O encontro das Margaridas conta com público de 100 mil pessoas em Brasília. A primeira Marcha das Mulheres indígenas se une às camponesas para lutar contra retrocessos sociais.

Mulher indígena participa Marcha das Margaridas em 2015. Fotos: Mídia NINJA

Texto por Natália Loyola de Macedo.

Como forma de resistir ao cenário político atual, mulheres indígenas resolveram agregar movimentos. A primeira Marcha das Mulheres Indígenas vai acontecer simultaneamente com a Marcha das Margaridas. O objetivo é levar o maior número de pessoas, sobretudo, mulheres, à Brasília para reivindicar direitos e lutar contra retrocessos. A estimativa é que a capital do país receba aproximadamente 100 mil pessoas nos dias 13 e 14 de agosto. O primeiro dia de ação será destinado às indígenas e aos simpatizantes de suas lutas. No dia seguinte, acontecerá a popular Marcha das Margaridas.

Assassinada por um latifundiário, em 12 de agosto de 1983, a história de Margarida incentivou a organização do movimento que viria a ser a maior ação de mulheres da América Latina.

A frase “É melhor morrer na luta do que morrer de fome”, de Margarida, ganhou corpo e hoje reúne em Brasília mulheres da terra, das águas e das florestas.

Durante o Acampamento Terra Livre (ATL), realizado em abril, decidiu-se a união das lutas. O Fórum Nacional das Mulheres Indígenas terá início no dia 9 de agosto. A ideia é discutir questões levantadas na ATL deste ano. A programação ainda não está disponível.

“O Fórum vai abrir um espaço às questões que nós temos que dar como prioridade dentro de tudo o que a gente vai fazer. Ouvir das mulheres o que elas estão trazendo “de dentro” de seus estados e municípios. E o que elas têm de avanço, o que elas têm de desafio. Estaremos coletando […] até para o próprio governo, para ele, colocar como política pública. Porque o governo não está tendo o trabalho de trazer as mulheres e nós estamos indo até o governo para apresentar as nossas demandas.”, explica Rosimere Teles, povo Arapaço da terra indígena Alto Rio Negro, no Amazonas, membro da coordenação da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMAB).

Mulheres Indígenas durante o Acampamento Terra Livre. Foto: Matheus Alves

De acordo com as pautas levantadas na plenária do ATL, o lema da primeira Marcha “Território: nosso corpo, nosso espírito” tende a levar questões que são imprescindíveis na luta pela proteção e manutenção do território através do olhar sustentável das mulheres indígenas. Além disso, também traça como objetivo trabalhar temas relacionados à saúde pública e educação, assuntos que têm demandado maior cautela devido ao desmonte projetado e executado pelo governo Bolsonaro. A Secretaria Especial de Saúde Indígena, órgão fundamental no tratamento qualificado aos povos originários, por exemplo, vem sofrendo dificuldades na sua execução.

O slogan escolhido procura representar o que é essencial na vida das mulheres indígenas. “Porque nosso corpo tem a ver com território? Porque a terra é parte das nossas vidas. Tudo dependemos da natureza. Tudo existe nela.”, comenta Rosimere.

Além disso, completa dizendo que o território é local onde se constrói moradias e produz alimentos, e que os espíritos dos povos indígenas têm lugares sagrados. Rosimere também alerta que cuidar da mãe terra é o mesmo que cuidar do corpo.

Ro’Otsitsina Xavante, liderança indígena, em entrevista ao El País, afirmou que questões de gênero chegam com timidez à Marcha, mas que os temas vêm ganhando espaço no debate público com decorrer do tempo. Devido às distinções culturais e temporais, a condição da mulher indígena é tratada com maior cautela a fim de respeitar as peculiaridades de cada povo e não alimentar o processo de colonização atual.

“Nós mulheres não somos parte do povo, nós somos o povo. Então, violando uma menina, violando uma mulher, você está violando o povo.”, enfatiza Ro’Otsitsina Xavante.

Oficinas cumprem o papel de levar discussões sobre violência e abuso sexual contra mulheres originárias às maiores interessadas. Elas estão no processo de compreender o que é e de que forma operam determinadas agressões. Há forte crescimento de violência contra os povos indígenas no país e as maiores vítimas acabam sendo mulheres e crianças.

No Brasil, existem organizações de mulheres indígenas como a Associação das Guerreiras Indígenas de Rondônia; União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira; Movimenta de Mulheres do Xingu; entre outras. Mas, pela primeira vez, o país terá uma ação organizada a nível nacional para que mulheres indígenas levem pautas ambientais, trabalhistas e de direitos humanos até a capital do país.

Marcha das Margaridas

Mulheres camponesas durante a Marcha das Margaridas em 2015. Foto: Mídia NINJA

Com o lema “Margaridas na luta por um Brasil com soberania popular, democracia, justiça, igualdade e livre de violência”, os dias 13 e 14 ficam destinados a mais uma edição da Marcha das Margaridas que ocorre uma vez a cada quatro anos desde o ano 2000. O movimento busca combater as diferentes formas de violência cometidas às mulheres rurais e vem se tornando cada vez mais democrático ao oferecer espaço para vozes das florestas e das águas.

A segunda semana de agosto vem para que mulheres originárias do Brasil, junto às camponesas, responsáveis por produzir o alimento que a (o) brasileira (o) tem na mesa, resistam contra o processo colonizador atual na busca por mais visibilidade e respeito na sociedade.