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Era início da tarde de quarta-feira, 31 de outubro. A professora Cássia Maria do Couto estava no corredor do Colégio Estadual Nilo Peçanha, em Campos dos Goytacazes, RJ, a caminho da sala de aula, quando postou uma selfie. Ela vestia uma camisa com a foto do ex-presidente Lula e, em protesto contra o Escola Sem Partido, que nada mais é do que a um projeto de censura na escola, escreveu que estava indo “doutrinar uns alunos”.

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Terminou a aula de matemática para o sexto ano e seguiu com a rotina do trabalho. À noite, quando estava dando aula em outra escola, recebeu pelo Messenger uma mensagem agressiva. Foi quando a professora viu que seu post tinha viralizado. Houve muitas reações de pessoas que compreenderam a ironia, mas chegaram também os discursos de ódio. No dia seguinte, um site de notícias da cidade estampou a manchete: “Professora de Campos é acusada de tentar ‘doutrinar’ alunos com ideologias partidárias”. O caso ganhou repercussão e a professora se sentiu ameaçada. Nesta segunda-feira, 5, Cássia vai à delegacia de polícia registrar ocorrência.

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A professora, que leciona na rede pública estadual há 28 anos, tem recebido dezenas de mensagens de apoio. Ganhou até uma charge, feita por Pedro Otávio Cavalcante, formado em história pela UFF Niterói, que criou a hashtag Somos Todos Cassinha. Graduada em matemática pela UFF e pós-graduada em novas tecnologias no ensino pela mesma instituição, Cássia também dá aulas no Colégio Estadual Raimundo de Magalhães, em Barcelos, distrito de São João da Barra.

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No Facebook, ainda na quinta-feira, Cássia agradeceu o apoio e falou da indignação com as mensagens de ódio:

“Agradeço a todos pela mensagem de carinho e apoio que tenho recebido durante o dia inteiro. São alunos, colegas de trabalho, estudantes universitários e pessoas que abraçam a nossa dor. Todos que me conhecem sabem o quanto eu levo a minha profissão a sério e o quanto amo o que faço. Tanto que eu já poderia estar aposentada. Ontem, ao fazer uma foto com total ironia, pois eu estava indo para dar aula numa turma de sexto ano, eu brinquei falando que ia doutrinar os alunos. Como, se com quarenta alunos, com a média de idade de 12 anos, a gente mal tem tempo pra dar o conteúdo e fazer a chamada?

O que seria doutrinar alunos de 11 e 12 anos? Como conversar política com eles? Eu juro que não tenho esse poder. Infelizmente, pessoas de má fé usaram a minha postagem para incentivar o ódio e me ofender.

Pessoas essas que não me conhecem e conhecem muito menos o meu trabalho. Estou me sentindo ameaçada. E como não bastasse, um jornal da região, que em momento algum procurou saber a verdade, publicou uma matéria dizendo que eu ameaçava os alunos. A palavra foi exatamente essa: ameaçava. Eu gostaria de saber quem são esses alunos e quando foi isso.

Nós professores estamos reféns?

Nunca pensei que um dia eu teria medo de postar. Termino agradecendo todas as mensagens de carinho e pedindo a Deus que não deixe o medo me paralisar”.