Em debate com a jornalista Mariana Varella, o neurocirugião alertou para a virada demográfica da pirâmide brasileira, quando o número de mortes ultrapassará o de nascimentos

 

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O que podemos esperar do futuro da pandemia no Brasil de Bolsonaro? Para o neurocirurgião Miguel Nicolelis e a cientista social Mariana Varella, convidados do Papo NINJA desta segunda-feira, há que se dimensionar a situação fora de controle do país para mensurar o que o país viverá nos próximos anos em relação aos efeitos da crise sanitária com a Covid-19. “Esse é um vírus que não podemos pegar, também porque ainda não conhecemos suas sequelas”, disse Mariana. O debate ocorreu ao vivo no Instagram, nesta segunda-feira (5), com o tema “Vacina Já”, sinalizando para uma medida crucial para o combate à pandemia, a imunização, mas que ainda deixa a desejar.

“Hoje nós já voltamos a vacinar apenas 500 mil pessoas em um dia, quando estávamos vacinando um milhão”, lembra Nicolelis. Ele lembrou do caso chileno, país que vacinou mais pessoas no Brasil mas não efetivou o lockdown em paralelo. “Hoje eles veem a consequência disso e precisaram reverter o bloqueio em Santiago e outras grandes cidades. Isso mostra como não adianta fazer somente uma política e esquecer outra”.

Para o neurocirurgião, há uma fórmula básica que deveria orientar as políticas públicas de combate a pandemia: coordenar, isolar, bloquear e vacinar. Mariana concorda que até mesmo o lockdown por si só não deveria ser uma medida isolada. “Deveria haver um centro de contingência com medidas coordenadas. E as medidas de amparo socioeconômico fazem parte, pra que as pessoas consigam ficar em casa. A gente está com um falsa sensação de que estamos salvando a economia quando deixa o vírus correr solto, e não está”.

Mariana, que estuda comunicação de risco em pós-graduação em saúde pública, alerta para a falta de comunicação enquanto política. “No Brasil nós fizemos tudo ao contrário do que dita toda a literatura sobre comunicação de risco. A gente não teve comunicação de risco efetivo, nem sequer uma campanha básica pedindo para as pessoas usarem máscara”, disse. “Na falta dessa comunicação, ficou a cargo da imprensa e dos especialistas, médicos e cientistas que acabaram fazendo, por conta própria, esse trabalho. Além de não fazer, o governo jogou contra”.

Virada demográfica

O Brasil já apresenta uma previsão de 500 mil mortos pra junho e julho, validado em pesquisa da Universidade de Washington, o que os cientistas brasileiros já falavam há um mês conforme certifica Nicolelis. Nesses números há uma dimensão preocupante, na visão do neurocirurgião, que precisa ser estudada.

“É a primeira vez na história do Brasil que podemos ter um mês em que o número de óbitos vai superar o número de nascimentos”, disse Nicolelis.

“A média de 2019 que era de 126 mil nascimentos a mais do que óbitos por mês. No ano passado essa diferença na média caiu pra 96 mil. Em janeiro e fevereiro desse ano a média caiu pra 70 mil, e em março caiu pra 47 mil. É metade da média do ano de 2020”, alertou. “Se a previsão de 100 mil mortes por Covid ocorrer em abril, que é a previsão corrente de várias fontes, teremos o primeiro mês com número de óbitos passando o número de nascimentos na história do país. Ou seja, um efeito estrutural que só terá efeito daqui a 30 anos”.

Se a previsão perdurar, teremos pela primeira vez na história uma inversão da pirâmide demográfica brasileira e a perda do chamado bônus demográfico, que um dos poucos países do mundo tem. Cidade como Rio de Janeiro e Uberlândia já negativaram a diferença. “Uberlândia é uma história à parte, pois se morre mais em Uberlândia do que cada um de 9 diferentes estados brasileiros. O Brasil pode estar virando um grande Japao do ponto de vista demográfico por falta de ação adequada do governo brasileiro”.