No dia 9 de novembro grupo de indígenas Kanamari ficou sob a mira de pescadores ilegais

(Bruno Kelly/Amazônia Real)

Um ataque a tiros contra um grupo de indígenas Kanamari, denunciado na semana passada, mostra que o governo federal não tomou providências para garantir a segurança na região do Vale do Javari, no Amazonas. Por isso, a Defensoria Pública da União pediu à Justiça que obrigue o governo a atuar contra criminosos que ameaçam vidas indígenas e de servidores públicos que atuam para proteger o território.

Segundo o Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi), que divulgou carta-denúncia do povo Kanamari em seu site no dia 18, e também a petição da DPU, o documento foi enviado em caráter de urgência nesta quarta-feira (23) e faz parte de um processo que tramita desde 2018 pedindo medidas para a região.

“Os defensores públicos Renan Sotto Mayor e Francisco Nóbrega indicam a necessidade de fiscalização ostensiva ao longo dos rios Ituí e Itaquaí, através de operações integradas entre a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), a Força Nacional e as Forças Armadas”, diz trecho de publicação no site do Opi.

Renan e Francisco também pediram que a União e a Funai sejam intimadas a informar, no prazo de cinco dias a contar da decisão judicial, quais medidas adotaram para elucidar os crimes e coibir a atuação de pescadores ilegais na região do Javari.

Mapa da Terra Indígena Vale do Javari, que sofre ataques constantes de pescadores e garimpeiros ilegais (Reprodução Opi)

Para a DPU, em virtude da extensão da área e da quantidade expressiva de lagos onde são praticados os crimes, é necessário que seja mantida presença ostensiva na região, que não se limite a bases da Funai e as operações de fiscalização devem ser efetivas, continuadas e envolvendo várias agências de estado, notadamente Ibama, Funai, Marinha e Força Nacional.

A atuação dos mesmos grupos criminosos que já vitimaram Maxciel, Bruno e Dom coloca em risco os indígenas, especialmente os que vivem em isolamento voluntário, quanto os servidores públicos da Funai e da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) que trabalham na região.

Ataque a indígenas Kanamari

Os indígenas Kanamari, via Associação Kanamari do Vale do Javari (Akajava) denunciaram que no dia 9 de novembro um grupo de cerca de 30 indígenas foi surpreendido por pescadores ilegais que estavam realizando pesca predatória dentro da terra indígena e nas proximidades da região onde vivem povos isolados e de recente contato.

Uma liderança foi ameaçada com uma arma apontada para o peito. Um dos criminosos disse que “as mortes no Vale do Javari não vão findar até que as principais lideranças sejam assassinadas”.

O grupo de pescadores estava com o barco carregado de peixes e quelônios capturados ilegalmente e um deles ameaçou a liderança Kanamari com uma arma em punho, dizendo que a mataria como mataram Bruno e Dom, fazendo referência aos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Philips na mesma região, em junho passado. A denúncia consta de carta divulgada pela Associação dos Kanamari do Vale do Javari (Akavaja).

A carta relata ainda que o líder do grupo criminoso tirou a máscara, mostrou o próprio rosto e avisou que “por conta de atitudes assim que Bruno e Dom foram mortos pela nossa equipe e você será a próxima”, referindo-se à líder indígena que o questionou sobre a pesca predatória no território indígena.

“Depois de ameaçar abertamente o grupo, em especial a liderança mulher, os pescadores cortaram a fiação do motor de uma de nossas canoas. Então saíram em seus barcos pelo rio, empunhando armas e atirando em direção às canoas do povo Kanamari. Os tiros perfuraram os tambores de gasolina que estavam no teto de uma das canoas”, diz o documento da Akavaja.

A Polícia Federal anunciou abertura de inquérito para apurar as ameaças, mas nenhuma medida de segurança foi tomada pelo governo brasileiro. A petição vai ser analisada pela 1a Vara Cível da Justiça Federal do Amazonas, dentro do processo no. 1004249-82.2018.4.01.3200.