A Nasa aponta que mudanças nas condições do Ártico afetam a química e os ecossistemas do oceano (Nasa/Kathrin Hanser)

 

Paloma Dottori de Sá Barreto Kejzelman, para a Cobertura Colaborativa NINJA na COP26

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) está atualmente em seu sexto ciclo de avaliação (AR6) e publicou, no dia 09/08/2021, o 6º relatório de avaliação intitulado de “Mudanças Climáticas 2021: A Base das Ciências Físicas”. O objetivo é fornecer aos formuladores de políticas e tomadores de decisões avaliações científicas sobre a mudança climática, suas implicações, possíveis riscos futuros, bem como propostas e opções de adaptação e mitigação. 

Processo de elaboração dos relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC)

O relatório foi feito a partir da avaliação e consenso da comunidade científica, determinando o estado do conhecimento sobre a mudança do clima. É importante entender que o IPCC como painel  intergovernamental deve ser manter neutro e seus resultados são de extrema relevância no contexto do fortalecimento da resposta global. Portanto, suas conclusões são elementos fundamentais para as negociações internacionais como a que está acontecendo agora a COP26 em Glasgow .

 Imagem: Processo de elaboração dos relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC)

O relatório foi preparado pelo Grupo de Trabalho I (Base da Ciência Física), que examina as ciências físicas que sustentam as mudanças climáticas passadas, presentes e futuras.  Ressalta-se que durante seu processo foi elaborado e revisado em várias etapas, garantindo objetividade e transparência da pesquisa. O AR6 WGI – foi finalizado e aprovado por 234 autores e 195 governos – e é considerado a maior atualização do estado do conhecimento sobre ciência climática nos últimos tempos.

Figura SPM.1: Painel a: Temperatura média global da superfície (sigla em inglês GMST) observada mensalmente muda a linha cinza até 2017, a partir dos dados de HadCRUT4, GISTEMP, Cowtan–Way e NOAA, e aquecimento global antrópico estimado (linha laranja sólida até 2017, com sombreamento laranja indicando uma variação avaliada como provável). A seta tracejada laranja e a barra de erro laranja horizontal demonstram respectivamente a estimativa central e a variação provável de tempo no qual se atinge 1,5°C caso o ritmo atual de aquecimento seja mantido. 

O relatório possui diversas abordagens metodológicas, incluindo aquelas para estimar e contabilizar as emissões antrópicas (explica o que e ) e os impostos dos gases de efeito estufa .  O documento também  explica em como essas mudanças nos levarão a sofrer os impactos climáticos no futuro, bem como, no nosso nível atual de aquecimento e mapeamento de como esses impactos podem piorar se as temperaturas e emissões continuarem a aumentar. Um dos principais pontos do relatório é que cientificamente houve um consenso que de fato as emissões foram impactadas pelo homem,  elevando as temperaturas e gradualmente mudando  o sistema climático do planeta. Pelo relatório, não há dúvidas de que as atividades humanas aceleraram o aquecimento do planeta e que alguns impactos estão ocorrendo ainda nesta década. Portanto, o impacto da atividades humanas são responsáveis por um planeta menos estável. 

Este relatório se concentra em três modelos de cinco cenários analisados:  

  1. O primeiro ao qual o aquecimento é limitado a 1,5 ° C em comparação com a era pré-industrial;
  2. Ao qual a temperatura planetária aumenta 2 ° C em comparação com seu nível pré-industrial, 
  3. Onde o aquecimento atinge até 4 ° C.

