Mulher e criança observam casa queimada por fazendeiros em Anapu, no Pará (Mídia NINJA)

O último governo, que se encerrou no dia 31 de dezembro de 2022, resultou em um saldo preocupante para o país no que diz respeito à violência no campo. É o que mostra o relatório “Conflitos no campo Brasil 2022”, lançado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) na segunda-feira (17/04).

O documento mostra que ano passado foram registradas 2.018 ocorrências de conflitos no campo, o que corresponde a um conflito a cada quatro horas. Esse aumento é particularmente preocupante na região da Amazônia Legal, que concentrou 59% de todas as ocorrências do tipo registradas no país.

Incentivados pelo enfraquecimento de órgãos e leis ambientais promovidas pelo governo federal, a Amazônia acabou se tornando palco para os conflitos, onde a violência no campo acabou crescendo em ritmo duas vezes mais intenso do que em outras regiões. “A região da Amazônia Legal tem sido marcada por um crescente número de conflitos por terra nos últimos dez anos, com agravamento da situação após 2016. Dos 47 assassinatos no campo registrados no Brasil em 2022, 34 ocorreram na Amazônia Legal, o que representa 72,35% de todos os assassinatos no país.” escreveu a CPT no relatório.

Indígenas foram os que mais sofreram

Quando falamos sobre quem foram as maiores vítimas de tais ocorrências, desde 2019 temos a mesma resposta: os povos indígenas. Elaborado desde 1985, o relatório vem mostrando que nos últimos anos essa parte da população vem sendo os principais atingidos, sendo, do total de ocorrências registradas, 28% envolvendo povos indígenas. Em seguida, está a categoria posseiro, envolvida em 19% dos registros de conflitos por terra. Logo depois estão comunidades quilombolas (16%), sem terras (12%) e famílias assentadas da reforma agrária (9%).

Além disso, os povos indígenas também foram as maiores vítimas de assassinatos: em 2022, como já informado, ocorreram 47 assassinatos por conflitos no campo, tendo como vítimas 18 pessoas indígenas, seguidos por 9 Sem Terra, 3 Ambientalistas; 3 Assentados e 3 Trabalhadores Assalariados. O relatório destaca ainda o trágico caso das mortes do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, no Vale do Javari, no Amazonas.

Entre as vítimas, os indígenas Yanomami infelizmente ganham destaque. Seu território, localizado na Amazônia nos estados de Roraima e Amazonas, foi muito disputado e invadido por garimpeiros nos últimos anos, o que deixou a população indígena a mercê de diversas violências: em 2022, dos 113 registros de Morte em Consequência obtidos, 103 foram em Terra Indígena Yanomami, e destes, 91 eram crianças, representando 80,5% dos casos.

O Agro é morte

Os dados também apresentam os principais causadores desses conflitos, os quais incluem grandes empreendimentos de exploração mineral e de geração de energia, empresas do agronegócio e monocultivos, garimpo, pecuária e o próprio Estado brasileiro: os fazendeiros foram responsáveis por 23% das ocorrências de conflito por terra, seguidos do governo federal, com 16%, empresários, com 13%, e grileiros, com 11%.

A grande parcela de culpa do Estado ocorre não somente por ter sido o executor em algumas ações, mas também por conta de sua omissão na hora de punir os responsáveis pelos conflitos, além do incentivo a atividades ilegais, com falas polêmicas e que desrespeitam os direitos humanos : “A reserva Yanomami tem mais ou menos 10 mil índios. O tamanho é duas vezes o estado do Rio de Janeiro. Justifica isso?” disse Bolsonaro em 2021.

“Os números explicitam a relação direta entre Estado e agronegócio. Trata-se de uma relação histórica baseada na exploração das comunidades, na morte de pessoas, na destruição da natureza e dos modos de vida das comunidades. Isso precisa acabar”, diz Carlos Lima, da coordenação nacional da CPT.