Em 2020, o número de focos de incêndios em todo o território foi o maior em 10 anos (Foto: Sérgio Vale/Amazônia Real)

 

Por Graziella Albuquerque, para a Cobertura NINJA na COP26

Neste domingo (31), começou a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 26), em Glasgow, na Escócia. A conferência conta com a presença de mais de 100 líderes mundiais, diversos empresários e ambientalistas que vão discutir soluções e metas para limitar o aquecimento global em até 1,5°C.

O presidente Jair Bolsonaro optou por não ir à COP 26, pois temia uma repercussão negativa provocada por sua presença no evento. O vice-presidente Hamilton Mourão, que também é presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal, também teve sua presença vetada por Bolsonaro. O Brasil segue representado pelo ministro do meio ambiente, Joaquim Leite, que está no cargo há 4 meses.

Não é à toa a ausência de Bolsonaro. O país está desmoralizado por conta do negacionismo em relação à proteção ambiental e os altos índices de desmatamento e queimadas ilegais na maior floresta tropical do mundo, a Amazônia. Segundo a CNN, a floresta amazônica bateu novo recorde de desmatamento apenas em setembro, perdendo diariamente uma área de floresta maior do que 4 mil campos de futebol.

Integrantes da comitiva brasileira ouvidos pela BBC News Brasil classificaram o ambiente de negociação na COP26 como “mais complexo”, “mais difícil” e “mais duro” para o Brasil, em comparação com conferências anteriores. A dificuldade da delegação brasileira será de reduzir o impacto da imagem negativa criada pela política ambiental do governo Jair Bolsonaro e convencer sobre a seriedade de seus compromissos ambientais.

O isolamento internacional do governo brasileiro pode gerar grandes prejuízos econômicos. Em 2020, as queimadas no Pantanal serviram para que os países da União Europeia paralisassem as negociações com o Mercosul, que seguem congeladas. Bolsonaro também foi denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) no último dia 22 por violações de direitos contra os defensores de direitos humanos e do meio ambiente. Entidades da sociedade civil afirmam que o Brasil figura entre os países mais perigosos para os defensores ambientais.

O grupo All Rise, composto por juízes, ambientalistas e cientistas, apresentou no dia 12 de outubro uma denúncia contra o governo Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional de Haia citando diretamente a sua política ambiental, conforme informado pela Revista ISTOÉ.

Programa de Crescimento Verde

Uma política ambiental que o governo pretende apresentar na COP26 é o Programa Nacional de Crescimento Verde, que foi lançado uma semana antes da conferência.

O objetivo do programa é sistematizar as ações do Brasil na área ambiental e de desenvolvimento sustentável. No entanto, nem o Planalto, nem os ministérios do Meio Ambiente e da Economia, responsáveis pela iniciativa, detalharam como essas ações devem ocorrer na prática.

Relatório sobre Mudanças Climáticas

A BBC teve acesso exclusivo a mais de 32 mil comentários e críticas que governos, empresas e outras instituições fizeram ao relatório do IPCC, o principal órgão global responsável por organizar o conhecimento científico sobre as mudanças do clima e orientar as ações para combatê-las.

Nas mensagens ao IPCC, o Brasil se opôs fortemente à conclusão do relatório de que a adoção de uma dieta com menos carnes e mais alimentos feitos de plantas seria necessária para combater a mudança do clima. O argumento foi endossado pela Argentina e, em menor grau, pelo Uruguai – outros dois grandes produtores de carne.

Segundo o IPCC, a produção de carne é um dos principais motivos do desmatamento na Amazônia e no Cerrado, pois a vegetação nativa é, na maioria das vezes, derrubada para dar lugar a pastagens ou plantações de soja, que alimentam rebanhos.

O rascunho do relatório do IPCC diz que “dietas à base de vegetais podem reduzir as emissões em até 50% comparado com a média de emissões da dieta Ocidental.”

Tanto Brasil quanto Argentina defenderam que os autores do relatório do IPCC apaguem ou modifiquem trechos do texto que falam que “dietas à base de vegetais” cumprem um papel na gestão das mudanças climáticas ou que descrevem carne vermelha como um alimento de “alta emissão de carbono”.

