Manifestantes mandam recado: não há garantia de justiça climática sem a valorização e defesa dos direitos humanos

Sociedade civil resiste e protesta em Sharm el-Sheikh durante a COP27 (Mídia Ninja)

 

No dia 9, quarto dia da COP27, ocorreu o primeiro protesto da sociedade civil sobre questões que envolvem a crise climática. Ao tempo em que líderes começam a rodada de negociações, tendo o financiamento climático como assunto principal, ativistas se reuniram na entrada da Zona Azul, à qual só tem acesso quem tem crachá. É lá que fica o plenário, salas de negociações, espaço de eventos e pavilhões dos países e organizações.

Eles protestaram pelo fim do financiamento dos combustíveis fósseis e investimento em projetos de energia renovável. Além, é claro, da compensação dos países ricos aos pobres, pelo agravamento da crise climática.

Na quinta-feira (10), um novo protesto. O dia começou com manifestação de ativistas pela justiça climática, da Ásia, África e Américas, no pátio da Zona Azul. Eles se mobilizaram rapidamente ao saber que mais de 600 lobistas do setor de combustíveis fósseis participam do evento. Os manifestantes exigiam que eles fossem expulsos da COP27. Eles reclamaram ainda, que em evento que se luta pelo fim do uso dos combustíveis fósseis, o grupo é muito maior que qualquer delegação nacional. Só perde para do Emirados Árabes, com mais de 1 mil pessoas. A segunda maior delegação deste ano é a brasileira, com 574 representantes.

A ativista Greta Thunberg publicou em suas redes ao saber do grupo de lobistas do petróleo e gás: “se você quer combater a malária, não convide os mosquitos”. Sua ausência foi sentida. Ela disse que não participará da cúpula, para ela, uma COP “greenwashing”.

“As COPs são usadas principalmente como uma oportunidade para líderes e pessoas no poder chamarem a atenção, usando muitos tipos diferentes de greenwashing”, disse me coletiva de imprensa do lançamento do seu livro, “The Climate Book”.

Direitos Humanos

Para este mesmo dia, havia um chamado para que as pessoas vestissem branco, em memória de defensores do meio ambiente e direitos humanos mortos e em solidariedade aos que são criminalizados em todo o mundo. A brasileira Mariele Franco também foi lembrada.

Foi o diretor executivo da Iniciativa Egípcia pelos Direitos Pessoais, Hossam Bahgat, que pediu aos participantes da COP para usarem branco. A ação se estendeu às redes sociais, como o Twitter e Instagram, em que posts foram compartilhados com a hashtag #FreeThemAll.

Na roupa, um alerta: “a enchente está chegando” (Mídia Ninja)

Veganos protestaram na entrada da Zona Azul (Mídia Ninja)

Em outro momento, uma mulher transitava por espaços da COP27 com uma roupa que trazia um alerta: “a enchente está chegando”. Também teve protesto de grupo de veganos, realizado por organizações em defesa dos animais. Eles alertaram também, que a produção de carne afeta sobremaneira o aquecimento global.

Jovens protestaram contra o uso de combustíveis fósseis (Mídia Ninja)

Já nesta sexta-feira (11), dia de “Greve pelo Clima” do movimento Fridays For Future internacional, manifestantes protestaram contra petrolíferas, lobistas que defendem o uso de combustíveis fósseis e pediram por financiamento climático, para compensação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Desta ação participaram bravos ativistas, como Vanessa Nakate e Paciência Nabukalu, de Uganda; Sofia Gutierrez, da Colômbia; Nicki Becker, da Argentina e Disha Ravi, da Índia.

Em outro momento, um grupo de médicos, farmacêuticos e enfermeiros, além de cientistas do mundo todo, alertaram que as mudanças climáticas ameaçam a vida humana de outras maneiras, principalmente, por meio da poluição do ar.

Biden foi alvo de protesto: grupo de ativistas estendeu faixa: “pessoas x combustíveis” (Mídia Ninja)

E até mesmo Joe Biden foi alvo de manifestação. Nesta sexta-feira (11) discursou na COP, falando sobre os impactos das mudanças climáticas. “Estou aqui como presidente dos Estados Unidos da América e dizer com confiança que os Estados Unidos da América cumprirão suas metas de emissões até 2030”, disse. Um grupo de ativistas falaram palavras de ordem e estenderam uma faixa que dizia “pessoas x combustíveis fósseis”.

Na luta pela liberdade de se manifestar

Os manifestantes têm se recusado a usar a área oficial para protesto, designada pelo governo, que fica no deserto. Também batem o pé ao afirmar que não vão para a área oficial de ativismo, a Zona Verde. Esta é metade parque temático e metade espaço de exposições corporativas, além de ficar a 25 minutos da Zona Azul. Ora, se o objetivo é chamar a atenção dos chefes de Estado, eles preferem interpela-los em lugares estratégicos.

Na entrada e dentro do pavilhão da COP27, segundo entidades, ainda estão permitidas manifestações de cunho político. Isso porque o local onde ocorre uma conferência climática se torna uma zona extraterritorial sob responsabilidade da Organização das Nações Unidas, realizadora da COP.

De acordo com o pesquisador da Anistia Internacional no Egito e Líbia, Hussein Baoumi, manifestante só “pode protestar apenas em área distante da COP, apenas das 10h às 5h e as autoridades devem ser informadas com 36 horas de antecedência”. E só pode ser se estiver relacionado com o clima.

Presidente do Egito Abdul Fatah Khalil Al-Sisi na cerimônia de abertura da COP27 (Mídia Ninja)

A próxima cúpula climática da ONU, COP28, será realizada nos Emirados Árabes Unidos em novembro de 2023. Mas um dos recados desta COP está bem claro: não há garantia de justiça climática sem a valorização e defesa dos direitos humanos.