 

 Aquecimento limitado a 1,5 ° C 

O relatório do IPCC mostra que o primeiro caso implicaria uma redução drástica das emissões globais em um ritmo acelerado, mesmo assim, ainda pode levar até 30 anos para que as temperaturas se estabilizem. E, até existe uma solução simples para evitar que as condições climáticas piorem:  parar de queimar combustíveis fósseis, plantar mais árvores e reduzir a pressão de capacidade de carga da Terra. Contudo, dado ao atual estado de mobilização dos países, torna-se nula sua probabilidade econômica, social e política. Para exemplificar, no site da BBC news, no dia 21 de outubro:

“… um grande vazamento de documentos que mostram como os países estão tentando mudar o relatório científico crucial sobre como lidar com a mudança climática. O vazamento revela que a Arábia Saudita, o Japão e a Austrália estão entre os países que pedem à ONU para minimizar a necessidade de se afastar rapidamente dos combustíveis fósseis. Também mostra que algumas nações ricas estão questionando pagar mais aos estados mais pobres para migrar para tecnologias mais verdes.”

O primeiro capítulo do relatório do IPCC nos mostra que devido a uma combinação de revisões de registros históricos de temperatura e projeções de aquecimento de curto prazo, que o aquecimento de 1,5º C a 2º C será ultrapassado  e vai se agravar nos próximos anos e décadas se não houver forte e profunda redução nas emissões de CO² e outros gases de efeito estufa para mudar o quadro da crise climática e ambiental. 

Acima de 2 ° C 

 O relatório AR6 fornece estimativas do que aconteceria se o mundo passar dos 2 ° C de aquecimento em relação aos níveis pré-industriais.

Espera-se que o mundo passe dos  2 ° C  em um cenário onde não houve políticas eficazes e eficiente de mitigação para conter as emissões em um curto prazo, segundo o gráfico acima, podemos ver que a estimativa estipulada foi entre o início de 2040 e o início de 2050. Os tomadores de decisão precisam implementar planos de emissão zero líquido e políticas climáticas eficazes, ambiciosas e coordenadas no sentido de restringir o uso de combustíveis fósseis, especialmente nesta década, se quisermos parar o aquecimento da terra. A erradicação do dióxido de carbono é uma questão fundamental a ser resolvida, mas que só funcionará se for acompanhada por rápidas ações para reduzir  as emissões.

Os cientistas acreditam que o planeta aquecerá em 1,5°C em todos os cenários. No caminho mais ambicioso de emissões, alcançaremos 1,5°C nos anos de 2030, ultrapassando 1,6°C, com as temperaturas caindo de volta para 1,4°C no final do século. 

O relatório usa como referência base as observações e estimativas de sensibilidade ao clima, bem como, a suposição base da tendência histórica de aquecimento de 0,2 ° C por década. Sendo assim,  o modelo registra um cenário presumível de um ponto médio do período de 20 anos (por exemplo, 2030) como a provável hipótese em que a temperatura média excederá 1,5 ° C, em um cenário de emissões moderadas (SSP2-4.5), seguindo a abordagem usada no Capítulo 4 do AR6. Isso demonstra uma estimativa provável do excedente de temperatura em um determinado ano,  porém, o modelo pode ser impreciso nos casos em que a taxa de aquecimento mude de acordo com o período de 20 anos (por exemplo, em cenários de emissões muito altas ou eventos climáticos severos como exemplo o el Ninõ e La Ninã).

O impacto resultará na perda de biodiversidade , incluindo a extinção de espécies, independente da temperatura planetária. Os impactos associados a outros riscos relacionados à biodiversidade, tais como incêndios florestais, e a disseminação de espécies invasoras, são menores a 1,5°C comparado a 2°C.  O relatório mostra que a limitação do aquecimento global a 1,5°C comparado a 2o C reduz o aumento de temperatura dos oceanos, bem como os aumentos associados à acidez dos oceanos e diminuições dos níveis de oxigênio nos oceanos. Consequentemente, projeta-se que a limitação do aquecimento global a 1,5°C reduza riscos à biodiversidade marinha, à pesca e aos ecossistemas, e suas funções e serviços aos humanos, como ilustrado pelas recentes alterações na camada de gelo do Ártico e nos ecossistemas de recifes de corais de águas mornas. Consequentemente, o mundo natural, será prejudicado por uma maior temperatura e, os ecossistemas terrestres e oceânicos terão uma capacidade limitada para nos ajudar a resolver o desafio climático.

