Até o momento, três votos foram proferidos no sentido de não considerar mais crime o porte de maconha para uso pessoal

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O Supremo Tribunal Federal (STF) irá retomar o julgamento sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. A análise será retomada com o voto do ministro Alexandre de Moraes, na próxima quarta-feira (24).

O caso de um homem preso, sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes, possui o termo técnico de  “repercussão geral reconhecida”, o que significa que o entendimento estabelecido pelo STF nesse julgamento servirá como referência para casos semelhantes em todo o país, e terá efeitos imediatos.

Até o momento, três votos foram proferidos no sentido de não considerar mais crime o porte de maconha para uso pessoal. Desde o início do julgamento, em 2015, os ministros Gilmar Mendes, que defendeu a aplicação da medida a todas as drogas, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, que restringiram seus posicionamentos ao uso da maconha, votaram nessa direção.

O recurso em questão foi apresentado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em favor de Francisco Benedito de Souza. Em 2010, ele foi condenado a cumprir dois meses de serviços comunitários após ser flagrado com três gramas de maconha dentro de sua cela no Centro de Detenção Provisória de Diadema (SP).

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Três gramas?

O STF vai determinar se efetuar mais uma prisão por conta de três gramas (pouca quantidade) viola os princípios constitucionais da intimidade e da vida privada, explica a Defensoria Pública.

O julgamento gira em torno do artigo 28 da Lei de Drogas, que prevê penas para quem “adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal”.

Não só o artigo 28 é criticado por organizações de direitos humanos, como também toda a Lei de Drogas.

Um terço das prisões no Brasil está relacionado ao tráfico de entorpecentes. Parte desse contingente é de usuários, apanhados com pequena quantidade de drogas, mas apontados como traficantes pela polícia. A lei não prevê prisão para quem porta entorpecentes para consumo próprio, mas, como não são fixados critérios claros para diferenciar o uso do tráfico, a decisão fica por conta do policial da ocasião —e muitos usuários acabam na prisão como se fossem traficantes.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) manifestou-se pela constitucionalidade desse artigo e pela criminalização do porte de drogas para consumo próprio.

A PGR argumentou que a Lei de Drogas aboliu a pena de prisão para usuários flagrados com entorpecentes e reconheceu a necessidade de proporcionar ao usuário um tratamento preventivo e terapêutico, mas ressaltou que o Congresso Nacional optou por “manter como crime o porte ou posse de drogas para uso pessoal”, o que gerou uma grande confusão.

Juristas defendem mudança de interpretação da Lei de Drogas

Existem centenas de organizações, coletivos, associações e movimentos organizados na sociedade civil para oferecer uma nova abordagem sobre a política de drogas.

Dois ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Marcelo Ribeiro Dantas e Rogerio Schietti, escreveram uma carta endereçada ao presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT), que também é assinada pelo médico Dráuzio Varela.

Em 2019, o grupo apresentou um anteprojeto de lei à Câmara dos Deputados, que fixa um critério quantitativo de dez doses individuais para separar o usuário do traficante de drogas. Os quantitativos correspondentes a cada dose ficarão a critério do Poder Executivo, mas a lei já adianta algumas medidas, como no caso de maconha, cocaína e outras para evitar que a demora na regulação postergue os efeitos da lei.

Com isso, espera-se reduzir o número de presos e, em especial, de presas. O Brasil alcançou a triste marca de 42 mil detentas (60% por tráfico de drogas), sendo que 74% delas são mães.

“Pune-se a mulher e pune-se a criança, reservando a ambas um lamentável futuro, também nos braços de facções criminosas, sedentas pelos futuros soldados que perpetuarão seu empreendimento”, afirma o documento assinado pelos juristas.

O Brasil deverá chegar em breve à triste marca de 1 milhão de presos, o terceiro país que mais encarcera no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China, de acordo com um relatório da Anistia Internacional.