Com O Território, que estreia nos cinemas no dia 8 de setembro, os Uru-Eu-Wau-Wau denunciaram internacionalmente situação crítica de invasões

Os Uru-Eu-Wau-Wau encontraram no cinema um canal para denunciar mazelas no território (Divulgação)

 

Após dois anos de pressão, para que a polícia prendesse o autor do assassinato de Ari Uru-Eu-Wau-Wau, enfim, no mês passado um suspeito foi preso pela Polícia Federal. O corpo de Ari foi encontrado com marcas de espancamento em 18 de abril de 2020, em uma estrada de Tarilândia, distrito de Jaru (RO). Ainda há um longo caminho até que justiça seja feita, mas já é um avanço.

As associações do povo indígena Uru-Eu-Wau-Wau e de Defesa Etnoambiental Kanindé se manifestaram por meio de nota, lembrando que o crime ocorreu “em meio à falta de fiscalização, invasões de terras por grileiros, garimpeiros e madeireiros” e exigem que sejam esclarecidas a participação de outras pessoas, motivação do crime e a possibilidade de existir um mandante.

Da Kanindé, a ativista Ivaneide Bandeira, disse em entrevista à Mídia Ninja que esse resultado é fruto da cobrança constante dos indígenas e de associações. Diante da inércia do governo federal, na proteção de vidas indígenas e dos seus territórios, diversas têm sido as iniciativas encampadas por eles próprios, como o grupo de vigilância da Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, que fiscaliza e protege o território e da qual Ari fazia parte.

Outros indígenas e ativistas têm sido ameaçados de morte por defenderem a floresta e o território que é um dos últimos grandes remanescentes de floresta em Rondônia, com 1,8 milhão de hectares. Cansados de acionar autoridades competentes sem que sejam atendidos em suas reivindicações, decidiram agir por contar própria.

Na busca por soluções, a arte e a tecnologia têm sido ferramentas essenciais.

“Eles passaram por um processo de formação de agentes ambientais indígenas, no qual aprenderam desde a legislação até como abordar um invasor. Aprenderam também a usar máquinas fotográficas, celulares e os drones para fazer as intervenções e mostrar ao mundo o que está acontecendo com a gente”.

O cinema também os ajudou a sair da invisibilidade. Vencedor do Prêmio do Público e do Prêmio Especial do Júri no Festival Sundance 2022, o filme O Território fornece um olhar imersivo sobre a luta incansável do povo Uru-Eu-Wau-Wau contra o desmatamento cometido por posseiros, grileiros, garimpeiros e outros invasores de terras na Amazônia brasileira.

Coproduzido pelos Uru-Eu-Wau-Wau, O Território mostra imagens reais capturadas ao longo de três anos, enquanto a comunidade arrisca sua vida para montar sua própria equipe de mídia na esperança de expor a verdade. Ele é dirigido por Alex Pritz com apoio de Daniel Oshida e produzido pelo indicado ao Oscar, Darren Aronofsky, além da jovem liderança indígena Txai Suruí, filha de Neidinha. A propósito, Neidinha também participa do filme.

Fundadora da Kanindé, Neidinha também participa do filme (Divulgação)

O documentário já consagrado, estreia nos cinemas brasileiros no dia 8 de setembro.

“A gente não quis mostrar só um lado então, estamos mostrando o lado dos Uru-Eu-Wau-Wau e dos invasores, também. Não perca que lá a gente mostra como é toda estratégia desse governo, desde que foi eleito, para destruir os territórios e matar os povos indígenas”.

Neidinha não dá vazão a críticas rasas.

“Estamos todos ameaçados de morte. A entrada dos drones e das máquinas fotográficas, dos celulares e das filmadoras na nossa vida, ajudou a nos proteger. Veja só, com o drone, a gente sobe o drone e consegue ver uma invasão sem precisar estar em cima do invasor. Porque imagina só. Arco e flecha contra fuzil é uma diferença muito grande, não é?”.

Ela realça que quando se usa o drone, os indígenas conseguem visualizar o desmatamento e com isso, avisar a Funai, Polícia Federal, o Ibama e assim, isso ajuda na proteção da Terra Indígena.

“Tem crítica? Tem. Tem gente que acha que os povos indígenas têm que andar pelado. Tem quem acha que indígena que usa ‘Iphone’ não é indígena. É porque a pessoa não para pensar que se usa calça jeans, então não ia ser brasileiro. Seria americano, qualquer outra coisa né? Ou quem fala inglês, japonês, ser de outro povo”.

Para ela, é preciso se colocar mais no lugar do outro.

“Eu digo que a cultura é fortalecida com o cinema, com o uso certo do celular, é saber usar direito as redes sociais. A gente está conseguindo colocar nas redes sociais o que acontece na Amazônia e a gente só consegue isso porque usa os instrumentos e a tecnologia. Isso é um direito dos povos indígenas que não pode ser negado. O problema é que as pessoas gostam de negar os direitos dos povos indígenas, então, fica a reflexão”.