Paralisação dos recursos do Fundo Amazônia

Nas negociações internacionais, a estratégia que o governo vem usando é de exigir mais recursos dos países ricos como forma de recompensa por preservar florestas, alegando que não explorar os recursos naturais dos biomas brasileiros geraria prejuízos financeiros ao país.

No entanto, de acordo com Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, já existe no Brasil um programa que recebe remessas de recursos de outros países para a conservação florestal, o Fundo Amazônia. O Fundo foi criado em 2008 para distribuir recursos a projetos de prevenção e combate ao desmatamento, além de financiar projetos de conservação e uso sustentável das florestas da Região Amazônica.

Os principais doadores são Noruega e Alemanha, que suspenderam o financiamento devido à falta de medidas concretas do governo brasileiro para combater crimes ambientais e diminuir as queimadas na Amazônia.

Além disso, há cerca de R$ 2,9 bilhões do Fundo Amazônia parados, sem atividade desde agosto de 2019, segundo apontou a rede Observatório do Clima em audiência pública no Supremo Tribunal Federal, em 26 de outubro do ano passado. Em 2021, Hamilton Mourão, afirmou a jornalistas que não há prazo para a retomada do Fundo Amazônia.

“O governo não tem nenhuma moral para pedir dinheiro para outros países, porque o dinheiro já está aqui. O que falta no Brasil não é dinheiro para proteger floresta, o que falta no Brasil é governo para proteger floresta. Falta compromisso”, critica Astrini. “Não tem compromisso com o combate ao desmatamento, mas tem compromisso com o crime ambiental. Por isso paralisou o Fundo que se encontra hoje sem perspectiva de ser retomado”, acrescenta.

Acordo de Paris

Do Acordo de Paris para 2020, em vez de reduzir, o Brasil elevou as emissões de gases do efeito estufa em quase 5%, revela relatório. Apenas no ano passado, em plena pandemia, enquanto o mundo registrava queda de 6,7% nas emissões, o Brasil seguia na contramão: aumento de 9,5%, o maior desde 2006.

Dados mostram que, no governo Bolsonaro, em 2020, o número de focos de incêndios em todo o território foi o maior em 10 anos; o volume de emissões de carbono em 2019 foi o maior em 13 anos, e o desmatamento da Amazônia atingiu o maior patamar desde 2008.

No ranking dos países que mais agravaram o aquecimento global em 2020, o Brasil aparece em quinto lugar, atrás apenas de China, Estados Unidos, Rússia e Índia. A maior parte das emissões brasileiras vem do desmatamento ligado a pastagens e culturas agrícolas.

Alternativas para o desenvolvimento econômico verde

O Jornal Nacional obteve com exclusividade um estudo da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura com 40 dos mais bem sucedidos projetos que exploram o verde de forma lucrativa e sustentável.

Um dos projetos fica em Garça, no interior de São Paulo. As pastagens degradadas deram lugar a uma imensa floresta replantada. Com as nascentes protegidas pelo verde, a água voltou. A empresa vende 1 milhão de mudas de árvores por ano e investe em madeira tropical com alto valor de mercado e outras culturas lucrativas.

O diretor-executivo do Instituto Internacional para Sustentabilidade, Bernardo Strassburg, estima que o Brasil possa faturar até R$ 10 bilhões por ano com o uso inteligente das florestas. O valor dos serviços ambientais prestados em apenas um hectare de floresta na Amazônia equivale a R$ 3,5 mil por ano. Mais do que a atividade pecuária geraria de lucro na mesma área ou até mesmo uma plantação de soja, segundo a coluna da União Nacional de Bioenergia.

A pior das escolhas é não fazer nada. O Brasil é um país que depende de energias renováveis, como as hidrelétricas, e que tem uma parte importante da sua economia na agricultura, logo, deveria se comprometer com metas concretas de proteção aos recursos naturais e combate às mudanças climáticas.

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