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O levantamento ressalta a importância de revisar os instrumentos tributários relativos ao agronegócio, colocando-os a serviço de outros resultados e estratégias, como o combate à fome e redução da inflação dos alimentos.

A política tributária do país é altamente benéfica à cadeia produtiva da soja. No nível federal, a renúncia fiscal estimada para produção dessa commodity foi de R$57 bilhões em 2022, o dobro da desoneração prevista para os produtos da cesta básica. Esta é uma das conclusões que constam em estudo elaborado em parceria pela ACT Promoção da Saúde, Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) que mapeou e calculou o custo tributário do país com a cadeia da soja, visando a discussão da reforma tributária.

Analisando a renúncia fiscal no âmbito dos estados, a desoneração do ICMS da soja é de quase R$8 bilhões por ano apenas em Mato Grosso. “É seguro supor que outros estados produtores têm níveis de desoneração semelhantes, o que permite estimar que a desoneração dos estados pode chegar perto de R$ 25 bilhões, uma vez que Mato Grosso responde por 1/3 da produção nacional”, destaca o relatório.

Em relação ao financiamento das lavouras, dados relativos a 2022 fornecidos pelo Banco Central indicam que, do total de crédito rural para custear as lavouras brasileiras, nada menos que 52% dos recursos foram destinados exclusivamente para o financiamento das lavouras de soja. A título de comparação, cerca de 140 culturas, quase todas de alimentos, tomaram apenas 28% do crédito rural no país. Alimentos básicos e saudáveis da dieta brasileira, como feijão e mandioca, estão praticamente excluídos do crédito rural, acessando apenas volumes insignificantes e insuficientes para ampliar a produção e conter a alta de preços aos consumidores.

O estudo argumenta que a cadeia da soja é o exemplo de uma longa trajetória de ciclos econômicos com grande concentração de renda, enorme impacto ambiental e injustificáveis privilégios. Historicamente, a política tributária, somada a outras políticas públicas, privilegiou a produção do grão em detrimento de outras alternativas necessárias à segurança alimentar da população brasileira, acarretando bilionárias renúncias fiscais e enormes custos ambientais.

Para as organizações envolvidas no levantamento, o Estado brasileiro já cumpriu seu papel em apoiar a estruturação do setor da soja e, com a reforma tributária, tem a oportunidade de repensar prioridades, considerando o enfrentamento à fome com alimentos saudáveis e produzidos de modo sustentável, bem como a necessidade de diversos outros investimentos possíveis a partir destes recursos públicos atualmente destinados ao setor produtivo da soja.

“É necessário revisar os instrumentos tributários, à luz dos desafios atuais, e colocá-los a serviço de outros resultados e estratégias, como o combate à fome, a redução da inflação dos alimentos, o favorecimento aos alimentos básicos e saudáveis e o desestímulo aos alimentos de má qualidade nutricional, como os ultraprocessados, além do fomento a sistemas de produção, beneficiamento e consumo que possam contribuir para a mitigação da crise climática”, sugere o relatório.