistas brasileiros e cessar a romantização da superação acima de tudo, quando na verdade o que existe é descaso. Os atletas precisam urgentemente de apoio e condições básicas para exercerem sua profissão, para que seus talentos sejam reconhecidos no lugar mais alto do pódio.

Texto produzido em cobertura colaborativa da NINJA Esporte Clube

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