Carbono restante

É um método simplificado de avaliar quanto mais CO2 pode ser liberado na atmosfera se o mundo desejar limitar o aquecimento global a níveis como 1,5 ° C. O método é baseado no fato de que a quantidade de aquecimento que ocorrerá pode ser aproximada do total – ou seja,  o acumulativo – das emissões de CO2.

Na prática, porém, os orçamentos de carbono mascaram a complexidade atrás da modelagem. Já que o mundo está quase atingindo 1,5 ° C de aquecimento. 

O relatório também aborda o balanço de carbono que nos permitiria respeitar as trajetórias de 1,5 ° C e 2 ° C. A humanidade emitiu 2.560 bilhões de toneladas equivalentes de CO2 desde 1750, e só temos um orçamento de mais 500 se quisermos limitar o aquecimento a 1,5 ° C.

A influência antrópica sobre o clima

Como dito acima, há várias evidências fornecidas pelo último relatório do IPCC que comprovam que irão existir alterações no sistema climático e, consequente ocorrerá  un aumento da temperatura na Terra. Essas alterações no sistema climático têm gerado mudanças climáticas amplas e rápidas (A.1, página 5) e,  isto resultará impactos negativos nos sistemas biológicos, agrícolas e humanos. Sendo assim, apesar dos riscos serem altos em qualquer lugar do mundo ( visto que o aquecimento global não conhece fronteiras) e em diferentes setores da economia, serão as os povos originários e tradicionais, mulheres, negros, camponeses e os LGBTQ os mais impactados.

  Em 2019, as concentrações atmosféricas de CO2 foram mais altas do que em qualquer momento e as concentrações de metano e óxido nitroso foram mais altas do que em qualquer momento observado.

Diretrizes para uma cooperação internacional e regional reforçada

Com este relatório, o IPCC examina pela primeira vez os aspectos regionais das mudanças climáticas. As mudanças climáticas são uma realidade atual e afetam a todos os indivíduos. Dessa forma, o maior agravamento das mudanças climáticas, será sentido  especialmente em pequenos países insulares. Para esses Estados e seus habitantes, a pauta das mudanças climáticas representa uma realidade mais dramática, sobretudo se considerarmos as possibilidades de que, em prazo inferior a um século, estarão submersos no oceano, junto com suas culturas ali desenvolvidas e deixando desabrigadas suas populações. Como o relatorio demonstra, com o aquecimento global  a tendência é que o nível oceânico aumente – “engolindo” os países e cidades costeiras. (B.5.1 P. página 13)

O  IPCC alerta que cada região deverá experimentar cada vez mais mudanças simultâneas e múltiplas nos fatores de impacto em todo o sistema climático e grande parte de seu estado atual são sem precedentes ao longo de milhares de anos (A.2, página 9)

Nesta última década vimos o derretimento das calotas de gelo ocorrer do mar ártico, ao qual continua derretendo e derreterá por décadas ou séculos… visto que a perda de carbono do permafrost por descongelamento é irreversível(A.2.3, página 9). 

Os impactos serão devastadores, como mudanças severas na circulação marítima, alguns eventos extremos a partir do aquecimento poderão ser prováveis no futuro e a avaliação feita no relatório não pode ser descartada e são parte da avaliação de risco. (C.3, página 21)

Portanto, a observação do relatório é clara: é fundamental que cada ator econômico adote imediatamente uma estratégia agressiva de redução das emissões de GEE. Os Estados têm um papel fundamental para desempenhar o desenrolar da história. O único cenário possível para atingir a meta mais ambiciosa do Acordo de Paris inclui a cooperação plena e coordenada entre todos os países, além da trajetória de emissões que a ambição total dos compromissos climáticos, fortalecendo concretamente suas contribuições nacionais (NDC) até 2030 e respeitando esses compromissos.

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