A América Latina que rompe fronteiras e ninguém segura. Residente canta o que questiona, fala sobre revolução inteligente e manda mensagem para um Brasil inquieto em ano eleitoral

Por Diorela Kelles / Mídia NINJA

“Olha, antes de começar essa música, eu tenho que falar uma coisa para vocês: Eu sou contra a guerra, mas sou a favor da resistência. Resistência para defender-se dos que te atacam”, assim apresentava sua obra ‘Guerra’ durante concerto na França, René Pérez Joglar, ou Residente, como é conhecido o músico, rapper e compositor mais popular da América Latina, que junto com seus irmãos formava o grupo Calle 13 e hoje segue carreira independente.

Este é um artista que o Brasil poderia criar mais oportunidades para conhecer. Não apenas por ser o maior vencedor de Grammys latinos, mas também por ele traduzir em música e palavras coisas que nós brasileiros, se ainda não aprendemos, precisamos escutar.

“Yo estoy aquí para contarte lo que no cuentam los periódicos”, trecho de Calma Pueblo.

Nascido em Porto Rico, território não incorporado dos Estados Unidos, René fala abertamente sobre seu anelo de ver seu país livre. Nessa toada ele canta sobre a força da América Latina unida, sobre a ignorância das fronteiras e do racismo, questiona o mercado fonográfico, o mercado de trabalho, a edição dos noticiários, a forma como a política e a religião se fazem, mas não canta apenas o erro. “É muito fácil estar contra tudo e não fazer nada, o trabalho difícil é ser honesto com o que te rodeia e te afeta. Eu não estou contra nada, apenas sou honesto com o que me afeta”, e explica uma estratégia: “Temos que aprender a manter um balanço. Tenho temas fortes como a guerra, a indústria bélica e temas como sexo e amor. Sempre mantenho um balanço para que não possam me rotular em nada. Eu utilizo tudo que tenho ao meu redor para passar uma mensagem”. Se ser ninja é saber reverter as armas do inimigo ao seu favor, este artista é um ninja. Aliás, é o que ele diz na música “Calma Pueblo” (Calma, povo, em tradução livre):

Todo lo que les digo, es como el Aikido
Uso a mi favor la fuerza del enemigo

Ahora quítate el traje, falda y camiseta
Despójate de prendas, marcas, etiquetas
Pa’ cambiar al mundo, denuda tu coraje
La honestidad no tiene ropa ni maquillaje

Residente reforça a importância de conseguir se comunicar com todos de forma democrática. Em sua turnê pela Europa ele fala em inglês e espanhol durante os shows, ainda que grande parte do público responda que, sim, que compreende espanhol. “Se uma só pessoa nesta sala não entende Espanhol, eu vou falar em outra língua, porque quero que me entenda, é o que me interessa”. Na entrevista que nos concedeu, falou da importância de se tornar um artista acessível, ainda que questionador, “Se você fica em apenas um grupo onde todos pensam como você, não está fazendo um bom trabalho”, completa.

Num mundo onde as fronteiras são artificiais e a ignorância é real, Residente usa sua voz para esclarecer: “Ninguém é ilegal”, proclama em seu concerto, “Somos todos residentes deste planeta”. Para seu novo projeto musical, ele fez um teste de DNA que indicava suas origens, de onde tirou diversas inspirações musicais. “Todos temos sangue africano, sangue asiático, origens de todas as partes, o racismo é uma ignorância”, explica ao público europeu, por onde passa sua turnê. E ainda oferece suas músicas “àqueles que se portaram bem com os imigrantes” e diz que são todos bem vindos em seu país.

Quando antes de irmos embora ele pergunta como está o Brasil, dizemos que neste ano de eleição sentíamos falta de gente que nos representasse verdadeiramente. Pois é você, brasileiro, o seu próprio representante, é você que tem que tomar as rédeas desse controle. Então ligamos a câmera e ele nos deixou um recado: “É você que tem que confiar em sua mente e você mesmo provocar o seu câmbio. Assim como se preocupa em comer, em trabalhar, preocupar-se também em ir a uma marcha, fazer alguma militância, todos unidos, isso se pode fazer”. Esta será nossa resistência.