Um elemento marcante deste julgamento foi o reconhecimento histórico das mulheres trans como um dos grupos visados pelo regime

Foto: Telán

A Justiça argentina emitiu veredictos históricos ao condenar à prisão perpétua dez ex-agentes da ditadura militar por uma série de crimes hediondos cometidos durante o regime, incluindo homicídio, sequestro, tortura, estupro e roubo de crianças. Essa decisão crucial ocorreu dois dias após o 48º aniversário do golpe de Estado que instaurou uma das épocas mais sombrias da história latino-americana.

Um elemento marcante deste julgamento foi o reconhecimento histórico das mulheres trans como um dos grupos visados pelo regime. O tribunal confirmou que pelo menos oito mulheres trans foram sequestradas e submetidas a abusos desumanos, sendo reduzidas à escravidão e forçadas a realizar trabalhos domésticos e servir aos caprichos dos agentes da ditadura.

Com esse marco, o número de indivíduos condenados por crimes de lesa-humanidade na Argentina chega a 1.184, resultado de 317 sentenças, enquanto outros 62 julgamentos ainda estão em curso.

O julgamento revelou detalhes estarrecedores dos horrores perpetrados nos centros de detenção de Poço de Banfield, Poço de Quilmes e Brigada de Lanús, este último conhecido como “inferno” devido às atrocidades infligidas aos prisioneiros políticos. Sob a supervisão do ex-diretor da Polícia da Província de Buenos Aires, Miguel Etchecolatz, as vítimas foram sujeitadas a violência sistemática, incluindo violência sexual, trabalho forçado e servidão.

Embora o processo tenha sido iniciado em 2020, diversos réus, incluindo Etchecolatz, faleceram antes do veredicto, enquanto outros enfrentaram a justiça postumamente. A decisão final foi recebida com emoção por sobreviventes e familiares das vítimas presentes no tribunal, assim como por uma multidão de apoiadores que se reuniram do lado de fora, clamando por justiça e reafirmando a necessidade de enfrentar o passado sombrio do país.

No entanto, este momento histórico também ocorre em meio a um contexto de controvérsia e negacionismo. O governo do extremista Javier Milei recentemente divulgou um vídeo revisionista sobre o período, desafiando narrativas estabelecidas e gerando debates sobre verdade e memória histórica.

Apesar das tentativas de revisão e negação, o veredicto desta semana fortalece a determinação em afirmar a verdade sobre os crimes cometidos durante a ditadura.