Geógrafo Allan Rodrigo Silva fez uma análise do surgimento de pandemias nas últimas décadas e sua ligação com a exploração ambiental

(Reprodução/Instituto Modefica)


O geógrafo e pesquisador Allan Rodrigo de Campos Silva publicou nesta segunda-feira (26/09), no Le Monde Diplomatique Brasil, como parte do especial “Agro é devastação ambiental, fome, adoecimento e morte”, uma análise sobre a ligação entre o surgimento de pandemias ao longo das últimas décadas e o avanço de sistemas agro-exploratórios. O autor do texto é, também, tradutor da obra  “Pandemia e agronegócio: doenças infecciosas, capitalismo e ciência”, do biólogo Rob Wallace. 

Segundo Allan Rodrigo, a associação de mutações que levam ao aparecimento de novas doenças com potencial epidêmico à devastação ambiental provocada pelo modelo exploratório do agronegócio, a urbanização acelerada e as mudanças climáticas, começou na década de 1990, com a publicação de estudos urgentes sobre o assunto por pesquisadores da Universidade de Oxford. 

Esses estudos, assim como análises mais recentes, como a de Rob Wallace, demonstram que o aumento do contágio em humanos de doenças que antes se proliferavam apenas em outras espécies, assim como o surgimento de variações genéticas mais transmissíveis e mortais, possui uma intrínseca ligação com as mudanças no ambiente provocadas por modelos não sustentáveis de produção, que alteram o equilíbrio ecológico entre a fauna e a flora locais.

Isso ocorre pois, dentro da biodiversidade de animais e plantas encontrada nos biomas há, também, uma gigantesca diversidade de vírus, bactérias e protozoários que evoluem junto com a fauna e flora local ao ponto de, às vezes, conforme é dito pelo autor, serem “identificados trechos inteiros de códigos genéticos de animais idênticos aos seus microrganismos”. Assim, alterar as relações entre os humanos, animais, plantas e microorganismos acaba levando a vida microscópica a tentar se readaptar, com a probabilidade de que essas adaptações e evoluções causem doenças mortais. 

Como exemplo, é citado no texto a pandemia do novo coronavírus, que teria surgido devido ao avanço do desmatamento no sudeste da Ásia, com a finalidade de transformar as áreas de florestas em áreas de plantio, o que aumentou o contato entre morcegos e pangolins, mamíferos naturais da Ásia, que passaram a ser criados de forma intensiva na China, após uma crise no consumo de carne de porco, que, coincidentemente, ou não, foi provocada pelo aparecimento da Peste Suína Africana, que levou à morte de duzentos milhões de porcos na Ásia, entre 2018 e 2019. 

Essas alterações no padrão de alimentação dos humanos, que é também uma consequência das alterações no ambiente, desequilibraram as relações ambientais e levaram ao que nós presenciamos com a Covid-19, em 2020. Além do novo coronavírus, o autor cita outros exemplos, como a epidemia de Ebola no Sudão, em 1970, com mudanças ambientais provocadas pela indústria do algodão, a mais recente epidemia de Ebola em 2013 e 2016 na Guiné e Costa do Marfim, ligadas ao desmatamento para a produção de óleo de palma e a epidemia de HIV/aids em 1970, consequência da pesca industrial e do desmatamento na África. 

O avanço do agronegócio no Brasil, com plantações de soja e milho tomando o lugar de florestas e afetando o equilíbrio de biomas como o Pantanal, Cerrado e Amazônia, o Brasil se torna o que o autor chama de “caldeirão” para o surgimento de novas doenças, com um forte potencial de ser o cenário inicial de próximas pandemias, que não deixaram de surgir enquanto o modelo agro exploratório não for detido e, em um cenário mais otimista, substituído.

Leia a matéria de Allan Rodrigo de Campos Silva no site do Le Monde Diplomatique Brasil