Terra indígena Vale do Javari, no estado do Amazonas (Adam Mol/Funai)

Beatriz Matos é doutora em antropologia, além de ser membro-fundadora do OPI (Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados). Ela trabalha desde 2004 no Vale do Javari, área da Amazônia onde se encontra a maior quantidade de povos isolados do mundo. No início deste ano Beatriz assumiu o cargo de diretora do Departamento de Proteção Territorial e de Povos Isolados e de Recente Contato no Ministério dos Povos Indígenas.

“Cada terra indígena, cada povo tem suas características. Há vários universos na política de isolados. Precisamos melhorar as condições trabalhistas dos funcionários, muitas vezes expostos a perigos. A Funai não tem plano de carreira e uma série de benefícios que outros servidores públicos têm.” contou em entrevista para a Folha de São Paulo.

A antropóloga contou ainda dos desafios que vêm encontrando dentro do atual governo: “Claro que há forças contraditórias no próprio governo. Também é um trabalho didático. Tendo indígenas nos fóruns mais centrais, como uma ministra, vão ouvir realidades que normalmente não ouviriam”. Para ela, apesar disso, nem todas as pessoas estão convencidas da importância dessa luta, mas Beatriz acredita que o mundo está tomando conhecimento de que a pauta é uma prioridade:

“É um trabalho de articulação, convencimento e, às vezes, de embate — de combate pelo que a gente acredita.” completa.

Sobre a crise Yanomami, a antropóloga acredita que há muito racismo envolvido, principalmente em quem acredita que parte da responsabilidade do que ocorre é dos próprios Yanomamis, ao caracterizá-los como passivos. “O que os faz vulneráveis é a ocupação violenta do território, que é deles ancestralmente. Estão lá muito antes de o Brasil existir. Temos de combater as invasões para que possam viver da maneira que eles entendem ser a melhor.” enfatiza. Para ela, quando parte desse povo escolhe permanecer isolado “é uma expressão política. Precisa ser respeitada como tal”.

A entrevista finaliza com a diretora contando sobre como foi voltar ao Vale do Javari, onde seu marido, Bruno Pereira, e o jornalista Dom Philips foram assassinados. “Pessoalmente, foi emocionante. A gente não tinha chorado junto. Toda pessoa que se aproximava era um choro novo. É quando você encontra alguém que, como você, perdeu um ente querido. Esse amor em comum pela mesma pessoa. Foi muito forte.” Ela lamenta que o julgamento tenha sido adiado, “cada adiamento é uma dor. As pessoas ali continuam ameaçadas.”